Em meio ao avanço da paisagem urbana em constante transformação, dois casarões se impõem, ainda que em ruínas, como marcos do passado de Americana. O Casarão Hermann Mülller e o Casarão do Salto Grande são construções que atravessam séculos e revelam a história do município que vai da industrialização à emancipação política, passando por ciclos da imigração, escravidão e desenvolvimento cultural.
Casarão Hermann Müller
Erguido em 1909 no bairro Carioba, por muitos anos o equipamento refletiu a prosperidade de uma família que redefiniu os rumos da cidade. Construído em estilo ítalo-germânico, o palacete tem 53 cômodos distribuídos em cinco pavimentos.
A família Müller, de origem alemã, adquiriu a Fábrica de Tecidos Carioba em 1901 e, com dinheiro estrangeiro, reativou a produção, chegando a empregar cerca de mil funcionários.
O investimento ampliou a vila operária, impulsionou o comércio e criou uma vida social intensa, com clubes, regatas, teatro e até cinema, atraindo visitantes de outras cidades. Herman Müller, filho mais velho do comendador, tornou-se figura política influente, presidindo o Partido Republicano Paulista (PRP) e participando das articulações que levaram à emancipação de Americana.
“Então, cria-se uma vida social que acaba atraindo inclusive turistas de outros lugares. Que pela pequena distância, então muita gente vinha de fora, podia desembarcar no trem. Isso eu estou falando do início do século 20”, afirma o historiador André Maia.
Hoje, o casarão abriga a Casa de Cultura “Hermann Müller”, mas enfrenta o desgaste do tempo.

Casarão do Salto Grande
Mais antigo e ainda mais emblemático, o Casarão do Salto Grande remonta ao século 18. Construído em taipa de pilão, é um dos maiores exemplares do país desse tipo de arquitetura. Localizado no ponto de encontro dos rios Atibaia e Jaguari, onde nasce o Rio Piracicaba, o casarão guarda camadas de história. Ali se discutem temas como escravidão, legislação imperial e imigração italiana.
“Em 1700, eu não recordo a data de construção, embora ele também foi sendo aumentado, ele, por ser tão antigo, tem muitas histórias e vai trabalhar em diversos períodos da história do país e, consequentemente, dessa localidade. Então, ali é o ponto de partida para diversos tipos de investigação dentro da história. Então, seja a história da escravidão, por exemplo, porque ali já existiam escravos, a gente pode trabalhar a questão do tipo de cultura que então era produzido”, afirma André.
Em 1982, o imóvel foi tombado pelo Condephaat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo), e agora abriga o Museu Histórico e Pedagógico “Dr. João da Silva Carrão”, com acervo que vai de objetos da Revolução de 1932 a mobiliário médico e peças da 2ª Guerra Mundial.

Preservação da história
Para o historiador, a preservação desses espaços é crucial para a identidade local. “Sem a família Müller, talvez a emancipação de Americana tivesse ocorrido muito depois, se é que teria ocorrido. O fator econômico foi decisivo. Mas hoje a cidade trata seu patrimônio de forma superficial, mais como publicidade do que como política de memória. A construção do sentimento de pertencimento começa na infância, e conhecer a história do lugar onde se vive é fundamental”, alerta.