“Nunca é tarde para nada na vida. Essa coisa de idade é bobagem”, afirma a pedagoga Liça Bomfim, 78 anos.
Ela ficou casada por 34 anos. Passou outros 14 anos solteira e tranquila. Aos 70, decidiu que a vida seria melhor com alguém ao seu lado.
Ela não é a única. Há muitos casais maduros que recomeçam suas vidas amorosas até mesmo após os 80.
“A vida muda nessa idade e a necessidade de ganhar mais dinheiro para criar os filhos fica para trás. Sem muita função, um novo amor devolve sentido à vida, dá um outro propósito para o dia a dia”, diz Yuri Busin, psicólogo, doutor em neurociência do comportamento pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.
Com os filhos criados, Liça começou a sentir que precisava de mais companhia e cedeu aos pedidos de sua filha para se cadastrar no site de relacionamentos Par Perfeito.
Conversa vai, conversa vem, ela decidiu conhecer de perto o engenheiro químico Luiz Rocha, na época com 79 anos, hoje com 87.
“Nos encontramos em um lugar público para conversar de forma segura. Fui com uma rosa para ela”, lembra ele.
Luiz estava viúvo. “Morava sozinho e fiquei cansado disso. Fui casado por 52 anos, mas pensei: ‘Onde eu ia encontrar alguém? Na fila do supermercado ou na farmácia?”, questiona aos risos.
Foi quando apostou na internet e encontrou Liça.
Oito anos após se conhecerem, os dois estão casados.
“Relutei um pouco para morar junto, porque tive medo de perder a liberdade. Não queria novamente ficar presa às funções da casa”, diz a pedagoga.
Nada disso aconteceu. “Está tudo muito melhor.” Os dois vão ao cinema, fazem jantares e viajam.
As famílias logo se integraram também. “Tenho amigas que não tiveram um boa experiência no casamento e acabaram desistindo. Mas cada experiência é única”, reforça Liça.
“A convivência a dois é mais gostosa. É muito crescimento viver com outra pessoa, saber dividir, saber ceder, saber conversar. Faz a gente não olhar só para o próprio umbigo”, reflete ela.
De tão boa a experiência, Liça escreveu um livro no ano passado, “Os Velhos Também Amam” (152 pag. ed. Cajuína), em que apresenta 18 contos sobre o assunto.
SENTIMENTO RENASCEU
A aposentada Terezinha Alves Andrade, 73 anos, reencontrou o seu primeiro amor há 20 anos.
E até hoje ela e Aguinaldo Loyo Bechelli, 83 anos, vivem um casamento que jamais poderiam ter previsto.
“Temos dez anos de diferença. Quando nos conhecemos, eu era adolescente, e ele, casado e com filhos. Jamais pensei em criar alguma confusão. Mas os anos se passaram e nos reencontramos”, diz ela.
Os dois foram vizinhos. Certo dia, uma amiga em comum chamou Terezinha para prestar homenagens à mulher de Aguinaldo, que tinha acabado de morrer.
“Depois disso, a filha dele, que é minha amiga, empenhou-se em fazer com que a gente começasse a namorar. Foram dois anos até ficarmos juntos de vez”, conta Terezinha.
Casais como Liça e Luiz e Terezinha e Aguinaldo tiveram a sorte de se darem bem e, ainda, de conseguirem unir as suas famílias.
Mas nem sempre isso ocorre, segundo a psicóloga Ellen Moraes Senra. “Quando a pessoa com mais de 70 anos se apaixona por alguém mais novo é ainda mais complicado. Há medo de que o parceiro mais jovem esteja se aproveitando do idoso, mas nem sempre é assim. É possível se apaixonar em qualquer idade e por qualquer idade.”
Ellen lembra que uma nova paixão é ainda melhor quando a pessoa precisa lidar com a solidão e com o fato de ter sido abandonada pela família.
A psicóloga Ray Prado, uma das responsáveis pelo Residencial Verbo Amar (destinado a idosos) já presenciou muitas paixões no lugar.
“Mesmo com as funções cognitivas já afetadas, eles não deixam de se relacionar”, diz ela.
Ray afirma que vê o olhar de renovação nos apaixonados, mas nem sempre a família entende isso.
“Uma senhora que frequentava a casa se aproximou bastante de um senhor que também nos visitava. De repente, os familiares dela decidiram transferi-la”, diz Ray. “É comum ver isso acontecer”, conclui.