terça-feira, 23 abril 2024

Covid altera ciclo vital com mais mortes do que nascimentos

Dados compilados pela Fundação Seade mostram impactos da pandemia em Americana 

Covid | Número de mortes em Americana supera o de nascimentos devido à pandemia (Foto: Arquivo/ TodoDia Imagem)

Os órfãos da Covid-19 (e a proposta de instituir pensão a quem perdeu pai, mãe ou responsável para a doença) tomaram parte das discussões da última semana como uma das nuances do impacto social da pandemia. Mas a ação do vírus foi além, mexendo com indicadores populacionais e invertendo uma progressão que era tradicional: a do registro de mais nascimentos do que mortes. Ao menos nos oito primeiros meses de 2021, as mortes prevaleceram frente aos nascimentos, o que se confirma em Americana.

De acordo com dados da Fundação Seade (Sistema Estadual de Análise de Dados) do início do ano até agosto, com atualização em 14 de outubro, a mais recente disponível, Americana registrou 1.685 óbitos e 1.625 nascidos vivos. Em todo o ano de 2020, foram 1.633 e 2.429, respectivamente.
As informações são do painel de “Estatísticas Vitais”, que são atualizadas mensalmente e produzidas com base nos registros nos cartórios do Estado de São Paulo, disponibilizados após consistência, organização e processamento pela Fundação Seade.

O que se observa no município faz parte de um momento peculiar da história, como analisa o demógrafo Everton Lima, docente do IFCH/Unicamp e pesquisador do Núcleo de Estudos de População (Nepo/Unicamp).

Ele afirma que os registros demonstram também os efeitos indiretos da pandemia, como a superlotação de leitos e o trabalho em situação de estresse.

As interferências na “dinâmica” entre nascimentos e óbitos vêm sendo estudadas pelo núcleo, e a redução no número de nascimentos foi observada a partir dos meses de novembro e dezembro de 2020 e os primeiros meses de 2021, indicando uma mudança no padrão reprodutivo. E as causas possíveis são diversas.

Além das incertezas econômicas, a Covid-19 interferiu na rotina de casais, impondo situações nas quais não puderam se relacionar.

Ele também chama atenção para o fato de as mortes terem repercutido mais no início da pandemia, o que de certa forma contribuiu para uma notificação mais ágil e precisa por parte dos órgãos como o Ministério da Saúde.

Os nascimentos tiveram menos atenção num primeiro momento, mas trata-se de uma estatística que deve levar em conta fatores como não ser um evento imediato, os pais terem um prazo de até 15 dias para o registro e locais com mais dificuldade de acesso a essa formalização, que pode demandar ainda mais tempo. Por isso, era de praxe a divulgação de nascimentos apenas do ano precedente.

“A pandemia acelerou esse processo. Nem mesmo na crise da zika, que afetou diretamente os nascimentos, as estatísticas vitais eram disponibilizadas tão rápido”.

O pesquisador acredita que é questão de tempo para que os parâmetros anteriores à pandemia sejam retomados, de forma que as pessoas que adiaram uma gravidez voltem a planejá-la.

Ele cita a crise da zika e as quedas de nascimentos entre 2015 e 2016, com a quantidade aumentando posteriormente. Mas ele também considera o impacto das mortes de pessoas em faixas etárias reprodutivas, maior do que em outros anos, que talvez possa influenciar nessa projeção.

ÓRFÃOS DA PANDEMIA
“Como essa situação vai reverberar é uma incógnita. É a primeira vez na história do Brasil que vivemos algo parecido, da mortalidade em determinados grupos de idades. A concentração de mortes em idade adulta, se consideramos que eram pessoas com filhos, levará a uma geração de crianças que precisarão de mais atenção e investimentos”, considera o demógrafo.

A situação é ainda mais preocupante se considerada a desigualdade também na mortalidade, existente anteriormente à pandemia entre pessoas de estratos sociais diferentes. Ou seja, os órfãos possivelmente são provenientes, em sua maioria, das camadas mais pobres – as que morrem em maior número. Portanto, precisarão ainda mais de amparo do Estado, como analisa Lima. Ele alerta ainda que se trata de uma geração em formação, ou seja, não adianta pensar em benefícios pontuais, mas no investimento social a médio e longo prazos.

NÚMEROS NA REGIÃO
Entre as cidades da região, Sumaré lidera o número de nascimentos. Já o número de óbitos é equivalente ao de Americana.

Entre os cinco municípios, apenas Americana e Santa Bárbara d’Oeste tiveram mais óbitos do que nascimentos no período. E exceto por Americana, os demais municípios tiveram mais nascimentos de meninos do que de meninas.

Números de Americana
Entre janeiro e agosto de 2021, nasceram 805 meninos e 820 meninas em Americana (1.625), a maioria de mães entre 30 e 39 anos (761) e 20 a 29 anos (674). Nos dois extremos, o número de partos é equivalente, com 99 nascimentos de mães abaixo dos 20 anos e 91 entre 40 e 49 anos. Maio foi o mês com mais nascimentos (219) e junho com menos (190).

Em relação aos óbitos, junho e julho foram os meses com mais falecimentos (293 e 241, respectivamente), com agosto tendo o menor registro do ano até então (156).

Em todos os meses os números superaram as marcas mensais dos dois anos anteriores.

Na faixa etária e sexo dos mortos nos primeiros oito meses deste ano em Americana prevalecem homens de 65 a 69 anos (114).

Entre as mulheres, a mortalidade se concentra a partir dos 80 anos, com 96 mortes na faixa entre 80-84, 95 óbitos de 85-89 e 90 falecimentos entre mulheres acima de 90 anos.

As faixas mais novas também têm registros de perdas. São sete meninos e sete meninas de até quatro anos, dois meninos entre 5 e 9 anos e uma menina entre 10 e 14. 


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