quarta-feira, 24 abril 2024

Pandemia agrava drama dos transplantes

O Brasil realizou, entre abril e junho deste ano, menos da metade dos transplantes de órgãos e tecidos do início do ano. Com a diminuição de 61% dos procedimentos, cresceram 44,5% as mortes de pacientes cadastrados na fila de espera entre os dois períodos em todo o País.

Os números levaram a ABTO (Associação Brasileira de Transplantes) a projetar no ano uma queda de doações e transplantes nunca vista – em contraste ao cenário promissor que se apresentava até então. Na conta, estão os procedimentos de coração, fígado, pâncreas, pulmão, rim, córnea e medula.

Quando comparados o primeiro semestre de 2020 e o de 2019, a diminuição no total de transplantes foi de 32%, e o aumento de mortes foi de 34%.

Se o País seguir nesse ritmo, o ano pode trazer queda de 20,5% nos procedimentos, o que faria o Brasil regredir à marca de nove anos atrás.

O número de doadores efetivos – que exames detectaram morte encefálica, a família autorizou a doação e os órgãos são viáveis – também teve baixa relevante.

Atualmente, o indicador é de 15,8 doadores por milhão de população (PMP). O número é 6,5% menor que a marca de junho de 2019 (16,9 doações PMP).

A Covid-19, que ganhou força no segundo trimestre do ano, é o motivo das quedas abruptas.

A pandemia causou descarte de órgãos infectados, aumento da negação familiar para que os entes fossem sepultados rapidamente, contraindicação para a realização do procedimento nos casos em que o receptor pudesse esperar com tratamentos paliativos e até falta de logística aérea para que órgãos viajassem para outras cidades.

Na tentativa de minimizar os riscos para os profissionais, também caiu a busca ativa de doadores.

O trabalho é feito por comissões intra-hospitalares (Cihdott) presentes em unidades com mais de 80 leitos e responsáveis por viabilizar o diagnóstico de morte encefálica e oferecer às famílias a possibilidade de doação.

E com a dedicação massiva dos leitos de UTI para os doentes graves de Covid-19, vítimas de trauma não tiveram chance de evoluir para morte cerebral, tornando-se doadores potenciais, e diminuíram também as vagas para acolher recém-transplantados.”Isso aconteceu de forma heterogênea, mas foi no Brasil inteiro. Foi uma queda inédita. Mesmo que a gente considere o que foi feito no primeiro trimestre, é uma perda grande”, diz José Huygens Garcia, presidente da ABTO.

FILA DE ESPERA

Outro efeito da pandemia foi a diminuição do ritmo de ingresso de pacientes em fila de espera. No primeiro semestre, o número de novos cadastros foi 28,4% menor que o mesmo período de 2019.

Segundo Huygens, houve menor procura dos serviços de saúde eletivos. Assim, menos indicações de transplantes. Mesmo com isso, a lista de espera não deixou de crescer. Ao final de junho, mais de 40 mil pessoas aguardavam um órgão ou tecido, 3.000 a mais que no fim de 2019.

Na tentativa de manter os transplantes com a maior segurança possível, o Ministério da Saúde emitiu em março uma nota técnica indicando os critérios para a triagem clínica de coronavírus nos candidatos à doação.

Em São Paulo, segundo Francisco Monteiro, coordenador da central de transplantes estadual, cerca de 8% dos doadores potenciais foram descartados porque estavam infectados com o vírus, apesar de a Covid-19 não ter sido a causa da morte.

A retirada dos órgãos só acontece com o diagnóstico negativo. “Essa foi a primeira medida que fez com que a gente tivesse um doador que incorresse em risco mínimo para o receptor e para a equipe transplantadora”, afirma.

Pacientes receptores também realizam testagem da doença para minimizar os riscos.

A retomada das equipes, especialmente das Cihdott, pode ajudar. Há também a campanha “Setembro Verde”, que incentiva a ampliar a conscientização da população sobre o tema.

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