Foi uma semana diferente. Como nunca se tinha visto. O medo do coronavírus fez o cidadão adotar novos hábitos. Pouco sai de casa. O poder público fez restrições para o atendimento do público. Os parques estão fechados. Na Igreja Matriz gigantesca, dois ou três gatos pingados orando pelos cantos. Os bares e restaurantes com as mesas vazias. Nas lojas, o movimento despencou.
A reportagem do TodoDia esteve em locais de grande circulação do público, e ouviu depoimentos de pessoas que, simplesmente, não conseguem imaginar o que pode acontecer nos próximos dias. Umas frases emocionadas. Outras revoltadas. Mas a tensão estava em todos os semblantes.
No calçadão da Fernando Camargo, a comerciante Joelma Campos, há 15 anos instalada no mesmo ponto, conta que nunca imaginou enfrentar a situação.
Atendendo às orientações do poder público, ela separou as mesas da lanchonete, pôs cadeiras para fora, espalhou frascos de álcool em gel pelo balcão, determinou a higienização detalhada do ambiente. Mas, mesmo assim, viu o movimento despencar. “Preciso entregar lanches a domicílio para garantir dinheiro no caixa”, falou.
Ali mesmo pelo convívio, os funcionários de uma loja de utilidades usavam máscaras para atender o cliente. Ah, uma banca foi montada para vender álcool em gel. Mas a mercadoria sumiu em minutos.
Na Avenida Antônio Lobo, o empresário Diego Soares Bonfim reclamava da queda brusca do movimento no restaurante. Ele vendia 700 refeições em média, a cada dia. Nesta semana, não chegavam a 200.
Ele teve de dar férias para os funcionários e passou a tocar o estabelecimento com a mulher e o irmão. “Não bastasse a crise financeira, veio o coronavírus”, disse.
“Eu não sei o que vou fazer para pagar salários e o aluguel do espaço. Há muita insegurança, muita incerteza”, afirmou.
Como a entrega de refeições anda salvando o faturamento de muitos restaurantes, há entregadores que tomam cuidados especiais.
Rafael Costa, que trabalhada para o Ifood, decidiu por conta própria trabalhar de máscara. “Converso com as pessoas o tempo todo. Corria o risco de levar o vírus para casa. Pensei principalmente na minha avó, de 75 anos, que está mais vulnerável à contaminação”, afirmou.
“De máscara o cliente também me respeita mais. Vê que sou atento, que prezo pela higiene, pela segurança”.
A pandemia do coronavírus despertou o pânico generalizado. Mas a sensação de insegurança é conhecida há um bom tempo pelo taxista Antônio Vítor dos Santos, que tem 14 anos de praça.
Ele fala que os profissionais do ramo já viviam com o risco diário de uma contaminação, buscando e levando doentes a hospitais. “Pra mim, o que mudou foi a queda do movimento de clientes pela metade. A preocupação com as doenças sempre foi muito grande”, falou.
O calçadão da 30 de Julho estava vazio. Mas um senhorzinho de cabelos brancos circulava a passos lentos, vendo as vitrines.
O seo Paulo Garcia, de 81 anos, disse para a reportagem que não ia ficar dentro de casa, com medo do vírus. “Meu amigo, quem tem mais de 70 só tem cansaço. Já vivi. E, nesta idade, nada vai me tirar a liberdade de andar na rua”, disse.
Garcia nasceu em Cosmópolis mas vive em Americana desde que era um garoto de 9 anos. Aqui ele cresceu, se casou, teve quatro filhos, 11 netos, cinco bisnetos. Evangélico, ele disse que se confortava com a passagem bíblica. Sabe que tudo tem seu tempo em cima da Terra.
A decisão do poder público em restringir e organizar a prestação de serviços pegou as pessoas de surpresa. Na manhã de quinta, o operador de máquinas Nivaldo Cotinbuíba de Souza, de 58 anos, deixou a Praia Azul de mobilete e foi até a prefeitura. Queria registrar uma queixa no Procon, mas deu com a cara na porta. Ficou sabendo ali das mudanças no expediente. E saiu reclamando que não poderia voltar em outro período.
“A minha queixa vai ter de esperar… A ameaça desse vírus é muito maior que o problema que tive com meu fogão”, disse conformado. E já caminhando em direção à mobilete para voltar pra casa.
O público que precisou dos serviços da CPJ (Central de Polícia Judiciária), que registra todas as ocorrências criminais da cidade, também foram surpreendidos pelas novas regras.
Seguindo a determinação da Secretaria de Estado da Segurança Pública, só uma pessoa por vez entrava no departamento. E fazia sua queixa atrás de uma faixa de sinalização, que o mantinha a dois metros do atendente. Os demais esperavam do lado de fora do prédio.
E se engana quem imagina que o trabalho dobrou nas unidades básicas de saúde. Apesar do reforço do pessoal para o atendimento e a receptação aberta, caiu demais o número de pacientes. Até em postinhos geralmente superlotados, como o da Vila Mathiensen.
Alberto, o enfermeiro-chefe, comentou que no começo houve uma correria amalucada à UBS, com pessoas apavoradas, achando que tinham contraído o vírus. Depois, disse, o cidadão tomou consciência de que ficar em casa é muito mais seguro e aconselhável.
“Assim a estrutura do posto está à disposição de quem realmente precisa, realmente está doente”, disse.