As escolas começaram a fechar nos Estados Unidos no dia 12 de março. Logo em seguida, entre os dias 14 e 16 do mês passado, o número de novas assinaturas da plataforma de streaming da Disney, chamada Disney+, triplicou em relação ao mesmo período da semana anterior, segundo dados coletados pela Antenna, empresa de análise do setor.
Os dados foram corroborados em seguida pela própria Disney, ao anunciar nesta semana que havia atingido 50 milhões de assinantes da Disney+, cinco meses depois de seu lançamento. Mais de 20 milhões deles, 75%, assinaram o serviço nos últimos dois meses.
A Disney+ cresceu em parte pela chegada nas últimas semanas a oito mercados europeus, inclusive Alemanha, França e Reino Unido, e à Índia. Ela só deverá estrear em países da América Latina, inclusive o Brasil, entre o final deste ano e início do próximo.
Segundo analistas, o salto recém-divulgado reflete antes de mais nada o impacto do isolamento causado pelo coronavírus. “As escolas estão fechadas em quase todo o mundo, e as crianças estão em casa”, diz Guy Bisson, da consultoria britânica Ampere.
“A Disney+ é voltada claramente ao conteúdo familiar, um mercado muito forte para streaming. As pessoas que tendem a assinar um serviço, em sua maioria, cuidam de crianças em casa.”
Para Lucas Shaw, analista da Bloomberg, o crescimento da Disney era esperado e surpreendeu mais pela rapidez. Ele levanta questionamentos aos dados, como o fato de incorporarem 8 milhões de assinantes já existentes do serviço indiano Hotstar, que só mudou de nome, e o preço baixo nos EUA, ainda de lançamento, US$ 6,99, cerca de metade do valor cobrado pelo serviço padrão da Netflix.
Mas reconhece que 50 milhões em cinco meses, em contraste com os 167 milhões alcançados em 13 anos pelo streaming da Netflix, é um resultado assombroso.
Rich Greenfield, da consultoria americana LightShed, descreve o isolamento como oportunidade para a Disney acelerar a mudança já prevista, dos cinemas que o grupo dominava –e permanecerão fechados por muito tempo– para o streaming, se ampliar a oferta de “blockbusters” e cobrar mais pela assinatura.
“A disrupção de si mesmo é difícil, muito difícil, mas nunca haverá momento melhor para uma virada da Disney”, diz, acrescentando ser preciso ter coragem para explodir os velhos negócios, como os parques temáticos, hoje igualmente parados, para “vencer no longo prazo”.
Bisson avalia como uma oportunidade também para plataformas nacionais como Globoplay, da Globo, ou a recém-lançada BritBox, das britânicas BBC e ITV. Em sua visão, todos os serviços de streaming estão se beneficiando do “coronavirus bump“, ou o solavanco do isolamento.
Por outro lado, grupos tradicionais de mídia como Disney e Globo enfrentam perda acelerada de receita, com o choque econômico causado pelo mesmo isolamento. “Para as emissoras de TV em especial, a publicidade está em queda considerável”, diz.
“A grande questão é a velocidade com que vamos atravessar a pandemia. Não estaremos de volta à vida normal antes do terceiro trimestre. Serão meses desafiadores, em receita. E aí vamos entrar em recessão. Os cortes de custos já começaram e serão constantes.”
O maior movimento para cortar custos veio também da Disney. Um dia depois do choque positivo dos 50 milhões sobre suas ações em Wall Street, o grupo começou a enviar os avisos de licença para funcionários de seus estúdios em Hollywood, que incluem Marvel, Lucasfilm e 20th Century Fox.
A Disney já havia informado publicamente que entrariam em licença as “funções que não são necessárias neste momento”, com a suspensão das estreias de cinema e das próprias produções.
A paralisação das produções é outro desafio para o streaming, diz Bisson, mas que atinge tanto os novos serviços quanto a Netflix. “Entre o terceiro e o quarto trimestre, muito da programação não estará mais lá”, avisa.