O conceito de marido abusivo acaba de ser redefinido – e com uma sinistra pitada de ficção científica. Esqueça-se os habituais dramas de cônjuges psicopatas, de “Dormindo Com o Inimigo” (1991), “Custódia” (2017) e até mesmo “Atração Fatal” (1987) – em que o pesadelo, afinal, era uma amante (Glenn Close).
Dirigido e roteirizado pelo australiano Leigh Whannell, “O Homem Invisível” sintoniza a alta ambição de revisitar o estilo Alfred Hitchcock na montagem, na música e nas reviravoltas súbitas, criando uma tensão genuína.
Ao abrir mão de sustinhos baratos, o longa faz justiça, apesar de todas as liberdades que toma, ao espírito da história original homônima de H.G. Wells, de 1897, e que inspirou inúmeros filmes e seriados bem diferentes desta nova e eletrizante versão.
A estrela da série “O Conto da Aia”, Elisabeth Moss, cai com perfeição no papel de Cecilia Kass, a mulher que luta desesperadamente para libertar-se do marido, Adrian Griffin (Oliver Jackson-Cohen) -personagem que empresta do livro o sobrenome e a profissão de cientista, no caso um especialista em óptica.
Para Cecilia, a dramática questão é escapar de Adrian, que montou em sua mansão não só um laboratório para suas experiências misteriosas, como também uma verdadeira prisão para a mulher.
Observadora e persistente, ela encontra uma brecha para fugir, numa sequência inicial que já mobiliza a adrenalina.
SUSPENSE
O grande lance da história surge quando Cecilia é avisada da morte do ex-marido, causada aparentemente por um suicídio, e recebe do irmão dele, Tom (Michael Dorman), a informação de que o testamento lhe legou uma fortuna.
As boas notícias acabam aqui, porque o cotidiano dela passa a ser atormentado por uma presença invisível, que a leva a crer que Adrian não só está vivo, como também empenhado em enlouquecê-la.
A hipótese anormal fornece o gatilho da história, na qual a mulher atormentada se vê desafiada pelos próprios medos -quem não acreditaria que se trata de simples loucura, já que os sinais materiais do perseguidor misterioso não são vistos por mais ninguém?
Atriz refinada, Elisabeth Moss garante a cumplicidade do público e mantém a distância qualquer resquício de histeria ou overacting que pudessem abrir caminho a uma insinuação de horror trash, um perigo cabível em alguns desdobramentos da história. Mas não.
O diretor mantém o foco no dilema da protagonista e cria cenas de luta e violência que certamente ultrapassam o que Hitchcock mostraria -mas não abusa delas.
Se há um pequeno senão no conjunto é no quanto o resto do elenco não está à altura de Moss. O filme, contudo, é tão intenso que muita gente nem vai reparar nisso.