sábado, 23 novembro 2024

A CPMF, a CBS e as plataformas digitais

Nas últimas semanas, me deparei com três notícias que, aparentemente, não teriam muita conexão entre si. São elas: 1ª) ‘MercadoLivre se torna a empresa mais valiosa da América Latina’; 2ª) ‘Apresentação do Projeto de Lei da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) – a primeira parte da reforma tributária pretendida pelo Poder Executivo’ e 3ª) ‘Insistência do ministro Paulo Guedes com a volta da CPMF’, que seria rebatizada e ligeiramente modificada. 

Ocorre que essas três notícias têm um ponto importante em comum: a informalidade existente no mundo das plataformas digitais. Obviamente não se está aqui para dizer que o Mercado Livre só chegou onde chegou por conta da sonegação fiscal de seus usuários. Muito pelo contrário, embora eu não tenha tido acesso a dados da empresa a esse respeito, a minha percepção, como usuário, é que existem três grupos de vendedores no Mercado Livre (e o mesmo vale para outras plataformas digitais semelhantes): 

1º) Os vendedores não habituais. Pessoas como eu e você, que, quando queremos nos desfazer de algum bem, usamos a plataforma; 2º) Os vendedores habituais que emitem notas fiscais e cumprem integralmente suas obrigações fiscais e 3º) Os vendedores habituais que sonegam tributos. 

Não conheço dados confiáveis sobre o tamanho deste terceiro grupo, mas, seguramente, ele incomoda o Governo Federal, tanto que o ministro da Economia, Paulo Guedes, usa essa bandeira para defender a volta da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). 

Além disso, a proposta da CBS tem um tópico específico para tratar da responsabilidade tributária das plataformas digitais, inclusive em relação às aquisições de bens e serviços junto a vendedores estrangeiros. A mensagem é clara: a plataforma deve fiscalizar o vendedor e, se ele não emitir nota fiscal, ficará responsável pelo pagamento do tributo devido pelo vendedor. 

E, para piorar, a única saída a esse tipo de medida truculenta seria a volta da CPMF. Veja só em que encruzilhada o ministro nos coloca. Ele quer fazer parecer que temos apenas três opções, quais sejam: apoiar a responsabilidade tributária das plataformas digitais; apoiar a volta CPMF; ou apoiar a informalidade e a sonegação fiscal. 

Mas o ministro Paulo Guedes está enganado, ou está nos enganando mesmo, caso ele, em seu íntimo, saiba que há outras opções. 

O que o Fisco deveria fazer é simplesmente trabalhar, exercer seu papel fiscalizatório! É hora de abandonar a estapafúrdia ideia de terceirizar as atividades de fiscalização para as plataformas digitais. 

Como se vê, há um caminho intermediário. E ele me parece muito melhor que os apresentados pelo Governo. O que falta ao Governo Federal para apoiar esta via intermediária, portanto, é vontade: vontade de fazer as coisas direito; vontade de dialogar; vontade de respeitar as plataformas e, especialmente, vontade de fazer o seu trabalho, que é fiscalizar os maus contribuintes. 

 

Escrito por: Carlos E. Navarro | Mestre em direito tributário pela FGV 

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