A combinação, além de preferência nacional, é recomendado pela ciência
Segundo a OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, o brasileiro é o terceiro maior consumidor de carne bovina do mundo, com 24,6kg per capita/ano em 2021, após argentinos (36,9kg) e norte-americanos (26,1kg).
Talvez o alimento mais citado quando se fala em harmonização com vinho é a carne. Este protagonismo é merecido: um tinto e uma bela carne formam um par sensacional, mas normalmente este casamento é tratado de forma genérica “carne com tinto”.
A realidade, contudo, é bem mais complexa do que isso. Centenas de novos compostos aromáticos se formam nas reações químicas que se processam no cozimento da carne. A alimentação do gado também faz diferença. Os alimentados com pasto são mais saborosos do que os que consomem ração (grãos).Vamos, hoje, abrir esta caixa preta dos muitos tipos de carne, seus preparos e seu matrimônio com os vinhos.
Antes de prosseguir, uma dica. Fala-se que a proteína e a gordura da carne vermelha amaciam os taninos dos vinhos tintos. Isso é falso. Em uma carne, o que amacia taninos é o sal. Tente comer carne sem sal e o vinho parecerá amargo!
Carne Maturada
A carne maturada ganha mais aminoácidos, acentuando o sabor que chamamos de “umami”, tem também mais textura e profundidade de sabores e aromas. Pede tintos encorpados, de clima quente, com bom volume de taninos doces, como os Zinfaldel (Califórnia), Syrah (Chile), Nero d’Avola (Sicilia), Monastrel (Espanha).
Carne crua
A carne crua, um tartar, por exemplo, terá menos aromas e sabores e será mais ácida. Surpreendentemente, ficará melhor com vinhos brancos do que com tintos. Experimente com um bom branco de médio corpo, rico em aroma e com alguma idade (um bom Chardonnay barricado maduro), ou tintos leves e sem madeira, como um Cabernet Franc (vale do Loire, Brasil) ou um Gamay (França).
Angus/Kobe/Wagyu
Uma das melhores raças de gado, a Wagyu, traz aromas ainda mais complexos. O gado desenvolve em sua digestão mais terpenos (compostos aromáticos), com notas florais e de especiarias. Desenvolve também notas semelhantes a dos vinhos amadurecidos em barricas de carvalho: defumados, notas animais, além de notas de nozes e cebola.
Este tipo de carne desenvolve muitos aminoácidos, umami, dando volume e textura ao sabor. Sugiro tintos de bom corpo (não muito encorpados), ricos de aromas, com notas de especiarias e florais, e amadurecidos em carvalho. Que tal um Pinot Noir de maior estrutura do Novo Mundo? Um belo tinto do Dão-Portugal? Um Barbera do Piemonte?
Carne grelhada/tostada
A tosta na carne pede taninos jovens e madeira nova nos vinhos. Que tal um Cabernet Sauvignon (um Bordeaux jovem e potente), um Tempraniillo espanhol, ou um Sangiovese da Toscana?
Carne cozida em água
A carne cozida perde sua suculência e ganha sabores dos ingredientes que estavam no cozimento. Neste caso, pede menos taninosos, tintos mais leves ou mesmo brancos encorpados com acidez moderada ou baixa. A escolha final depende muito dos ingredientes com os quais a carne foi cozida. Uma dica é observar os aromas destes ingredientes. Sugestão de vinhos: tintos mais leves e sem madeira ou mesmo brancos, como Valpolicella, Gamay, Riesling da Alsacia
Carne cozida em vinho
Um de meus pratos prediletos é carne longamente cozida em vinho, por horas.A carne cresce, pega muito sabor, sua textura fica macia, quase pegajosa e muitas vezes até se desfaz. Este preparo pede vinhos potentes, ricos, estruturados, como um Amarone (Venato-Itália), um Syrah Australiano ou um Alentejano da casta Alicante Bouschet.
Carnes de Caça
Nas caças, as palavras- chave são “complexidade” e “especiarias”. Tente vinhos com longo amadurecimento em madeira mas, ao mesmo tempo, mais maduros e delicados, de safras mais antigas, se possível. Barolo, Babaresco (Itália), Borgonha, Hermitage (França), Rioja (Espanha).
Dica: para temperar carnes de caça e torná-las ainda mais amigas do vinho, use uma infusão feita em azeite com canela, gengibre e cardamomo.