quinta-feira, 18 abril 2024

Privatização ameaça tobogã do Pacaembu

ALBERTO NOGUEIRA E MARCOS GUEDES | FOLHAPRESS
O produtor musical Cláudio Amaral do Valle, 62, já fala do tobogã, arquibancada mais popular do estádio do Pacaembu, com saudosismo.

“[Depois da construção] ficou mais barato e fácil de ir aos jogos. Na passarela da arquibancada tinha um banheiro com janela que servia como acesso ao estádio. Cansei de passar por baixo do portão também. Coisa de moleque”, afirma o torcedor corintiano.

A arquibancada que traz lembranças de infância para esse e milhares de outros torcedores que frequentaram os jogos de futebol no Pacaembu pode estar com os dias contados.

Parte do pacote de desestatização da Prefeitura de São Paulo, o estádio deve passar por ampla reforma após ser concedido para a iniciativa privada. E o tobogã aparece como um dos principais candidatos a demolição.
A derrubada do setor faz parte do projeto aprovado pela prefeitura e por órgãos de preservação do patrimônio municipal (Conpresp) e estadual (Condephaat).

A arquibancada não faz parte do plano arquitetônico original do estádio inaugurado em 1940. Foi construída após a demolição da concha acústica -um grande palco onde eram realizados concertos e apresentações musicais–, em 1969, durante a primeira gestão de Paulo Maluf como prefeito da capital paulista.

Palco da Copa do Mundo de 1950, o estádio até aí era considerado o mais importante da cidade e local de realização dos principais clássicos entre os quatro maiores clubes do estado (Corinthians, Palmeiras, Santos e São Paulo).

Foi em um desses clássicos, em 6 de dezembro de 1964, que Cláudio foi pela primeira vez ao estádio e se apaixonou pelo Corinthians, mesmo após o time ser goleado por 7 a 4 pelo Santos de Pelé.

“Eu me apaixonei pela galera, nunca tinha visto tanta gente fazer festa. Meu pai era santista e me levou. Acho que queria que eu visse o Pelé, mas o que me atraiu foi a torcida”, diz o sorocabano.

Na época ele vivia em São José do Rio Pardo, no interior de São Paulo, mas vinha com frequência à capital para visitar sua avó, que morava na região.

Com isso, passou boa parte da infância jogando bola na praça Charles Miller, frequentando a piscina do Pacaembu e assistindo aos jogos de aspirantes no estádio, que, após a construção das novas arenas de Corinthians e Palmeiras, não recebe mais tantos jogos de alto nível.

PRIVATIZAÇÃO
A concessão à iniciativa privada por 35 anos e o possível fim do tobogã tornam a futura utilização do estádio pelos clubes uma incógnita.

O processo havia sido suspenso pelo TCM (Tribunal de Contas do Município) em 15 de agosto, um dia antes da abertura dos envelopes que revelariam a empresa vencedora da concorrência pelo Pacaembu.

O órgão questionou a forma como deveriam ser comprovadas as qualificações das empresas que têm a intenção de assumir o estádio. Construcap CCPS, Consórcio Patrimônio SP e Consórcio Arena Pacaembu enviaram propostas, além da WTorre, após o prazo.

No último dia 5, o plenário do tribunal revogou a suspensão, mas impôs condições para que a prefeitura dê sequência ao processo licitatório.

Além do questionamento sobre a capacidade técnica dos licitantes, o TCM quer novos prazos para outros eventuais interessados em participar do certame e a formalização de um termo de anuência entre os governos municipal e estadual.

A través de sua assessoria, a Secretaria de Desestatização diz à Folha aguardar parecer da PGM (Procuradoria Geral do Município) sobre a decisão do tribunal para saber se acata as condições impostas de forma integral ou parcial.
Não há prazo para a retomada do processo de concessão antes disso, afirma o órgão.

Uma das principais bandeiras da gestão do ex-prefeito de São Paulo e atual candidato ao governo estadual, João Dória (PSDB), o pacote de privatizações, que inclui ainda parques, cemitérios, terminais de ônibus, tem sofrido resistência.

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