
A Prefeitura de Campinas publicou, nesta terça-feira (7), um decreto que estabelece regras e procedimentos para o repasse de recursos de emendas parlamentares a entidades sem fins lucrativos integradas à rede complementar do SUS municipal.
As novas normas, que valerão a partir da execução orçamentária de 2026, visam aumentar a transparência na destinação e uso dos recursos, atendendo também a determinações do Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento da ADPF nº 854, de 2024.
Contexto: investigação do Ministério Público
A medida foi divulgada poucos dias após o Ministério Público de São Paulo (MPSP) instaurar um procedimento para investigar supostas irregularidades nos repasses de emendas à Irmandade de Misericórdia de Campinas. O caso é apurado pelo promotor Daniel Zulian, que abriu uma Notícia de Fato após denúncia anônima feita por uma pessoa que se apresentou como funcionária do Legislativo municipal.
A denúncia aponta que vereadores teriam recebido percentuais de 10% a 20% dos valores destinados à entidade, prática semelhante a um esquema de “rachadinha”. Segundo o documento, a Irmandade recebeu quase R$ 12 milhões em 2024 e mais de R$ 13 milhões em 2025, montantes considerados altos em relação aos repasses feitos a outros hospitais conveniados.
Entre as medidas iniciais, o promotor solicitou cópia de todas as emendas impositivas executadas e informações comparativas sobre os valores destinados a outras entidades de saúde. Ele também recomendou a suspensão, por 30 dias, dos repasses de emendas à Irmandade, até a conclusão das apurações.
Partes se manifestam
A Câmara de Campinas, a Irmandade de Misericórdia e a Prefeitura se manifestaram sobre o caso após serem procuradas pela nossa reportagem.
- Câmara: A Câmara explicou que as Emendas Impositivas foram aprovadas no final de 2021 e passaram a valer em 2023. E que nelas os vereadores podem destinar 1,2% da Receita Corrente Líquida do município para projetos, obras e serviços, com a obrigação de a Prefeitura executá-las, e que há uma exigência legal de que no mínimo 50% do valor das Emendas Impositivas de cada vereador seja destinado para a área da Saúde.
A Câmara informou ainda que não foi citada nesse caso específico e desconhece qualquer tipo de irregularidade na destinação dessas emendas.
- Santa Casa: A Irmandade de Misericórdia de Campinas informou não ter conhecimento formal da notícia vinculada a seu nome (ou seja, não foi notificada). E, caso solicitado, prestará todos os esclarecimentos necessários.
- Prefeitura (Secretaria de Saúde): A Secretaria Municipal de Saúde disse que acatou a recomendação do Ministério Público e suspendeu, por 30 dias, na última sexta-feira (3), a execução de todas as emendas impositivas previstas à Irmandade de Misericórdia de Campinas, com exceção das relacionadas à assistência direta à população.
A Pasta destacou que as emendas impositivas são de total responsabilidade dos vereadores, que definem o destino, o tipo de serviço e o valor de cada repasse; E que não há qualquer ingerência da administração municipal sobre os beneficiários, valores ou a aplicação dos recursos, salvo em casos de impedimentos técnicos ou legais.
A Prefeitura disse ainda que vai enviar ao Ministério Público todas as informações solicitadas.
Requisitos e restrições no decreto
O decreto municipal define critérios obrigatórios para que as organizações possam ser beneficiadas. Entre eles, a regularidade fiscal e contábil, além da apresentação de plano de trabalho a ser aprovado pela Secretaria de Saúde. O documento também proíbe o uso dos recursos para a compra de veículos, execução de obras civis e pagamento de pessoal.
Cada instituição deverá abrir conta bancária específica para receber as emendas e publicar, em um portal de transparência, dados sobre dirigentes, valores repassados, prestação de contas, regulamentos internos e relatórios financeiros.
Limites de valores
O decreto limita o uso de até 40% do total das emendas individuais para repasses a entidades, enquanto os outros 60% devem ser aplicados em ações diretas da Secretaria de Saúde e da Rede Mário Gatti.
As entidades não poderão receber mais do que 100% da produção aprovada no âmbito da média e alta complexidade registrada em 2024, nem ultrapassar o teto anual definido pelo Ministério da Saúde para o projeto ou programa.
As informações completas estão disponíveis no Diário Oficial de Campinas.
Sistema
A Prefeitura informou que, após a publicação do decreto, os vereadores poderão indicar as emendas impositivas de 2026 por meio do sistema informatizado do município, que controla os valores destinados e executados por cada parlamentar.