sábado, 23 novembro 2024

O renascimento do Alentejo

 Região portuguesa líder de mercado no Brasil, já viveu décadas de ostracismo

O Alentejo é hoje a origem de vinhos do velho mundo mais vendida no Brasil. Frisando que não são apenas a origem portuguesa campeã, mas de toda a Europa. Importamos ano passado quatro milhões de litros de lá.

Apesar do vinho ter história milenar na região, o Alentejo renasceu nas últimas décadas. Basta dizer que em meu primeiro livro, “O vinho para quem tem estilo”, escrito nos anos 1990, no qual eu detalhava as principais regiões portuguesas, eu sequer citava o Alentejo.

A explicação é simples. Durante o chamado Estado Novo, que governou Portugal entre 1933 e 1974, o Alentejo foi designado como “celeiro de Portugal”. A maior parte das vinhas foi substituída por cereais. Com a Revolução dos Cravos em 1974, lentamente a região retomou sua vocação para o vinho. Até os anos 1970 havia menos de 200 hectares de vinhedos na região. Hoje, são 22 mil. Metade dos vinhos consumidos atualmente em Portugal são do Alentejo, que conta com cerca de 2 mil viticultores e 200 vinícolas, produzindo mais de 100 milhões de litros.

Embora centenas de castas estejam em produção na região, as mais típicas são, nas tintas: alicante bouschet, aragonez (também chamada tinta roriz no Douro e tempranillo na Espanha) e trincadeira. Nas brancas, antão vaz, arinto e roupeiro. Outras castas, menos tradicionais na região, estão sendo cada vez mais plantadas, como syrah, touriga nacional e, principalmente, touriga franca.

O maior motivo do avanço destas variedades é a mudança climática, com aumento das temperaturas e da falta de água – fator crítico na região. Estive no início do mês no Alentejo e vivi dias de mais de 40 graus, visitando vinhedos destruídos pelo calor e a seca. Uma situação grave, que assola várias regiões vinícolas ao redor do planeta. Motivada por esta situação, a Comissão Vitivinícola Regional Alentejana (CVRA), em parceria com a Universidade de Évora, desenvolveu o Programa de Sustentabilidade dos Vinhos do Alentejo (PSVA), iniciativa pioneira em Portugal.

O programa, com certificação gratuita, engloba 19 quesitos como gestão da vinha, dos solos, dos resíduos, da energia e da já citada água. A iniciativa já conseguiu reduzir em várias vinícolas o consumo de energia em 30% e de água em 20%, além de aumentar a taxa de reciclagem em quase 40%. São certificadas 122 viticultores e 42 vinícolas, englobando mais da metade do vinho produzido na região.

Uma peculiaridade alentejana são os “vinhos de talha”, um sistema ancestral herdado dos antigos romanos que estiveram na região. Estes vinhos artesanais, feitos em ânforas de barro, reconhecidos como Patrimônio Cultural Imaterial da Unesco, fazem do Alentejo o único local do mundo, junto à Geórgia, no leste da Europa, com produção contínua em ânforas há mais de dois mil anos. 

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