O tatuador e ilustrador de Americana Julio Lisboa, de 39 anos, é o único morador do estado de São Paulo e um dos três brasileiros escolhidos para participar da exposição “Dürer Under Your Skin” (Dürer Sob Sua Pele), no Museu Albrecht Dürer, em Nuremberg, na Alemanha. Albretch Dürer, que dá nome ao museu, morou e criou muitas de suas obras no espaço que hoje abriga trabalhos de outros artistas de vários nacionalidades.
Entre mais de 300 imagens recebidas, o museu selecionou trabalhos de tatuadores do mundo inteiro, inspirados nas obras de Dürer, considerado um dos valores pintores e gravurista do século XVI e grande nome do renascimento nórdico. Julio teve a releitura da ilustração“ Adão e Eva” (1507), concebida pelo artista alemão, escolhida para compor o catálogo da exposição. A obra foi tatuada em um cliente de Americana.
A exposição busca trazer uma amostra da arte produzida por diversos artistas que puderam mergulhar no universo das criações de Dürer, transpondo as peças para a pele e posteriormente passar a experiência visual diferente aos visitantes do museu.
Julio teve conhecimento de que o museu teria essa curadoria por meio de um amigo de profissão que teria impulsionado o artista a encaminhar alguns de seus projetos inspirados em Dürer.
“Antes do pessoal do museu colocar a pauta para os artistas enviarem eu conversei com o museu e enviei meus projetos. Eu enviei cerca de dez tatuagens inspiradas nele, mas nem todas (as fotos) estavam na resolução que eles precisavam”, diz.
Lisboa, que tatua há seis anos, trabalhou por mais de uma década no ramo da engenharia até decidir viver do seu sonho de trabalhar com arte. Mesmo com muita prática em pouco tempo de atuação, ele relata que nunca imaginaria que nesse período chegaria a participar de uma homenagem para um artista considerado uma de suas maiores inspirações.
“Essa exposição, pra mim, contém várias realizações pessoais. Foi uma realização muito legal, é algo que eu jamais imagina. Se falasse para mim que o Julio de 2017 teria uma tatuagem exposta no museu na Alemanha eu falaria que você estaria inventando coisa”, destaca ele, reforçando que isso faz parte de reviravoltas da vida que ele nem imaginaria passar.
TRAJETÓRIA
O primeiro contato com arte, assim como o interesse do tatuador, surgiu nos anos 90 por influência do pai, que era pintor de letreiros e fachadas e apresentava o universo de desenhos e pinturas ao filho. Desde criança conviveu entre tintas e desenhos e não teve como não se encantar com arte.
Todas essas referências começaram a aflorar à medida que Lisboa crescia. A partir do contato com histórias em quadrinhos, Júlio passou a desenhar mais e, como ele mesmo diz, passou a ser conhecido entre seus amigos desde então como “um cara que desenha”.
Lápis, tintas e papéis eram um sonho de trabalho que foi deixado de lado por mais de uma década. O artista se especializou na área da Engenharia Civil e trabalhou por 12 anos em uma multinacional em Campinas. “Carreguei esse desejo de trabalhar com arte comigo durante muitos anos, mas trabalhar com ilustração no Brasil é muito complicado então nessa época acabei me desviando”, desabafa.
MUDANÇA DE VIDA
Em 2018, Julio passou a se questionar sobre seus rumos profissionais. Quando um amigo pessoal, que também tinha abandonado o ramo da engenharia para trabalhar de tatuagem iniciou um curso, ele teve seu despertar para trabalhar com arte novamente.
“Até 2017 eu nunca tinha visto uma máquina de tatuagem na minha frente, não tinha tatuagem e nunca tinha visto na minha frente como funcionava. Não sabia como se colocava agulha e nem como ela entrava na pele, até pedir pra ele me ensinar como funcionava”, relata.
Em visitas a São Paulo, ele passou aprender com esse amigo e utilizar das redes sociais para imergir na arte da tatuagem e aprender mais com outros artistas, aumentando sua rede de apoio.
Ao retornar em Americana, ele relata que não sentia mais vontade de seguir na engenharia, pediu “as contas” da empresa e criou a sala do seu apartamento em um estúdio de tatuagem.
“Naquela época eu achava que tatuagem seria um hobbie, que eu tatuaria de vez em quando uns amigos. Fiz uma tatuagem, duas, fui evoluindo no aprendizado da arte, comecei a postar no Instagram, veio cliente aparecendo e com três meses de tatuador vinha gente de outra cidade tatuar comigo na sala da minha casa”. Julio relembra que nesse momento ele notou que o negócio estava ficando sério e hoje ressalta que essa arte o levou para lugares inimagináveis em sua vida.
Atualmente o artista está passando uma temporada nos Estados Unidos, mas em breve, relata que deve voltar a Americana. Para acompanhar os trabalhos, o artista utiliza do Instagram com seu codinome artístico “Meio Pulmão”: https://www.instagram.com/meiopulmao/
“A minha vida ela mudou muito quando eu comecei a obedecer o que meu coração queria. Quando eu comecei a tatuar eu coloquei todo o meu dinheiro, resultado de uma vida toda de trabalho nisso, eu sentia que eu precisava disso […] você tem que cair de cabeça, tem que ir até o final, cheguei até o extremo que eu pude para poder seguir isso”.