Em sentença proferida pela 4ª Vara do Trabalho de São Paulo, no último dia 14, a Justiça condenou a empresa de transporte por aplicativo Uber a assinar as carteiras de trabalho de todos os motoristas cadastrados na plataforma no Brasil, além de pagar R$ 1 bilhão em danos morais coletivos.
A determinação jurídica foi feita em decorrência de uma denúncia feita pela Associação dos Motoristas Autônomos de Aplicativos (AMAA) sobre as condições de trabalho na empresa. A proposta foi feita pelo Ministério Público do Trabalho (MPT).
Por se tratar de uma ação civil pública, a decisão é válida para todo o território nacional e direcionada exclusivamente para a Uber, como explicou o advogado Heitor Marcos Valério. “No Brasil, temos outras empresas que trabalham com serviço por aplicativos, porém essa ação não afeta diretamente essas empresas, somente a Uber”, completou o advogado.
Além da multa bilionária por danos morais, a determinação estabelece um prazo de até seis meses após o trânsito em julgado para que a Uber registre os motoristas ativos, sendo uma proporção de 1/6 por mês. Caso isso não ocorra, há uma segunda pena financeira no valor de R$ 10 mil para cada motorista não registrado.
Para o especialista, o registro CLT não é necessariamente a solução ideal, mas é importante que haja uma regulamentação específica para esse tipo de atividade profissional.
“A grande discussão no Brasil atualmente é a insegurança jurídica. Temos novas formas de trabalho por meio de aplicativos digitais e ainda não temos regras adequadas para sustentar essa relação jurídica, seja ela de emprego ou contrato. Novas formas de trabalho exigem novos direitos e conceitos”, explicou.
Quanto a uma eventual legislação estabelecida, Heitor afirmou que os serviços tendem a continuar normalmente no país se as leis forem claras.
“Vejo isso como uma discussão mais política do que jurídica. De qualquer forma, essas empresas também não têm interesse em sair do Brasil, pois geram muito lucro. O governo tem a tarefa de regular essa situação para evitar qualquer prejuízo aos consumidores”.
Em nota, a Uber afirmou que há uma evidente insegurança jurídica na decisão e que não seguirá as determinações até que todos os recursos cabíveis sejam esgotados. São permitidas até três instâncias de recurso. Confira abaixo um trecho da nota:
“A Uber esclarece que vai recorrer da decisão proferida pela 4ª Vara do Trabalho de São Paulo e não seguirá nenhuma das medidas listadas na sentença antes que todos os recursos cabíveis sejam esgotados.
Há uma evidente insegurança jurídica, uma vez que apenas no caso envolvendo a Uber a decisão foi contrária ao que aconteceu em todos os julgamentos em ações semelhantes propostas pelo Ministério Público do Trabalho contra plataformas, como nos casos envolvendo Ifood, 99, Loggi e Lalamove, por exemplo.
A decisão representa uma interpretação isolada e contrária à jurisprudência estabelecida em instâncias superiores do Tribunal Regional de São Paulo desde 2017, além de outros Tribunais Regionais e o Tribunal Superior do Trabalho.
A Uber está convicta de que a sentença não considerou adequadamente o sólido conjunto de provas apresentado no processo e se baseou, especialmente, em posições doutrinárias que já foram superadas, inclusive pelo Supremo Tribunal Federal.
Na sentença, o próprio magistrado menciona a ausência de legislação atualmente no país para regulamentar o novo modelo de trabalho intermediado por plataformas. É exatamente para tratar dessa lacuna legislativa que o governo federal emitiu o Decreto Nº 11.513, instituindo um Grupo de Trabalho “com o objetivo de elaborar propostas para regulamentar as atividades realizadas por meio de plataformas tecnológicas”, incluindo definições sobre a natureza jurídica da atividade e critérios mínimos de ganhos financeiros.”
Jurisprudência
Nos últimos anos, as diversas instâncias da Justiça brasileira têm formado jurisprudência consistente sobre a relação entre a Uber e os parceiros, concluindo que não existem os quatro requisitos legais e concomitantes para a existência de vínculo empregatício (onerosidade, habitualidade, pessoalidade e subordinação). Em todo o país, já são mais de 6.100 decisões de Tribunais Regionais e Varas do Trabalho que negam o reconhecimento da relação de emprego com a plataforma.