No dia 24 de outubro, a veterinária Daniela Pimentel Chaves, 43, estava na sala de casa, preparando a mochila para a filha ir à escola, como todos os dias. O marido fazia o almoço na cozinha e a menina, de 8 anos, se arrumava no quarto. Ela parou quando encontrou, entre os livros, um pedaço de papel com o recado: “negro na senzala/gay no armário/retardado na apae/ B17”.
A assinatura faz referência à candidatura do presidente eleito no dia 28 de outubro, Jair Bolsonaro (PSL). Nas redes sociais, Daniela havia se manifestado a favor de Fernando Haddad (PT).
“Eu tenho uma posição política bem definida, quem me conhece sabe. Então, acho que usaram ela para me atingir. No primeiro momento, amassei e botei no lixo, mas fiquei com aquilo entalado na garganta. Mostrei para o meu marido e fomos à polícia”, conta à Folha de S.Paulo.
O caso aconteceu em Passo Fundo, no interior do Rio Grande do Sul. O casal registrou um boletim de ocorrência e procurou a escola onde Maria Eduarda, que tem síndrome de Down, estuda há três anos. Eles acreditam que o bilhete tenha sido colocado na mochila ainda no local.
“Nos pegou de surpresa, porque nunca havia notado preconceito contra ela. Ela se dá muito bem com os colegas, não é a única criança de inclusão na escola. Cheguei a pensar se não foi alguém de fora”, diz a mãe.
Nos comentários de sites que repercutiram a história, Daniela foi acusada de ter forjado o recado para forçar um ponto de vista político.
O Instituto Educacional Metodista, que tem 98 anos de atuação, abriu uma sindicância interna para apurar os fatos. Segundo o diretor da escola, Rubem Nei da Silva, funcionários e professores foram ouvidos e as imagens do circuito interno de segurança encaminhadas à polícia.
“É muito ruim, é desumano até. O conteúdo é racista, homofóbico e agressivo. A escola está condenando veementemente”, avalia Silva.
A Polícia Civil instaurou um inquérito para investigar o ocorrido e começou a ouvir funcionários da escola. O caso está com a Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente de Passo Fundo.
Segundo o delegado Mário Pezzi, responsável pelas investigações, ainda serão feitos testes grafológicos para encontrar caligrafias que se pareçam à do bilhete. Caso seja identificado, o responsável pode responder por injúria racial qualificada, crime inafiançável, com pena prevista de um a três anos de reclusão.
A Apae da cidade, lugar onde a menina estudou até os 3 anos, lançou uma nota de repúdio ao conteúdo do bilhete, lembrando que “não é demérito” frequentar a instituição.