Rafael Cervone, engenheiro e empresário, é o presidente do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (CIESP)
A máquina administrativa deve ser mais enxuta, menos burocrática, ter mais produtividade e custeio menor. Quanto aos impostos, precisamos de isonomia de arrecadação entre os setores e simplificação do recolhimento. Há dois exemplos cabais sobre as distorções do sistema: o País tem uma das maiores cargas tributárias do mundo, mas segue com desequilíbrio fiscal e presta serviços de baixa qualidade; e a indústria, embora represente hoje cerca de 11% do PIB nacional, recolhe um terço de todos os impostos.
Enquanto postergamos as reformas, desde a promulgação da Constituição de 1988, há 35 anos, vamos nos deparando com medidas imediatistas. O mais grave é que, cada vez que são anunciadas, exigem um processo de adaptação e ampliam a intrincada teia de regras e detalhes tributários, cuja gestão mensal já representa elevado custo de dinheiro, tempo e energia para as empresas.
Ressaltadas as questões estruturais, entendo terem sido positivos, dentre os atos da equipe econômica, os relativos à renegociação das dívidas com o fisco, no âmbito do novo Programa Litígio Zero. Destaco os descontos de 40% a 50% para pessoas físicas, micro e pequenas empresas e de até 100% sobre o valor de juros e multas para as grandes, incluindo ampliação dos prazos de parcelamento, bem como a utilização de prejuízos fiscais e base de cálculo negativa para quitar entre 52% e 70% dos débitos. Tais negociações podem dar um fôlego aos devedores.
Em contrapartida, foi negativa a Medida Provisória 1.160/2023, incluída no pacote. O ato restabeleceu o voto de qualidade a favor do fisco, nos casos de empate nas votações do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), órgão de julgamento em segunda instância dos processos administrativos na Receita Federal.
A decisão viola a segurança jurídica, conforme explicam advogados especializados: a incidência tributária pressupõe certeza quanto aos fatos e adequada interpretação da legislação, à semelhança da aplicação da lei penal, de modo que, havendo dúvida razoável evidenciada pelo empate na votação, não poderia ser efetivada a cobrança, considerando o princípio de que ante a incerteza, a decisão deve ser pró-contribuinte. Além disso, não consta a possibilidade de questionamento judicial da decisão do CARF, fragilizando as empresas.
É fundamental, sim, restabelecer o equilíbrio fiscal, mas não à custa da oneração dos setores produtivos e consumidores, como se observa nas medidas pontuais adotadas de modo intermitente, que sempre apresentam distorções. Por isso, defendo reformas estruturais sólidas para o desenvolvimento nacional, no contexto de um projeto de Estado e não de governo. E de longo prazo.