A vida se esvai aos poucos, sem que percebamos. Quando damos conta, vemos que temos mais passado do que futuro. Passamos a ter certeza de que fizemos muitas coisas, acertamos muito e também erramos muito. O gostoso é que temos histórias para relembrar e contar e, mais ainda, exemplos para ilustrar uma série de conhecimentos.
Falando em contar história, vou descrever uma acontecida comigo há muitos anos atrás, quando fui procurado para prestar uma consultoria.
O proprietário de uma empresa, que se chamava Roberto, era um empresário conhecido no ramo de negócio metalomecânico. Sua empresa, uma indústria com mais de 200 funcionários, foi criada vinte anos antes.
Roberto, então, buscou contratar o serviço de um consultor, pois o atual comportamento da sua indústria passou a ficar diferente do que ocorrera ao longo de duas décadas da sua existência, quando cresceu, conquistou clientes importantes e passou a disputar grandes contratos. De repente, os números começaram a ficar estagnados, os custos começaram a crescer, as entregas começaram a atrasar e as reclamações de clientes começaram a surgir com mais frequência.
Nesse contexto, foi quando entrei em cena, prestando um serviço de consultoria industrial. Lembro que no primeiro dia de trabalho, na sala de reuniões, Roberto, direto como sempre, foi ao ponto:
— “Não preciso de teoria, João. O que a minha empresa precisa é vender mais.”
Calmamente, respondi:
— Vender mais pode até aliviar a pressão, mas não resolve a origem do problema. Sua empresa está perdendo dinheiro não por falta de vendas, mas por falta de método.
Roberto estranhou a minha colocação e vociferou:
— “Como assim?!!!”
Respondi:
— A cada pedido atrasado, cada refugo no chão da fábrica, cada funcionário esperando uma ordem que não veio… ali está o prejuízo. E ele é invisível. Mas dá para tornar visível se você tiver um laboratório de métodos e processos.
Roberto levantou-se, irritado e falando alto, olhou para mim e disse:
— “Você quer dizer montar outro departamento? Mais custo fixo?”
Recebi calmamente o impacto colérico do Roberto e argumentei:
— Pense diferente! Levantei da cadeira e fui caminhando até uma lousa instalada na sala de reuniões. Escrevi a seguinte frase na lousa: “Imagine um espaço dentro da empresa onde os processos sejam observados, cronometrados, mapeados e redesenhados para serem mais rápidos, baratos e eficazes. Um local onde você possa testar uma nova linha de montagem antes de instalá-la, simular a rotina de um setor com menos pessoas, avaliar o impacto de uma mudança sem parar a fábrica.”
Fiz uma pausa, virei o meu olhar para o Roberto e completei:
— Esse espaço não é custo. É economia estruturada. É inteligência produtiva.
Roberto ficou em silêncio por um instante. Eu via na sua expressão a imagem do seu pensamento: uma calculadora em processamento, demolindo resistências.
Após alguns instantes de silêncio, Roberto se lembrou da última falha de entrega e do cliente perdido e me questionou:
— “Você acha que isso daria resultado em quanto tempo?”
Respondi:
— Se você me permitir montar esse laboratório piloto em dois setores, te dou um relatório em trinta dias. E, se em sessenta dias você não perceber ganhos mensuráveis, cancela tudo.
Roberto cruzou os braços, pensativo e, depois de alguns minutos e um cafezinho, respondeu:
— “Fechado. Mas eu quero ver resultado.”
Estendi a mão com um leve sorriso e disse a ele:
— Você vai enxergar o que está escondido bem na frente dos seus olhos.
Dois meses se passaram, e Roberto estava diante do primeiro relatório:
Redução de 22% no tempo de produção em uma linha;
Diminuição de 14% nos refugos;
25 eficazes sugestões de melhorias oriundas dos próprios funcionários com base nos estudos do laboratório, o que nunca tinha ocorrido anteriormente.
Na reunião seguinte, foi o próprio Roberto quem sugeriu:
— “João, acho que está na hora de expandirmos esse laboratório para toda a planta.”
Um ano depois, Roberto dizia em todo encontro com outros empresários: “Uma empresa precisa considerar a existência de um laboratório de métodos e processos em sua estrutura organizacional, porque ele representa uma ferramenta estratégica para a melhoria contínua da eficiência, da qualidade e da inovação operacional”.
Nessas reuniões, ele projetava um conjunto de transparências feitas em acetato (pois naquele tempo não existiam os slides do PowerPoint), que estampavam as seguintes mensagens:
Transparência 1. O laboratório de métodos e processo serve para estudar fluxos de trabalho, tempos, movimentos e recursos utilizados nos processos produtivos e administrativos. Possibilita identificar gargalos, desperdícios, retrabalhos e propor melhorias fundamentadas.
Transparência 2. O laboratório de métodos e processo serve para testar e validar métodos. Assegura que as práticas adotadas sejam padronizadas, seguras e eficazes, aumentando a consistência na produção e na entrega de serviços.
Transparência 3. O laboratório de métodos e processo serve para estabelecer um ambiente controlado para experimentação, tornando possível aplicar novas tecnologias, testar automações e implantar melhorias sem afetar diretamente a operação real da empresa.
Transparência 4. O laboratório de métodos e processo serve para ampliar o foco na melhoria dos processos. A empresa passa a gastar menos recursos (tempo, material, energia) e melhorar a produtividade.
Transparência 5. O laboratório de métodos e processo serve para tomar decisões baseadas em dados experimentais e não apenas em suposições. Torna os investimentos mais assertivos.
Transparência 6. O laboratório de métodos e processo serve para formar colaboradores. Possibilita preparar a força de trabalho para atuar com raciocínio crítico, visão sistêmica e foco em resultados.
Transparência 7. O laboratório de métodos e processo serve para gerar dados e relatórios, que passam a embasar a tomada de decisão com mais segurança sobre implantação de novas práticas, aquisição de equipamentos, alterações na estrutura ou expansão da produção.
Transparência 8. O laboratório de métodos e processo serve para manter a empresa mais competitiva, sustentável e adaptável frente às exigências do mercado e às transformações tecnológicas.
E assim termina esta história, com a boa sensação de que cada conquista construída com esforço e propósito não é apenas um instante do passado, mas um facho de luz que ilumina os caminhos que ainda estão por vir. Pois, tudo o que está oculto pode ser revelado — basta o tempo certo e o olhar atento.
