terça-feira, 16 abril 2024

Pandemia empurra 4,3 milhões para renda muito baixa nas metrópoles brasileiras

O estudo é produzido em parceria entre PUCRS (Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul), Observatório das Metrópoles e RedODSAL (Observatório da Dívida Social na América Latina 

Os números da pesquisa consideram apenas a renda do trabalho ( Foto: Agência Brasil)

Em um ano, a pandemia do coronavírus empurrou mais 4,3 milhões de brasileiros para faixa de renda do trabalho considerada muito baixa nas regiões metropolitanas. O movimento, que preocupa pesquisadores, foi verificado na quarta edição do boletim Desigualdade nas Metrópoles.

No primeiro trimestre de 2020, período inicial da crise sanitária -o vírus foi identificado no país no fim de fevereiro do ano passado-, as regiões metropolitanas somavam 20,2 milhões de pessoas em domicílios com renda per capita do trabalho inferior a um quarto do salário mínimo. No mesmo intervalo de 2021, o número subiu para 24,5 milhões. O aumento de 4,3 milhões vem dessa comparação.

O boletim chegou ao resultado com base em informações da pesquisa Pnad Contínua, do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Entre o primeiro trimestre de 2020 e igual intervalo de 2021, o percentual de pessoas vivendo em domicílios com renda menor do que um quarto do salário mínimo pulou de 24,5% para 29,4% nas metrópoles.

O estudo é produzido em parceria entre PUCRS (Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul), Observatório das Metrópoles e RedODSAL (Observatório da Dívida Social na América Latina).

Os números consideram apenas a renda do trabalho. Ou seja, recursos de benefícios sociais, como aposentadoria ou Bolsa Família, não entram no cálculo. O auxílio emergencial também não -e, nos períodos analisados, o benefício não estava sendo pago.

Em 2021, um quarto do salário mínimo equivale a R$ 275. No ano anterior, a R$ 261,25. A renda per capita domiciliar corresponde ao rendimento total do trabalho dividido pela quantidade de pessoas em cada residência.

“É um nível de renda muito baixo, que reflete a dinâmica do mercado de trabalho na pandemia. Os dados mostram a necessidade de benefícios como o auxílio emergencial”, aponta André Salata, professor do programa de pós-graduação em ciências sociais da PUCRS e um dos coordenadores do boletim.

Segundo o estudo, a parcela dos 40% mais pobres sofreu a maior perda de renda nas metrópoles. No intervalo de um ano, entre o primeiro trimestre de 2020 e igual período de 2021, o rendimento dessa camada despencou 33,4% nas regiões metropolitanas.

No primeiro trimestre de 2020, a renda média do trabalho dos 40% mais pobres era estimada em R$ 233,94. Ao encolher 33,4%, atingiu a marca de R$ 155,89 no começo de 2021.

Enquanto isso, os 10% mais ricos tiveram queda bem menor, de 4,8%. A renda média do grupo recuou de R$ 6.921,41 para R$ 6.590,05 no mesmo intervalo. Já os 50% que compõem a faixa intermediária registraram baixa de 7,,6% (de R$ 1.313,12 para R$ 1.213,55).

No geral, considerando toda a população, houve queda de 8,5% no rendimento nas regiões metropolitanas. O indicador médio passou de R$ 1.423,93 para R$ 1.302,79. Essa redução fez a renda do trabalho retornar a patamar semelhante ao do início da série, em 2012.

Salata define o cenário como “bastante complicado”. Além da queda na renda do trabalho, analisada pela pesquisa, houve interrupção nos pagamentos do auxílio emergencial no começo do ano.

Segundo o pesquisador, a camada mais desfavorecida exerce atividades nas quais é mais difícil atuar de maneira remota, o que também impacta o rendimento do grupo.

“Os mais pobres tiveram uma queda muito mais acentuada na renda. Na base da pirâmide, existem pessoas que não conseguem fazer home office”, frisa Salata.

O estudo também confirma uma tendência já verificada por outras pesquisas: o aumento da desigualdade durante a pandemia. Essa diferença entre a renda de ricos e pobres é medida pelo Coeficiente de Gini. Na escala do indicador, zero significa igualdade nos ganhos. Quanto mais próximo de um, maior é a desigualdade, o que representa retrocesso nas condições socioeconômicas.

Na média móvel, o Coeficiente de Gini subiu de 0,608 para 0,637 entre o primeiro trimestre de 2020 e igual período de 2021. A nova marca é a maior da série histórica, segundo o boletim. O aumento de 4,8% entre os trimestres também é recorde, acrescenta o estudo.

“Tivemos dois elementos trabalhando juntos: a queda na renda média e a piora na distribuição”, sublinha Salata.

Conforme o levantamento, os 10% mais ricos ganhavam, em média, 29,6 vezes mais do que os 40% mais pobres no primeiro trimestre de 2020. A diferença subiu para 42,3 vezes no início de 2021.

A região metropolitana de João Pessoa (PB) é aquela com o maior Coeficiente de Gini (0,729). Ou seja, a mais desigual.

Em seguida, aparecem Recife (PE) e Rio de Janeiro (RJ), com a mesma marca: 0,687. Segundo a pesquisa, o elevado nível de informalidade nessas metrópoles ajuda a entender a disparidade nos ganhos com o trabalho.

O pesquisador Marcelo Ribeiro, do Observatório das Metrópoles, avalia que o quadro pode melhorar se a vacinação contra a Covid-19 tiver impulso nos próximos meses. A imunização é apontada como necessária para reduzir restrições e permitir a volta segura ao trabalho.

Neste momento, o mercado segue repleto de dificuldades, incluindo a escalada do desemprego, frisa o pesquisador. Ribeiro também coordena o boletim e atua como professor do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).

“A expectativa é que o avanço da vacinação possibilite maior aquecimento do mercado de trabalho. Mas os dados ainda são negativos”, afirma.

Para Salata e Ribeiro, os números do boletim reforçam a necessidade de medidas de proteção a camadas desfavorecidas nos próximos meses. Entre elas, está o auxílio emergencial.

Nesta semana, o governo federal confirmou a prorrogação do benefício, com mais três parcelas. Assim, o auxílio, que acabaria em julho, também deve ser pago em agosto, setembro e outubro. 

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