sábado, 3 maio 2025
CICLO RENOVADO

Reforma tributária, cotas para trans e parcerias na segurança: confira os principais desafios do novo reitor da Unicamp, Paulo Cesar Montagner

Em entrevista exclusiva à TV TODODIA, ele falou sobre as prioridades de sua gestão, citou o pioneirismo no esporte paralímpico e respondeu a questionamentos a respeito de problemas crônicos da universidade
Por
Airan Prada

No último dia 28, o professor doutor em Educação Física Paulo Cesar Montagner, de 61 anos, tomou posse como reitor da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas).

Ele foi nomeado pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP) após ser o primeiro colocado em um lista tríplice definida em consulta pública com professores, alunos e servidores.

Em entrevista exclusiva à TV TODODIA, Montagner falou sobre as prioridades de sua gestão, citou o pioneirismo no esporte paralímpico e respondeu a questionamentos a respeito de problemas crônicos da universidade.

A universidade depende majoritariamente de recursos estaduais. Quais os desafios que sua gestão tem a partir da reforma tributária, sancionada pelo presidente Lula (PT) no início do ano?

Em 1989, houve um conceito de autonomia universitária, quando o governo do estado de São Paulo concedeu às universidades paulistas (USP, Unicamp e Unesp) uma porcentagem do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços), o principal tributo estadual. Atualmente, elas recebem 9,57% da arrecadação.

Com a reforma tributária, o ICMS será substituído, a princípio, pelo IBS (Imposto sobre Bens e Serviços). Através do Conselho de Reitores das três universidades, elaborou-se um documento que foi encaminhado ao estado, fazendo a defesa de que o nosso percentual de ICMS seja transformado exatamente no mesmo percentual em IBS.

Diferentemente das outras universidades paulistas, a Unicamp ainda mantém unidades de saúde como o HC (Hospital de Clínicas), o CAISM (Centro de Atenção Integral à Saúde da Mulher), entre outras. Isso significa que 23% a 24% do orçamento da Unicamp são destinados à saúde. Em 2029, a reforma tributária terá efeitos mais diretos. É necessário, portanto, defender essa percentualização em níveis similares aos que temos hoje.

Paulo Cesar Montagner, recém-empossado reitor da Unicamp. Foto: Reprodução/TV TODODIA

Quais são os projetos de extensão que podem ser impulsionados para que a universidade esteja cada vez mais próxima da comunidade?

A face mais visível da universidade para a população é, de fato, o setor da saúde, devido à importância do seu papel na assistência. Mas, falando da minha área, a Educação Física, posso destacar um projeto que envolve o esporte paralímpico.

Quando a Faculdade de Educação Física foi criada, em 1985, tivemos um colega, o professor Edson Duarte, que percebeu, através da liderança que exercia, que o esporte adaptado, hoje chamado de paralímpico, precisava de alguém que o acolhesse.

Esse movimento gerou um modelo de extensão universitária, no qual diversas entidades passaram a atuar em suas áreas específicas. Tetraplégicos, paraplégicos, surdos e pessoas com outras deficiências começaram a participar desses programas.

Com isso, fomos construindo um modelo integrado de extensão, ensino e pesquisa. Formamos as primeiras gerações de pessoas que passaram a estudar o esporte paralímpico. Para se ter uma ideia, na última paralimpíada, realizada em Paris, havia um número expressivo de profissionais formados em nossos cursos de graduação e de pós-graduação representando o Brasil: técnicos, professores, treinadores, supervisores de ensino, supervisores pedagógicos esportivos e gestores do Comitê Paralímpico.

Ou seja, um projeto de extensão que começou no final dos anos 1980, resultou — 40 depois — em uma história consolidada e de grande relevância no cenário do esporte paralímpico.

Recentemente, a Unicamp aprovou o modelo de cotas para pessoas trans, travestis e não binárias. Quais são os critérios? Como isso foi discutido? Trace um panorama do tema.

Antes de assumir a reitoria, eu estava aqui na chefia do gabinete do professor Tom Zé [Antonio José de Almeida Meirelles, ex-reitor da Unicamp]. Logo que esse assunto foi debatido e aprovado, recebemos um volume significativo de mensagens — algumas concordando, outras discordando.

Reconheço que o assunto é polêmico. Mas o que eu tenho dito às pessoas é que a universidade é o local onde essas diferenças precisam ter espaço de discussão.

Não é um tema novo, visto que mais de 10 universidades já haviam aprovado as cotas. A Unicamp pautou essa discussão com base em estudos científicos, acadêmicos relevantes, estudos de campo que apresentaram argumentos favoráveis e contrários.

A decisão do Conselho Universitário foi pela aprovação. E ela não vai tirar nada de ninguém, porque são vagas adicionais. A universidade estabelece que, se um curso tiver 30 vagas, ele poderá ter mais uma. Se tiver mais de 30, poderá ter até mais duas. Estamos, neste momento, nos organizando para oferecer as cotas no próximo vestibular.

É importante que as pessoas saibam que, dentro do nosso sistema de cotas, há também competição interna. Não é porque alguém está passando na rua que vai dizer: “vou entrar na Unicamp.” Existe um processo seletivo público, com critérios rigorosos, normas e princípios.

O professor Antonio Meirelles, o Tom Zé, transfere o colar reitoral a Paulo Cesar Montagner durante cerimônia de posse. Foto: Divulgação/Unicamp

Outra novidade na Unicamp foi o anúncio de novos cursos. Poderia detalhar quais são e quando haverá vestibular para os interessados?

Felizmente, após muito trabalho e estudos, anunciamos agora em março, no Conselho Universitário, a criação de quatro novos cursos. Entre eles, o de Direito.

A Unicamp, em seus 60 anos de história, nunca teve um curso de Direito. Há um consenso dentro da universidade sobre a importância dessa área, para que possamos, como uma instituição pública robusta — com pesquisa de alta performance, assistência à saúde de alta complexidade e ensino qualificado —, também influenciar o desenvolvimento e a produção acadêmica em áreas que ainda não fazem parte da nossa estrutura.

O curso de Direito será oferecido com 50 vagas no período diurno e 50 vagas no período noturno. Também teremos os cursos de Fisioterapia, com 40 vagas, Licenciatura em Inglês, com 30 vagas, e Licenciatura em História, com 50 vagas. No total, os novos cursos devem ter mais de 200 alunos.

Montagner e o editor multicanal da TV TODODIA, Airan Prada, durante a entrevista. Foto: Reprodução/TV TODODIA

Qual é o planejamento para intensificar a segurança nos campi, visto que é uma demanda crônica de professores, alunos e servidores?

O campus da universidade é aberto para que as pessoas se sintam bem acolhidas ao chegar nele. Barão Geraldo, sede de Campinas, era um bairro, um subdistrito bastante rural, que se transformou numa pequena cidade, com aproximadamente 80 mil habitantes. Então, quando há essa estrutura geográfica, há desafios de segurança.

Temos um setor especializado, denominado Secretaria de Vivência, com uma metodologia de interação e de cuidado aos frequentadores. A pasta não é punitiva, mas sim orientativa, pedagógica. Porém, na necessidade, também corrigimos delitos em parceria com as forças de segurança. Há ainda outros mecanismos, como o botão de pânico e um aplicativo para que as pessoas se organizem e nunca circulem sozinhas pelo campus.

Em relação à parte externa, aos arredores, a responsabilidade é da municipalidade, mas temos boa relação com todo esse entorno, com os conselhos de segurança, que também interagem com os conselhos de força policial, para que deem proteção.

Por fim, nós já liberamos um terreno para construir, entre a divisa da Unicamp com a Pontifícia Universidade Católica, a construção de um Corpo de Bombeiros, que apoiará toda a região de Barão Geraldo.

Na consulta pública para escolha do novo reitor, você foi o favorito entre professores e alunos, mas preterido entre os servidores. Como lidar com essa questão?

Sempre tivemos um cuidado muito especial com os três grupos da Unicamp [professores, alunos e servidores], que a gente transforma num corpo só.

Terminada a campanha, passamos a liderar um programa a ser implementado pela reitoria, institucional, respeitando as coisas boas que a gente observa nos outros projetos.

A partir de agora, procuramos o bem comum, o consenso, em que todas essas tensões passem por uma descompressão, coerente com os princípios acadêmicos e de gestão pública.

Para encerrar, o que o reitor Paulo Cesar diria para o Cesinha, do passado, da primeira graduação?

O Cesinha que se formou em Educação Física em 1984 tinha o sonho de ter um bom emprego, que é o de qualquer jovem. A Unicamp mudou minha vida, porque eu cheguei aqui em 1988, na Faculdade de Educação Física, então recém-criada. Tomei um choque positivo quando eu entendi o que era uma universidade, a riqueza que ela contempla.

Fui construindo o meu projeto de trabalho baseado em dar aulas, em fazer pesquisa, e o sistema foi percebendo que eu tinha alguma capacidade de fazer gestão. Devo isso muito ao esporte, onde é preciso administrar tensões, sobretudo nas modalidades coletivas.

Agradeço aos meus antecessores, que construíram uma faculdade de educação física em uma universidade de alta performance, como a Unicamp, de forma que nós fomos, lenta e gradualmente, ocupando o espaço por merecimento e com muito trabalho.

Portanto eu diria para aquele Cesinha, que não tinha esse sonho, que, ao chegar aqui, o único segredo é trabalhar bastante.

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