Depois do distanciamento social contra a pandemia, que manteve as portas dos estabelecimentos fechadas por longos períodos, que variaram de acordo com a região, o varejo aposta suas fichas no combo Dia da Criança, Black Friday e Natal para recuperar ao menos parte das vendas perdidas. Não existe, porém, consenso sobre qual pode ser o resultado. Alguns estão muito animados. Há quem acredite que a poupança guardada por parte das famílias que não perderam renda em meio à pandemia pode dar um fôlego adicional às vendas de fim de ano.
Essa ala mais esperançosa avalia que muitas famílias vão optar por não viajar no período e estarão ansiosas para se reunir após meses de distanciamento, o que pode ajudar nas vendas de decorações, alimentos e presentes.
“O movimento do varejo neste momento é para fortalecer o calendário promocional de Dia da Criança, Black Friday e Natal, para minimizar os prejuízos registrados em seis meses de pandemia”, diz Nabil Sahyoun, presidente da Alshop (Associação Brasileira de Lojistas de Shopping).
“As empresas vão tentar inovar, para trazer o cliente para a loja física novamente.”
Principal data comemorativa do varejo, o Natal em períodos normais costuma atrair às lojas movimento entre duas e duas vezes e meia a média de um mês normal, diz Sahyoun.
Neste ano, não se sabe ainda exatamente como o consumidor vai se comportar, mas no setor é dado como certo que as vendas do comércio eletrônico devem continuar expressivas.
O representante dos lojistas de shopping está no que se pode chamar de ponta mais otimista do setor.
“Há 12 milhões de servidores públicos que não tiveram comprometimento de renda e estão com o caixa cheio. Quem viajava não viajou, e tem muita disponibilidade de dinheiro para sair às compras”, afirma.
Existe ainda a expectativa de que ações solidárias feitas por instituições e empresas deverão ser fortalecidas no período de fim de ano, o que deve também ajudar a movimentar a economia.
Nesta segunda-feira (28), a Alshop tem reunião com a secretária de Desenvolvimento Econômico de São Paulo, Patrícia Ellen, para tentar negociar a expansão do horário de funcionamento dos shopping centers, das atuais 8 horas para 10 ou 12 horas por dia.
O comerciante Augusto Tosin, proprietário da Santa Land, rede de lojas especializadas em decoração natalina de Curitiba (PR), abriu suas portas em agosto, como faz todos os anos, e se diz animado.
Embora o período mais aquecido de vendas para o segmento seja entre outubro e novembro, afirma que setembro já foi bastante positivo.
“Tem condomínios e lojas grandes fazendo consultas e orçamentos para projetos. Estamos em setembro com um movimento até maior do que no ano passado”, diz Tosin. Ele alimenta a expectativa de que famílias em casa, sem viajar, vão investir para caprichar na decoração natalina.
Os consumidores, porém, devem se preparar para gastar um pouco mais.
“Os produtos são todos importados, e o dólar estava a R$ 4 no ano passado e veio a quase R$ 6 neste ano, então há um reajuste médio de 20%. Mas há coisas que nem aumentei, reduzindo margens, para não espantar o cliente.”
Quem vê as lojas de decoração natalina em atividade e se depara com panetones nos supermercados se pergunta se o comércio estaria até antecipando o Natal, numa tentativa de espantar o clima ruim da pandemia e para aproveitar o consumidor ainda com a renda do auxílio.
Mas os varejistas negam a percepção. Dizem que o calendário pré-festejos segue seu ritmo normal.
“Nos últimos anos, as primeiras fornadas de panetones passaram a ser entregues no mês de setembro, e esse cronograma foi mantido para 2020. A chegada dos enfeites natalinos também estava programada para setembro, de forma que não houve antecipação“, informa, por exemplo, o Grupo Big, dono dos supermercados Big, Big Bompreço, Maxxi Atacado e Sam’s Club.
Há, porém, um grupo mais desconfiado. Nessa parcela, a percepção é que a redução pela metade e o iminente término do auxílio emergencial, a antecipação do 13º dos aposentados e o esperado crescimento das taxas de desemprego neste fim de ano devem resultar em queda na renda e em vendas piores do que as registradas em 2019.
A FecomercioSP (Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo) está entre os que fazem projeções mais cautelosas.
Segundo Fabio Pina, economista da entidade, a renda da população deverá ser afetada no fim do ano. Vão pesar, ele exemplifica, a redução do auxílio emergencial de R$ 600 para R$ 300, o fato de o 13º salário dos aposentados ter sido antecipado, bem como a redução no 13º de empregados que tiveram contratos suspensos -alguns perderão até um terço do valor.
“Para além disso, temos um desemprego que não explodiu, mas que está crescendo, e não deve haver mudança dessa trajetória até o fim de ano, com o fim das medidas do governo que visavam segurar empregos”, diz. “Vamos chegar ao fim de ano com uma folha de pagamentos menor e, portanto, 13º menor, além das antecipações que já foram feitas. O poder de compra neste ano será reduzido.”