Serguei é 18 anos mais velho que o rock. Em 1951, quando Ike Turner gravou “Rocket 88”, considerado por muitos o primeiro rock’n’roll da história, o carioca Sergio Augusto Bustamante já era maior de idade. O músico de 85 anos morreu nesta sexta (7) no hospital Zilda Arns em Volta Redonda. Ele havia sido internado ainda em Saquarema, onde vivia, no dia 6 de maio, com quadro de anemia, infecção e pneumonia, e estava desde o final do mês na CTI de Volta Redonda.
Nascido em 8 de novembro de 1933, filho único de um rico executivo da IBM e uma dona de casa, ganhou o apelido Serguei de um amigo russo. Ainda adolescente, vivia na ponte aérea Rio de Janeiro – Nova York. No Brasil, encantou-se por cantoras do rádio como Emilinha, Elizeth Cardoso e Ângela Maria. Nos States, presenciou o nascimento do rock de Little Richard, Elvis Presley e Chuck Berry.
Antes de se aventurar nos palcos, Sergio foi comissário de bordo da Panair e Varig. O emprego lhe rendeu muitas viagens ao exterior e fluência em inglês e francês. Chegou a corrigir, para a musa Elizeth Cardoso, versões em francês de músicas brasileiras que Elizeth cantou na França.
Mas a vida de aeromoço era careta demais para Serginho. Acabou despedido da Panair depois de uma festa de arromba, em que derrubou uma garrafa de champanhe na cabeça da atriz italiana Gina Lollobrigida. “Aquele emprego não era para mim”, diria muitos anos depois. “Eu não nasci pra ser empregado de ninguém.”
Em meados dos anos 1960, começou a cantar em boates no Rio de Janeiro. Os olhos azuis e cabelos louros encantavam as mulheres da zona sul do Rio. Entrava no palco “com maiô de aqualouco e uma bomba de flit na mão, para espantar os grilos da cabeça do público”. Dividiu palcos com Rogéria, Alcione, Miéle e Agildo Ribeiro. Foi um dos primeiros -talvez o primeiro- hippie brasileiro.
E era um hippie autêntico: no fim dos anos 1960, estava nos Estados Unidos quando conheceu, por intermédio do percussionista brasileiro Laurindo Almeida, a cantora norte-americana Janis Joplin. Janis o levou para São Francisco, epicentro do mundo bicho-grilo. Serguei esteve no mitológico festival de Woodstock, em 1969, e conheceu Jimi Hendrix e Jim Morrison (The Doors).
Os três amigos de Serguei -Janis, Hendrix e Morrison- morreram num intervalo de dez meses, entre 1970 e 1971, todos de complicações decorrentes de abuso de drogas e álcool. Mas Serguei jura que nunca precisou de estimulantes: “Minha droga é o sexo”. E na hora do sexo, não tinha preconceitos: transava homens, mulheres, extraterrestres e até árvores, como relatou diversas vezes em entrevistas hilariantes.
Em meados dos anos 1970, Serguei mudou para Saquarema, cidade praiana no litoral do Rio, onde se tornou uma espécie de embaixador local. Sua casa, apelidada Templo do Rock, virou atração turística: fãs eram recebidos pelo próprio astro, que mostrava seus discos, álbuns de fotos, e contava altas histórias sobre sua vida de maluco-beleza.
Se as histórias eram verdadeiras, só o próprio Serguei sabia. O fato é que a criatividade do astro para contá-las deixava qualquer um perplexo. “Cada história tinha cinco ou seis versões diferentes”, lembra Paulo Roberto Andel, coautor, com Rodrigo Barros, de “As Alucinações de Serguei – A Biografia do Maior Roqueiro Brasileiro de Todos os Tempos”. “Uma vez ele nos contou uma história sensacional sobre a avó. Perguntamos se era a avó por parte de pai ou de mãe, e ele disse: ‘Ah, esse detalhe eu não lembro!'”
Uma famosa história sobre um “ménage à trois” envolvendo Serguei, Janis e um amigo nas areias de Copacabana mereceu, em entrevistas, pelo menos cinco versões diferentes. Uma hora o tal “amigo” era holandês, depois americano e, por fim, terminou japonês. “Ele era um Adonis, tinha um corpo escultural”, dizia Serguei. “Não aguentei e dei uma mordida naquela bunda!”
Torcedor fanático do Fluminense, Serguei foi apaixonado pelo goleiro Castilho, ídolo do time nos anos 1950. Mais recentemente, encantou-se pelo atacante Fred, hoje no Cruzeiro. “Além de artilheiro, tem as pernas mais bonitas do futebol brasileiro”. Foi Serguei que espalhou o boato de que Janis Joplin torcia para o Fluminense.
O cantor participou de duas edições do Rock in Rio: fez um show solo em 1991 e uma participação especial no show de Sylvinho Blau Blau, em 2001, quando entrou vestido de urso cor de rosa durante a música “Meu Ursinho Blau Blau”. “O Axl Rose, do Guns’N’Roses, estava lá e disse que foi a coisa mais louca que ele já viu num palco”, contou Serguei. O que Axl Rose estava fazendo no show de Sylvinho Blau Blau, dez horas antes do show do Guns, até hoje ninguém sabe.