sexta-feira, 19 abril 2024

Morre Kofi Annan, líder da ONU sob guerras, massacres e renovação

Kofi Annan, o primeiro africano negro a ocupar o posto de secretário-geral da Organização das Nações Unidas e mediador da paz em alguns dos conflitos mais importantes da virada deste século, morreu na madrugada deste sábado (18). Ele tinha 80 anos.
A morte de Annan foi confirmada em pela fundação que leva o nome dele. Segundo o anúncio, o vencedor do prêmio Nobel da Paz de 2001 morreu em um hospital em Berna, na Suíça, depois de uma curta doença não especificada.
“Onde quer que houvesse sofrimento ou necessidade, ele estendeu a mão e tocou muitas pessoas com sua profunda compaixão e empatia”, declarou a fundação.
Kofi Atta Annan nasceu em Gana em 8 de abril de 1938, em uma família de elite em Kumasi, Gana, filho de um governador da província e neto de dois chefes tribais. Fluente em inglês, francês e várias línguas africanas, ele passou praticamente toda a carreira nas Nações Unidas, onde ingressou em 1962 como funcionário do departamento de orçamento da Organização Mundial da Saúde (OMS).
A trajetória na ONU inclui passagens por postos na África e na Europa em quase todas as áreas da organização, da administração do orçamento à manutenção da paz. Como secretário-geral, cumpriu dois mandatos, o número máximo permitido, de 1º de janeiro de 1997 a 31 de dezembro de 2006.
Ele era casado com a sueca Nane Annan, sobrinha de Raoul Wallenberg, o diplomata que salvou dezenas de milhares de judeus dos nazistas na Segunda Guerra (1939-45). Deixa os filhos Ama e Kojo, do casamento com a nigeriana Titi Alakija, e Nina.
Kojo, empregado de uma empresa suíça que operava no programa Petróleo por Comida no Iraque sob sanções, seria o pivô de uma investigação sobre tráfico de influência e corrupção em 2005 envolvendo o pai ainda em seu mandato na ONU. O filho também foi alvo de um escândalo de corrupção envolvendo o governo do Paquistão.
Embora Kofi Annan tenha sido inocentado pela sindicância interna, o episódio mancharia seu legado e alimentaria pedidos por sua renúncia.
Mas Annan, que tentou reformar a ONU e tornou o organismo fundado em 1945 mais proeminente, também recebeu reconhecimento. Em 2001, ele e a instituição que comandava receberam conjuntamente o Nobel da Paz.
O mandato de Annan cobriu um período turbulento nas relações internacionais, que incluiu fracassos, escândalos e guerras cuja saída ele buscou mediar, nem sempre com sucesso.
“Acho que meu momento mais sombrio foi a guerra do Iraque [2003] e o fato de não podermos impedi-la”, disse ele em uma entrevista em fevereiro de 2013 à revista Time, na época da publicação de seu livro “Intervenções: uma vida em guerra e paz”, lembrando que a decisão dos EUA e de seus aliados de invadir o país de Saddam Hussein atropelou a instituição.
“Eu trabalhei duro. Estava conversando com líderes de todo o mundo. Os EUA não tiveram apoio no Conselho de Segurança”, disse. “Então eles decidiram ir sem o conselho. Mas acho que o conselho estava certo em não sancionar a guerra. Você poderia imaginar se a ONU endossou a guerra no Iraque, como seria nossa reputação?”
O temperamento de diplomata nunca inibiu Annan de ser franco, uma qualidade rara em seu posto. Grande parte de seu segundo mandato foi gasto em desacordo com os EUA, o maior contribuinte da ONU, tentando convencer o país a quitar quase US$ 2 bilhões (cerca de R$ 7,8 bilhões) em pagamentos atrasados.
Em seu livro de memórias, Annan, tratado como um “rockstar da diplomacia” pelo diplomata americano Richard Holbrooke, trata do ônus do principal cargo do sistema multilateral global, já um tanto combalido.
Pouco antes de se tornar secretário-geral, Annan serviu como chefe das forças de manutenção da paz da ONU, em uma delas como enviado especial para a ex-Iugoslávia, onde supervisionou a transição na Bósnia das forças de proteção da ONU para as tropas lideradas pela Otan.
Mas foi sob sua liderança que as operação de paz enfrentaram dois de seus maiores fracassos: o genocídio de Ruanda em 1994, e o massacre na cidade bósnia de Srebrenica em julho de 1995.
Em ambos os casos, a ONU enviara tropas sob o comando de Annan, mas elas não impediram os massacres, No caso de Ruanda, admitiu-se depois que houve demora em agir.
Foi sob Annan, porém, que a ONU lançou a iniciativa das Metas do Milênio, conjunto de medidas de desenvolvimento ousado visando reduzir a desigualdade global, uma das iniciativas mais importantes do organismo em seus 73 anos.
O ganense continuou envolvido em atividades de mediação da paz e do desenvolvimento após deixar o cargo, por meio de sua fundação, criada em 2007 e instalada em Genebra.
Em 2017, os maiores projetos de sua fundação incluíram a promoção de eleições justas e pacíficas; trabalhar com o governo de Mianmar para melhorar a vida no estado problemático de Rakhine; e lutando contra o extremismo violento, recrutando jovens para ajudar. Sua morte, neste sábado, foi lamentada por líderes globais.

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