sexta-feira, 19 abril 2024

Só faltou um detalhe a Mascherano

Javier Mascherano, 36, se aposenta do futebol como campeão de quase tudo. Mas por clubes. Pela Argentina, um dos seus momentos mais memoráveis (e que resume sua trajetória pela seleção) foi quando arengou os companheiros durante a Copa de 2014 com a frase de que estava “cansado de comer merda”.

Com as camisas de River Plate, Corinthians e Barcelona conquistou as ligas nacionais de Argentina, Brasil e Espanha. Ganhou duas vezes a Champions League e o Mundial de Clubes pela equipe catalã. Foi lá que se reinventou como zagueiro no time dirigido por Pep Guardiola, um dos maiores da história do futebol.

Nenhum jogador representou tanto o jejum de títulos da seleção argentina quanto o volante que apareceu no River Plate em 2003, como uma das maiores promessas da agremiação naquela década.

Suas únicas vitórias com a camisa alviceleste aconteceram nas Olimpíadas de Sydney-2000 e Atenas-2004, quando a equipe ficou com a medalha de ouro. Mas são torneios sub-23, de menor relevância. Com o elenco principal, foi vice quatro vezes na Copa América (2003, 2007, 2015 e 2016) e uma no Mundial de 2014.

“Eu com certeza trocaria muito do que conquistei por clubes por um título pela seleção”, disse Mascherano antes da Copa de 2018, na Rússia.

A derrota nas oitavas de final diante da França foi sua última partida pela Argentina. “Tentei muitas vezes, mas não deu. Creio que chegou a hora de dar chance para outros”, afirmou, com a voz embargada e os olhos cheios d’água.

Foi pela seleção a sua primeira partida profissional. Em junho de 2003, ele entrou em campo em amistoso contra o Uruguai, em La Plata, antes mesmo de ter atuado pelo River Plate.

Sua primeira tristeza com o time nacional veio antes disso. Javier foi um dos sparrings (garotos das categorias de base que ajudam nos treinos dos profissionais) da Argentina na Copa do Mundo de 2002, na Coreia/Japão.

Imagens de TV mostraram os demais meninos comemorando quando Crespo marcou nos acréscimos para empatar contra a Suécia, na última rodada da fase de grupos. Mascherano foi o único a não celebrar. Ficou sentado, com uma expressão abatida. Ele sabia não ser o bastante. A seleção precisava vencer e acabou eliminada.

Mesmo quando Lionel Messi era capitão, o verdadeiro líder sempre foi o volante. Assim que Alejandro Sabella assumiu como técnico em 2011, viajou a Barcelona para conversar com a dupla. Pediu a Mascherano que oferecesse a braçadeira para Messi porque o treinador queria ver o maior craque da equipe assumindo maior postura de comando em campo.

Mas no Mundial seguinte, no momento da disputa de pênaltis na semifinal diante da Holanda, foi Mascherano quem motivou Romero, ao gritar que aquele seria o dia em que o goleiro viraria herói. Ele defendeu duas cobranças e a Argentina foi à decisão, perdida para a Alemanha em um resultado que o cabeça de área confessa ainda machucá-lo.

Mais dolorido até do que o carrinho que deu contra os holandeses para evitar que Arjen Robben fizesse o gol que poderia decidir a semifinal. No lance, ele rasgou o ânus.

Talvez por isso Javier tenha insistido em deixar o Barcelona e ir para o Hebei China Fortune em 2018, meses antes do Mundial da Rússia. Queria deixar a zaga, voltar a ser de volante e se credenciar a ir ao torneio nessa posição, aos 34 anos. Jorge Sampaoli acatou o desejo, o que levou parte da imprensa da Argentina a voltar a falar que a seleção não passava de um confraria de amigos de Lionel Messi.

“Eu sou amigo de Leo? Sou, claro. Eu jogo na seleção por ser amigo dele? Claro que não. Isso é ridículo”, rebateu Mascherano.

Sua falta de pernas nos quatro jogos na Copa de 2018 acentuaram ainda mais os problemas defensivos da equipe. Ele fez o pênalti contra a Nigéria que quase causou a eliminação na fase de grupos. No duelo das oitavas de final, N’Ggolo Kanté foi para a França em 2018 o que Mascherano havia sido para a Argentina em 2014.

Definido por Guardiola como um jogador de característica “única” no Barcelona, ele deixou o River Plate no final de 2004 para ser um dos reforços contratados pela empresa MSI para o Corinthians no início do ano seguinte. Conquistou o título brasileiro e foi levado, junto com Carlos Tevez, para o West Ham em 2006. Duas aquisições tão polêmicas que a Fifa depois proibiu que pessoas jurídicas fossem donas de direitos econômicos de atletas.

Depois de ficar por três temporadas no Liverpool, chegou ao Barcelona em 2010. Voltou à Argentina no ano passado para atuar pelo Estudiantes. Fez isso apenas sete vezes. Após a derrota para o Argentinos Juniors, sábado (14), decidiu parar.

“Vivi minha profissão 100%, o máximo que pude”, resumiu, na despedida, o jogador que será sempre lembrado pelos seus 147 jogos pela seleção.

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