sexta-feira, 19 abril 2024

Perdão presidencial e os limites do ato de Bolsonaro

Por Marcelo Aith

O presidente da República, no uso da atribuição que lhe confere o artigo 84, inciso XII, da Constituição Federal, tendo em vista o disposto no art. 734 do Código de Processo Penal, concedeu, a “toque de caixa”, o benefício da graça ao deputado federal Daniel Silveira, condenado, por dez votos a um, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), à pena de oito anos e nove meses de reclusão, em regime inicialmente fechado, além de perda do mandato e dos direitos políticos e ao pagamento de multa, pela prática de crimes contra o estado democrático de direito e coação no curso do processo. Afinal, o que é graça (indulto individual)?

Conforme lecionam João Paulo Martinelli e Leonardo Schmitt de Bem, a graça “configura-se como uma espécie de perdão ofertada pelo Presidente da República, beneficiando um condenado por infração comum, extinguindo sua punibilidade (CP, art. 107, II, 2ª parte)”.

Trata-se de ato discricionário do Presidente da República, que pautado na conveniência e oportunidade, pode conferir a um condenado a extinção dos efeitos primários da pena, ou seja, libera o condenado de cumprir a pena privativa de liberdade ou restritiva de direitos e a eventual multa imposta. Todavia, remanescem os efeitos secundários, como a perda dos direitos políticos e, também, o mandato eletivo.

Ao utilizar-se do poder discricionário, o administrador, no caso o Presidente da República, deve fazer a escolha entre as alternativas permitidas no ordenamento, sob pena de agir com arbitrariedade. Hely Lopes Meirelles assevera que “discricionaridade é a liberdade de ação administrativa, dentro dos limites permitidos em lei”. Assim, nos casos em que o ato discricionário é prática com abuso de autoridade ou fora dos limites legais, ou ainda com finalidade diversa ao interesse público, ele será ilegítimo e nulo.

O presidente lançou como motivo ensejador para a concessão da benesse o suposto fato de que a “sociedade encontra-se em legítima comoção, em vista da condenação de parlamentar resguardado pela inviolabilidade de opinião deferida pela Constituição, que somente fez uso de sua liberdade de expressão”. Portanto, a conveniência e oportunidade para o perdão ao deputado seria a suposta comoção nacional. Essa motivação corresponde a realidade? Ou houve desvio de finalidade na espécie?

Pergunta, ao formular uma motivação inexistente para favorecer um aliado político, o Presidente da República está respeitando, por exemplo, o princípio da impessoalidade?

O ato administrativo praticado pelo Presidente da República, ao conferir o perdão ao deputado federal, foi um flagrante desvio de finalidade, com o firme propósito de beneficiar “um dos seus”, estando, assim, na contramão do espírito do estatuto da graça. Diante do vício, deveria ser afastado pelo Supremo Tribunal Federal. 

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