Armação dos Búzios tem vocação internacional desde o século 16. Principal destino da Região dos Lagos fluminense, o balneário já era frequentado por franceses muito antes da célebre visita de Brigitte Bardot, em 1964.
Eram corsários e contrabandistas de madeira, que foram expulsos pelos portugueses em 1617, 42 anos após a derrocada da França Antártica, colônia fundada por Villegaignon na baía de Guanabara.
Bem mais tarde, nos séculos 20 e 21, chegaram os argentinos. E Búzios virou “Búcios”, um pedacinho do bairro da Recoleta no litoral do Rio.
As belezas naturais da região também sempre atraíram o turismo doméstico: em especial visitantes mineiros, desprovidos de praias para chamar de suas e, obviamente, veranistas cariocas. Mas o público paulista, considerado o principal motor do turismo interno, nunca emplacou por lá.
COMO CHEGAR
O principal obstáculo entre São Paulo e Búzios era, até pouco tempo atrás, a dificuldade relativa de acesso. São mais de 600 quilômetros de estrada. Ou o visitante pegava um voo para o Rio, depois carro de aluguel e um trajeto que pode durar quase três horas em dia de trânsito normal.
A mais recente cartada para atrair o paulistano é a abertura de uma rota direta entre o aeroporto de Guarulhos e o de Cabo Frio, operada pela Gol, com duração de 70 minutos. As saídas (momentaneamente interrompidas devido à pandemia) ficam restritas às sextas e aos domingos – exceto no mês de julho, quando as viagens serão diárias.
TONS DE AZUL
A Região dos Lagos tem um litoral único no Brasil, muito diferente da mata atlântica da orla paulista. Arbustos retorcidos, formações rochosas e cactos dão um aspecto árido à paisagem. A água do oceano, gelada, tem tons de azul que não são vistos em outras partes do país. E a lagoa de Araruama é como um mar interior.
Cabo Frio, o “hub” regional, é o eixo de onde se podem explorar facilmente todas as atrações da região. Apesar das distâncias relativamente curtas, as cidades da Região dos Lagos têm perfis distintos.
Praia do Forte durante maré alta em Cabo Frio
Cabo Frio tem 220 mil habitantes e concentra serviços, hipermercados, lojas de departamento. O grosso da sua população flutuante, que ocupa as casas de veraneio na alta estação, é composto por mineiros (a Azul tem voos diretos de Belo Horizonte).
A região central da cidade preserva algumas quadras de arquitetura colonial ao estilo de Paraty, no bairro Passagem. Além dos habituais barzinhos e sorveterias, há opções para o viajante em busca de comida mais elaborada.
Arraial do Cabo tem as praias de água mais azul da região e atrai praticantes de mergulho. Mais sossegada que Búzios e Cabo Frio, recebe também casais e famílias.
TRANQUILIDADE
Mas tranquila de verdade é São Pedro da Aldeia. Uma bênção para quem busca isolamento e brisa salina. Tem praia, mas não tem mar. É banhada pela Lagoa de Araruama, um c
Arraial do Cabo – destino de mergulhadores e cidade com as praias de água mais azul na Região dos Lagos
orpo d’água salgada que, tecnicamente, deveria ser chamado de laguna.
Lagunas são lagos salinos rasos, que se comunicam com o mar. No caso da Araruama, a pouca profundidade, o sol e os ventos causam evaporação rápida e concentração do sal.
A salinidade média da laguna é de 52%, uma vez e meia o teor do vizinho Oceano Atlântico. É a maior laguna hipersalina do mundo, com uma orla diferente de qualquer outra do Brasil.
Esse “mar morto” fluminense permanece esquecido pela indústria do turismo. A região se desenvolveu com a extração de sal de cozinha, porém, o menor custo da produção em Mossoró (RN) abalou o setor. Salinas foram abandonadas. Hoje, fábricas à margem da lagoa se dedicam ao beneficiamento do sal potiguar.
Uma opção de hospedagem em São Pedro é a pousada Enseada das Garças, do casal Claudia Silveira e Mauro Ramos Lobo. A pousada foi construída num morro que desce até a água. Em dias de sol, a Lagoa de Araruama fica tão azul quanto o mar da região.
Piscina de borda infinita na pousada Enseada das Garças, em São Pedro da Aldeia
PONTO DE ARGENTINOS, CASAIS E BALADEIROS
Pão com linguiça é choripán em Búzios, ou “Búcios”, no idioma local, o portunhol. Argentinos estão por todo lado na ex-vila de pescadores, uma península de litoral recortado.
Fugiram do arrocho econômico no início do século, se estabeleceram e arrastaram compatriotas para morar no éden e trabalhar nas lojas e nos restaurantes. Os turistas desembarcam diretamente de Buenos Aires no aeroporto de Cabo Frio, sem escala.
Os argentinos são só um dos grupos que invadiram Búzios depois que o vilarejo foi visitado por Brigitte Bardot, em 1964, e ficou famoso. Um dos principais destinos do turismo de luxo no País, tem praias para todos os estilos.
A praia da Ferradura, uma enseada protegida das ondas, é a favorita das famílias, conta o dono de pousada Roberto Fuzetti. Nela, a água calma é coalhada de pedalinhos de aluguel no formato de cisnes.
Geribá, com ondas para o surfe, atrai cariocas nos finais de semana. Já os argentinos se instalaram principalmente nas praias de João Fernandes e João Fernandinho. Por fim, os naturistas escolheram o isolamento da ponta Olho de Boi para exibir seus atributos corporais.
A paisagem de Búzios não lembra em nada o verde luxuriante de Ubatuba, por exemplo. A pouca profundidade do solo (meio metro no máximo, depois é pedra) só permite a fixação de arbustos espinhosos, cactos e árvores retorcidas. Com poucos sedimentos e sem a mata atlântica para refletir, o mar não é verde: é azul. Não existe meio-termo em Búzios. Na alta temporada, fica superlotada; na baixa, a ociosidade toma a rede hoteleira.
As pousadas buscam tipos alternativos de visitantes criando espaços para eventos como congressos corporativos, que arrastam grupos numerosos para viagens curtas.
Roberto Fuzetti administra a Pedra da Laguna, filiada à associação Roteiros de Charme. Afastada do agito da rua das Pedras, é voltada a casais em busca de privacidade. Para expandir, ele equipou uma sala de convenções e construiu uma área para casamentos.
A oferta gastronômica de Búzios está acima da média das cidades-balneário do Brasil. Na Orla Bardot, o Bar do Zé serve frutos do mar em preparações de criatividade contida: cherne com maracujá, manga ou banana, camarão com laranja ou abacaxi.
Mais ousado, o Rocka ataca com espumas numa ponta rochosa ao lado da praia Brava. Arroz caldoso de frutos do mar com emulsão de salsinha, cavaquinha em molho de soro de leite, pão de alho negro com coração e moela de pato. O chef, Gustavo Rinkevich, é argentino. Por supuesto.
* O jornalista viajou a convite das pousadas Pedra da Laguna (Búzios) e Enseada das Garças (S. Pedro da Aldeia)
Por Marcos Nogueira