Alvo de muitas discussões e polêmica, a saída temporária de detentos dos presídios de São Paulo, conhecida como ‘saidinha’, começou na última terça-feira (16) e segue até 22 de setembro. Cerca de 3,6 mil reeducandos de Campinas, Piracicaba, Limeira, Hortolândia e Sumaré tiveram acesso a saída. Os dados são da Secretaria de Administração Penitenciária (SAP).
Decisão é da Justiça
A SAP informa que o Poder Judiciário é responsável pelas concessões das saídas temporárias. O benefício é previsto na Lei de Execução Penal e com as datas reguladas, no estado de São Paulo.

E quando o preso não retorna?
Na última saída temporária, que aconteceu em Julho deste ano, 74 reeducandos de Hortolândia não retornaram, de acordo com a SAP. Em Campinas, 63 não retornaram, enquanto quatro reeducandos não retornaram na cidade de Piracicaba. Nas unidades prisionais de Limeira e Sumaré, todos os beneficiados retornaram.
Quando o preso não retorna à Unidade Prisional, é considerado foragido e perde automaticamente o benefício do regime semiaberto, ou seja, quando recapturado, volta ao regime fechado, de acordo com a Secretaria da Administração Penitenciária.
“Existem presos que não retornam, alguns saem, praticam crimes e depois voltam. Mas isso é um reflexo da sociedade: temos pessoas boas e ruins, e também presos bons e ruins que aproveitam a oportunidade para fugir ou cometer crimes antes de voltar para a cadeia. Esses que fogem passam a ser procurados pela Justiça, tornam-se foragidos, e cabe à polícia persegui-los e recapturá-los. Mas esse é um fenômeno que sempre aconteceu.” comenta Roberto José Daher, ex-delegado Seccional de Americana e professor de Direito Penal em Paulínia.

Organização e segurança
Segundo o presidente do Sindpenal, Antônio Pereira Ramos, todo o processo é monitorado pelas unidades prisionais com apoio da Polícia Penal. “É uma organização técnica, com aparato da Polícia Penal e de vários servidores públicos, para que isso seja realizado com tranquilidade, garantindo também a segurança da população”, afirma.
Ele acrescenta que, durante o período, há reforço na vigilância. “A saída temporária foge da normalidade. Exige mais atenção da Polícia Penal, que está treinada e armada para garantir a ordem e evitar tentativas de burlar a segurança, inclusive em situações de rivalidade entre facções”, explica Antônio.
“Eles podem sair orientados pelo crime organizado para promover bagunça do lado de fora, incluindo roubos e até homicídios. Tanto os agentes de segurança quanto a população precisam redobrar a atenção, porque saem pessoas querendo se reinserir na sociedade, mas também há quem saia para praticar crimes. Os agentes, como falei, devem ficar atentos a qualquer forma de retaliação desses presos.” comenta o ex-delegado.

Finalidade da medida
O benefício visa favorecer a ressocialização. O preso pode visitar a família, frequentar cursos profissionalizantes ou participar de atividades que auxiliem no retorno ao convívio social. “A saída temporária funciona como um teste supervisionado. O preso sai, convive com a família, tem acesso a estudo ou trabalho, e depois retorna. Isso fortalece vínculos familiares e reduz a reincidência”, afirma a advogada Mayara da Silva Araújo, mestre em Direito Penal e advogada da MBW Advocacia.
Ela lembra que a lei veda o benefício a condenados por crimes hediondos cometidos com violência ou grave ameaça, assim como em casos de resultado morte. Além disso, a concessão não é automática, depende de autorização judicial, parecer do Ministério Público e da administração penitenciária.
É um privilégio?
A advogada Mayara da Silva Araújo ressalta que há uma percepção equivocada sobre a saída temporária, muitas vezes vista como privilégio. Para ela, trata-se de um direito legalmente garantido. “A saída temporária é um direito previsto na Lei de Execução Penal e na Constituição Federal. A Constituição diz que uma das finalidades da pena é ressocializar o indivíduo. Então, em que pese essa falácia, gerada pela falta de informação, a saída temporária não é um privilégio, mas um direito que visa a ressocialização e a reinserção social do apenado.” reafirma.

Para o ex-delegado ainda é necessário critérios de desempenho sobre a medida. “Eu acho que a gente tem que pesar os benefícios da saída temporária em relação às consequências negativas. A criminalidade, é certo, aumenta durante esse período, mas também se dá a oportunidade de promover a ressocialização dos presos. É preciso avaliar sempre qual lado está sendo mais efetivo: o combate à criminalidade ou a ressocialização.”
Ressocialização e cumprimento da lei
O presidente do Sindpenal explica que cabe ao Judiciário decidir sobre a concessão da saída, enquanto a Polícia Penal cumpre seu papel de garantir a segurança. “Nosso trabalho é aplicar a lei e manter a ordem nas unidades. A discussão sobre ressocialização ou progressão de pena cabe à Justiça”, pontua.
Reintegração
A advogada reforça a importância do benefício, destacando que ele se aplica a presos em regime semiaberto, que posteriormente progridem para o regime aberto. “O objetivo é reintegrá-los de forma gradativa, para que, após o cumprimento da pena, a ressocialização, uma das finalidades da execução penal, seja efetivamente alcançada.”
Diferença da permissão de saída
A saída temporária é distinta da permissão de saída. Esta última é autorizada pelo diretor do presídio apenas em situações específicas, como falecimento ou doença grave de familiares, ou ainda para tratamento médico. Nesses casos, o preso deixa a unidade por tempo limitado e sob escolta armada.