
Creio que você já ouviu políticos se valendo de estratégias linguísticas para criar narrativas e reforçar promessas com o objetivo de induzir expectativas para influenciar o público.
Algumas frases utilizadas pelos políticos vamos destacar no decorrer deste texto.
A primeira: “Esse é o meu compromisso. Esse é o compromisso que vou honrar.” — A repetição da palavra “compromisso” reforça o sentido de responsabilidade e promessa.
Uma outra frase também muito usada por políticos: “O futuro que nós queremos. O futuro que construiremos juntos.” Nestas frases, a palavra “O futuro” dá a ideia de continuidade e cooperação. Mais uma vez, a função linguística se apresenta. Essa expressão linguística é chamada de anáfora.
Mas o que vem a ser anafórica?
A anáfora, largamente empregada pelos políticos, revela seus impactos no debate público, para manipular discursos e moldar as suas narrativas. É uma figura de linguagem que se caracteriza pela repetição de uma mesma palavra ou expressão no início de cada oração ou sentença.
Outra frase muito utilizada pelos políticos: “Por vocês eu luto. Por vocês eu vou até o fim.” Nesta frase, o pronome “vocês” é retomado para fortalecer a conexão com o público.
Mas não para por aí. Veja esta frase: “Essa é a mudança que o nosso município precisa. Essa é a mudança que eu trago.” Agora, a palavra “mudança” é repetida para enfatizar a ideia de renovação.
Tem mais: “Foi por isso que decidi me candidatar. Foi por isso que estou aqui.” Aqui, o uso da anáfora “foi por isso” dá ênfase às motivações do político.
Para fechar essa série de exemplos: “A segurança que você quer. A segurança que vamos garantir.” O termo “segurança” é repetido para enfatizar a promessa em relação à proteção pública.
Essas frases não apenas reforçam as ideias principais, mas também criam um efeito de retórica que ajuda a gravar a mensagem na mente dos eleitores.
Enfim, anáfora é a repetição de palavras ou frases consecutivas no início de versos. É um recurso estilístico usado para ritmo, ênfase e emoção; e pode variar em sua aplicação, ocorrendo no meio ou no final das frases. Sua função, largamente empregada pelos políticos, serve para manipular discursos, moldar as narrativas e reforçar promessas, que criam expectativas e moldam a percepção do público.
Alguns exemplos comuns de anáfora no discurso político para reforçar argumentos e criar coesão textual que foram usadas por políticos famosos:
Winston Churchill (Discurso na Segunda Guerra Mundial): “Continuaremos até o fim, lutaremos na França, lutaremos nos mares e oceanos, lutaremos com confiança crescente.” A repetição de lutaremos remete à determinação do povo britânico, usando o futuro próximo para criar expectativa e coesão.
Getúlio Vargas (Discurso do Estado Novo, 1937): “A Nação quer. A Nação exige. A Nação espera.” A anáfora de “A Nação” reforça a ideia de um sentimento comum e liderado de unidade e dever.
Jair Bolsonaro (Discurso de posse, 2019): “Nosso compromisso é com a verdade. Nosso compromisso é com o Brasil.” A repetição de “Nosso compromisso” faz referência a uma promessa de governar de acordo com princípios claros e compartilhados.
Enfim, o uso de anáfora em discursos políticos é eficaz porque amplifica a mensagem, envolve emocionalmente o público, simplifica conceitos e constrói uma narrativa coesa, o que facilita a persuasão e o engajamento do público. E se olharmos para os anaforismos icônicos e poderosos já utilizados por políticos, o mais mencionado é o “I Have a Dream” (Eu tenho um sonho) de Martin Luther King Jr., proferido nos discursos durante a Marcha sobre Washington em 1963.
“I Have a Dream” é caracterizada como anáfora pela sua reprodução em posições semelhantes em várias partes de um discurso, para criar ritmo e impacto emocional. Por isso, a frase “I Have a Dream” se encaixa perfeitamente nessa definição, pois Luther King usava essa frase repetidamente para enfatizar suas visões de um futuro ideal, criando um efeito poderoso. Conseguiu, com isso, criar um padrão que destacou cada uma das visões que compartilhava.
Essa proposta enfatizou a importância das ideias expressas e ajudou o público a memorizar a mensagem que serviu para refletir uma visão de um futuro de igualdade racial, justiça e liberdade. A frase “I Have a Dream” não apenas capturou a imaginação do público, mas também ofereceu uma mensagem de esperança e progresso em um momento de tensão racial e de políticas intensas nos Estados Unidos daquela época.
Portanto, havendo necessidade de enfatizar uma mensagem, criar emoção e estabelecer uma conexão com o público, a anáfora se torna uma ferramenta retórica eficaz em diversas formas de comunicação.