domingo, 28 setembro 2025
FAUNA E FLORA AMEAÇADAS

Queimadas se tornam rotina na região e ameaçam fauna silvestre e equilíbrio ambiental

Em cidades como Americana, animais silvestres sofrem com queimaduras, perda de habitat e escassez de alimento. Especialistas alertam para impactos na biodiversidade e no ciclo natural da vegetação
Por
Andressa Oliveira

As queimadas, cada vez mais frequentes na região, vêm deixando um rastro profundo de destruição. Em meio às chamas que consomem matas, terrenos baldios e reservas ambientais, quem mais sofre são os animais silvestres. Muitos morrem queimados, outros são resgatados com ferimentos graves. Há ainda aqueles que, desesperados, fogem sem rumo em busca de abrigo, e nem sempre conseguem.

O fogo, muitas vezes invisível até que seja tarde demais, não destrói apenas o que se vê. As consequências vão além das árvores carbonizadas. A fumaça e o calor alteram o ciclo natural da vida, comprometendo a alimentação, a reprodução e a sobrevivência das espécies.

As consequências vão além das árvores carbonizadas. A fumaça e o calor alteram o ciclo natural da vida. Foto: Reprodução/TV TODODIA

Impactos na fauna: uma cadeia alimentar em risco
O especialista em aves, Gustavo Pinto, reforça os impactos ambientais causados pelas queimadas. “Você ouve os mais antigos dizendo que, neste ano, o pé de manga não deu fruto. Ou que o pé de pitanga não carregou. E a explicação pode estar nas queimadas”, afirma.

A morte de insetos polinizadores, como abelhas e outros pequenos invertebrados, interrompe o processo de frutificação das árvores. Com menos flores polinizadas, há menos frutos. E com menos frutos, o alimento de aves, mamíferos e outros animais desaparece.

Afeta a reprodução de espécies
Segundo Gustavo, a perda de habitat também tem afetado diretamente a reprodução das espécies. Aves que nidificam no chão, como muitas corujas, têm seus ninhos destruídos pelo fogo, perdendo filhotes e refúgios. Mamíferos que vivem em ocos de árvores, barrancos e pedras também são atingidos. “Uma queimada não afeta só o alimento, mas o próprio local onde esses animais vivem e se reproduzem”, explica.

Aves que nidificam no chão, como muitas corujas, têm seus ninhos destruídos pelo fogo .Foto:Reprodução/TV TdodoDia Alessandro Araújo

Em Americana, Gustavo resgatou três filhotes de coruja durante um incêndio recente no parque universitário da cidade. “Elas fazem ninho no chão e estavam prestes a morrer queimadas”, conta.

Outros casos também chamam atenção em outras regiões do estado. Em Teodoro Sampaio, uma anta foi encontrada com queimaduras graves. Já em São Roque, um filhote de gato-do-mato escapou das chamas com o corpo chamuscado. Até setembro de 2024, o número de resgates no estado já somava 94, mais da metade dos animais não resistiram.

Danos ambientais de longo prazo
As consequências das queimadas vão além da fauna. O impacto na vegetação e no solo compromete todo o ecossistema. “A floresta até se regenera com o tempo, por meio de sementes adormecidas no solo. Mas queimadas sucessivas impedem esse processo”, alerta o especialista.

Na cidade de Americana, apenas em um período de 12 meses, a Secretaria do Meio Ambiente registrou 49 focos de queimada em terrenos de até 500 metros quadrados, totalizando 24.500 m² de área destruída. Também foram registradas 22 queimadas em áreas de até 1.000 m², além de várias ocorrências em regiões superiores a 20.000 m², como no Vale do Rio Branco, na Gruta da Inês e nas proximidades do aeroporto.

A maioria desses incêndios, segundo as autoridades ambientais, tem origem criminosa. “Pode até haver casos raros de combustão espontânea com lixo, vidro e calor, mas a grande maioria é ação humana. É por isso que insistimos na conscientização da população, especialmente contra o uso do fogo para limpar terrenos”, afirma Fábio, secretário de Meio Ambiente.

Efeitos para além da biodiversidade
As queimadas também afetam diretamente a saúde humana. A fumaça agrava doenças respiratórias, especialmente em crianças e idosos. Além disso, há perda da microbiologia do solo, aumento da poluição hídrica e contribuição significativa para o efeito estufa.

Com a chegada das chuvas, a terra queimada facilita a lixiviação, processo de erosão e escoamento de matéria orgânica e resíduos, que acaba atingindo córregos e rios, prejudicando ainda mais a qualidade da água.

Respostas e ações emergenciais
Em Americana, animais feridos estão sendo encaminhados ao Parque Ecológico da cidade, onde recebem os primeiros atendimentos veterinários. Casos mais graves são enviados para centros especializados.

Em uma das ocorrências recentes, um jabuti foi encontrado com queimaduras graves às margens do Ribeirão Quilombo, mas sobreviveu graças ao rápido resgate feito pela Guarda Municipal.

Em uma das ocorrências recentes, um jabuti foi encontrado com queimaduras graves às margens do Ribeirão Quilombo. Foto:Divulgação/GAMA

Intensificação de ações
Autoridades locais também vêm intensificando as ações de reflorestamento em áreas atingidas. Empresas com obrigações ambientais estão sendo acionadas para colaborar com a recomposição da vegetação.

Apesar dos esforços, a sensação é de que, a cada novo foco de incêndio, uma nova história de perda recomeça. A urgência por ações efetivas, fiscalização mais rígida e educação ambiental se impõe como único caminho possível para preservar o que ainda resta da fauna e flora do interior paulista.

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