sábado, 23 novembro 2024

Após reunião com Lula, advogado pede soltura de petista à Justiça Federal

Após reunião com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na sede da Superintendência da Polícia Federal no Paraná, em Curitiba, o advogado Cristiano Zanin anunciou no final da manhã desta sexta-feira (8) que já deu entrada na Justiça Federal com um pedido de soltura imediata do líder petista.

A iniciativa da defesa do ex-presidente ocorre após a decisão do Supremo Tribunal Federal desta quinta-feira (7). O plenário decidiu, com placar apertado de 6 votos a 5, que um condenado só pode ser preso após o trânsito em julgado (o fim dos recursos), alterando a jurisprudência, que desde 2016, tem permitido a prisão logo após a condenação em segunda instância.

O voto decisivo foi do presidente do Supremo, Dias Toffoli, que acompanhou os ministros Marco Aurélio, relator das ações sobre o tema, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Celso de Mello, formando a maioria. A decisão do Supremo, uma das mais esperadas dos últimos anos, tem potencial de beneficiar cerca de 5.000 presos, segundo o CNJ (Conselho Nacional de Justiça), incluindo o mais célebre deles, o ex-presidente Lula, preso desde abril de 2018 pelo caso do tríplex de Guarujá (SP). O Brasil tem, no total, aproximadamente 800 mil presos.

Lula já fez alguns pedidos aos correligionários. Assim que sair da prisão, ele quer um ato no acampamento montado pela militância na frente da PF e depois vai visitar os ex-tesoureiros do PT João Vaccari Neto e Delúbio Soares, que dão expediente na sede da CUT do Paraná. Só depois pretende ir para São Bernardo do Campo (SP), onde deve ser recebido com festa.

Lula depende de um aval simples da juíza federal Carolina Lebbos para deixar a prisão e aguardar em liberdade o julgamento de recursos no caso do tríplex de Guarujá (SP). A libertação do petista não é automática. Os advogados tiveram de peticionar no próprio procedimento de administração da pena, na 12ª Vara Federal em Curitiba, para que ele deixe a prisão depois de 19 meses.

Advogado de Lula, Zanin disse que Lula está “calmo” e “sereno” diante da possibilidade de soltura. O advogado quer se reunir ainda nesta sexta-feira com a juíza Lebbos em uma tentativa de agilizar a libertação do ex-presidente. Como há uma ordem do STF sobre o assunto, não há alternativas para que um magistrado de grau inferior descumpra a medida. Uma hipótese seria a juíza considerar que a decisão do Supremo ainda não tem acórdão e não está oficialmente publicada, e que, portanto, seria preciso aguardar essa última etapa para entrar em vigor.

Essa possibilidade, porém, é considerada improvável, até por ser facilmente revertida por meio de um habeas corpus na segunda instância ou mesmo por meio de uma reclamação no Supremo. “Pode acontecer, sem dúvida. Seria obviamente um excesso de formalismo porque esse julgamento é público e notório”, diz o advogado criminalista e professor de direito Leonardo Pantaleão.

Não necessariamente a saída da prisão depende da iniciativa das defesas. O juiz pode despachar sem ser provocado ou ainda atendendo a um pedido do Ministério Público. Não cabe a um magistrado da área de execução, como a juíza Carolina Lebbos, impor em caso dessa natureza o uso de tornozeleira eletrônica ou o recolhimento domiciliar.

Se o condenado for submetido a uma medida restritiva desse tipo ou até a uma prisão preventiva (sem prazo determinado), a decisão deverá partir do juízo onde iniciou a causa -no caso da Lava Jato, a 13ª Vara Federal, comandada pelos juízes Luiz Bonat e Gabriela Hardt. A pena no processo do tríplex foi reduzida no STJ (Superior Tribunal de Justiça) para 8 anos e 10 meses e 20 dias de prisão. O caso ainda tem recursos finais pendentes nessa instância antes de ser remetido para o STF.

O Supremo, porém, pode anular todo o processo sob argumento de que o juiz responsável pela condenação, Sergio Moro, não tinha a imparcialidade necessária para julgar o petista naquela situação. Mas ainda não há data marcada para que esse pedido seja analisado. Além do caso tríplex, Lula foi condenado em primeira instância a 12 anos e 11 meses de prisão por corrupção e lavagem no caso do sítio de Atibaia (SP). Essa condenação também pode ser anulada porque a defesa apresentou suas considerações finais no processo no mesmo prazo de réus delatores.

O ex-presidente ainda é réu em outros processos na Justiça Federal em São Paulo, Curitiba e Brasília. Com exceção de um dos casos, relativo à Odebrecht no Paraná, as demais ações não têm perspectiva de serem sentenciadas em breve. Ao longo desse período de Lula no cárcere, desde abril do ano passado, a defesa manteve uma série de embates com Lebbos por questões do dia a dia do cumprimento da pena.

A juíza, por exemplo, contrariou os advogados ao não autorizar que Lula concedesse entrevistas, não permitiu que ele saísse temporariamente da prisão para o velório de um irmão, no início do ano, e barrou visita semanal de religiosos ao cárcere. Com a decisão do Supremo, o tempo que presos de maneira provisória, como Lula, já permaneceram na cadeia será descontado do período total da pena caso eles tenham que voltar ao regime fechado após o esgotamento de todos os recursos em última instância.

Lula atingiu em setembro a marca de um sexto de cumprimento da pena imposta pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça) no caso do tríplex. Mesmo com manifestação do Ministério Público Federal favorável à progressão para o regime semiaberto, o ex-presidente decidiu ficar na Superintendência da PF no Paraná. Disse que só sai da cadeia “com 100% da inocência”.

No julgamento do Supremo, o que estava em debate era a constitucionalidade do artigo 283 do Código de Processo Penal, que diz que, em razão de condenação, ninguém pode ser preso exceto se houver “sentença condenatória transitada em julgado” -ou seja, quando não couber mais recurso. Para a maioria dos ministros, esse artigo do Código de Processo Penal condiz com o que está escrito no artigo 5º da Constituição: “Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória”.

Para Toffoli, “a leitura da norma [do artigo 283] cabe no texto da Constituição. Esta foi a vontade dos representantes do povo, eleitos pelo povo”. O artigo 283 ganhou a redação atual em 2011, quando o Congresso aprovou um projeto de lei que visava adaptar o Código de Processo Penal, de 1941, à Constituição de 1988.

A redação do artigo se originou em um projeto enviado à Câmara em 2001 pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Ao longo dos dez anos em que tramitou no Congresso, o texto em questão teve apoio de vários grupos e partidos políticos, do PSDB ao PT.

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