sexta-feira, 19 abril 2024

Patrimônio abandonado ainda pode gerar multa

 Condephaat vai vistoriar Grupo Escolar em Carioba e pode punir governo

Carioba | Foto de arquivo do Grupo Escolar mostra o patrimônio histórico em ruínas (Foto: Reprodução / Prosa Cariobense / Facebook )

Era madrugada de 8 de outubro de 2011. Por volta de 1h30 da manhã, parte do prédio de 91 anos que abrigou o Grupo Escolar Comendador Müller, no Complexo de Carioba, em Americana, foi destruído pelas chamas. Duas horas depois do primeiro indício de fogo, pouca coisa restava do espaço onde centenas de americanenses foram alfabetizados até 1983. Na época, a Prefeitura de Americana anunciou a intenção de restaurar o lugar, tombado como patrimônio histórico, mas as obras nunca chegaram a começar. Agora, quase 11 anos depois do incêndio e com as ruínas na antiga Vila de Operários tomada pelo mato, o Condephaat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico de São Paulo) constatou irregularidades na conservação do prédio e prevê uma vistoria para determinar quais os próximos passos para revitalizar o local.

“Era um prédio de pé-direito alto, bem ventilado, com salas de aulas, diretoria, sala de arquivo, recepção, portaria, alpendre, secretaria, sala de professores, gabinete dentário, cozinha, banheiros para alunos e para professores, pátio arborizado e jardim na frente. A importância dessa escola para centenas de pessoas que passaram por ela é imensurável. A memória escolar dos antigos cariobenses e dos que adotaram Carioba é comovente”, conta a doutora em História Suzete Volpato, pesquisadora do lugar.

“O prédio, embora de uma construção simples, é emblemático pois do ponto de vista afetivo, inúmeros cariobenses e americanenses foram educados ali dentro,”, completa o diretor da Associação Prosa Cariobense, o produtor audiovisual José Eduardo Angelini Milani.

De acordo com a Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo, os conselheiros do Condephaat aprovaram, por unanimidade, uma nova vistoria para identificar os danos do prédio.

Caso seja constatado que o espaço sofreu dano reversível mediante restauro, a Prefeitura de Americana poderá ter de pagar multa no valor de 3.250 Ufesps (Unidades Fiscais do Estado de São Paulo), o equivalente a cerca de R$ 103 mil, por mês até a “efetiva recuperação do bem tombado”.

Se os técnicos do órgão considerarem que houve destruição ou desfiguração irreversível, a multa aumenta para 15 mil Ufesps, aproximadamente R$ 479 mil.

“Perdeu porta, janela, telhado, restou apenas paredes e tijolos, mas a fechada ainda está com desenho da arquitetura que era”, avalia o arquiteto Heliton Escorpeli, membro do Condepham (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico e Cultural de Americana).
Escorpeli afirma que ele próprio levantou a necessidade de preservação do espaço para discussão entre os integrantes do conselho local.

“Em algumas reuniões levei a preocupação de iniciar os cuidados para não perder mais do que já perdeu. O que deveria ter sido feito no prédio do Grupo Escolar, desde o começo, seria a limpeza e proteção da deterioração pelo tempo, como foi feito no Museu Nacional, no Rio de Janeiro. E é isso que precisa ser feito de imediato, a limpeza e proteção do que ainda existe”, explica.

Segundo Escorpeli, a recuperação do espaço é possível, uma vez que o prédio não possui elementos complexos, como o da Casa Hermann Müller – cuja primeira etapa de restauração foi anunciada na última semana pela prefeitura.

“Lá não possui elementos que não seriam mais possíveis de ser retratados ou com detalhes, como pinturas em paredes, como na Herman Müller, mas é preciso uma perícia no local para definir isso. A importância do prédio é mais como espaço, tem todo o valor afetivo dos alunos que passaram por ali”, diz.

Procurada, a Prefeitura de Americana foi questionada quanto a projetos de restauração do prédio em andamento e se há alguma negociação com a Secretaria Estadual de Cultura sobre o que é possível ser realizado no espaço, mas, por meio de nota, afirmou apenas que se manifestaria depois de se informar melhor sobre o assunto. 

Complexo foi construído em 1875 em Carioba
De acordo com a historiadora Suzete Volpato, a escolarização em Carioba começou com os imigrantes, principalmente os italianos, que consideravam educação e cultura essenciais para a comunidade.

“Para se ter uma ideia, no início do século XX, havia mais estrangeiros do que brasileiros nas escolas de Carioba. Isso porque existiam várias escolas espalhadas pela vila, denominadas escolas isoladas de Carioba, de acordo com o censo de 1918). Depois elas foram reunidas, entre 1921 e 1931, e denominadas de Escolas Reunidas de Carioba, dentre esses anos, em 1924, em um único prédio e próprio na rua principal da vila construído pelos proprietários de Carioba. Em 1932, tornou-se Grupo Escolar de Carioba, em 1940, Grupo Escolar Comendador Muller, e 1978 Escola Estadual de Primeiro Grau “Comendador Muller”, até o seu fechamento em 1983″, conta Suzete.

O Complexo Industrial de Carioba, construído por volta de 1875, inclui a igreja, a residência Hermann Müller, as residências remanescentes da Vila Operária e complexo de fábricas, que também foi vítima de um incêndio em setembro de 2020 que comprometeu cinco dos 22 galpões.

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