A apuração tem origem nas afirmações do deputado federal Luis Miranda (DEM-DF), que diz ter avisado o presidente sobre irregularidades nas tratativas e pressões que seu irmão, servidor do Ministério da Saúde, teria sofrido
A Polícia Federal instaurou inquérito para investigar suspeita de prevaricação do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) na negociação do governo para a compra da vacina indiana Covaxin.
A apuração tem origem nas afirmações do deputado federal Luis Miranda (DEM-DF), que diz ter avisado o presidente sobre irregularidades nas tratativas e pressões que seu irmão, servidor do Ministério da Saúde, teria sofrido.
A prevaricação é um tipo criminal em que o agente público deixa de agir ou retarda a ação para satisfazer interesses pessoais. No caso do presidente, a apuração vai buscar saber se ele foi de fato informado e se tomou medidas.
A investigação foi solicitada pela PGR (Procuradoria-Geral da República) após a ministra do STF Rosa Weber cobrar manifestação do órgão sobre a notícia-crime apresentada ao Supremo por três senadores.
Na PF, o caso será conduzido pelo Sinq (Serviço de Inquérito) da Diretoria de Investigação e Combate ao Crime Organizado, setor que cuida de apurações que envolvem pessoas com foro.
No final da semana passada, em viagem ao Rio Grande do Sul, Bolsonaro foi questionado sobre a reunião que teve com o deputado Luís Miranda.
“Eu não respondo sobre reunião. Eu tenho reunião com 100 pessoas por mês, os assuntos mais variados possíveis. Eu não posso simplesmente…chegar qualquer coisa para mim e ter que tomar providência imediatamente, tá certo? Tomei providência nesse caso”, afirmou.
No início deste mês, a Rosa Weber determinou a abertura de inquérito contra Bolsonaro para apurar se ele cometeu o crime de prevaricação ao ignorar denúncias de irregularidades acerca das negociações para compra da Covaxin.
A magistrada também autorizou que a Polícia Federal colha depoimento do chefe do Executivo. A magistrada atendeu pedido da PGR para investigar o caso. A solicitação da Procuradoria, porém, só foi feita após pressão de Rosa Weber.
Isso porque, inicialmente a PGR havia pedido para aguardar o fim da CPI da Covid para se manifestar sobre a necessidade ou não de investigar a atuação do chefe do Executivo neste caso. A ministra, que é relatora do caso, porém, rejeitou a solicitação e mandou a PGR se manifestar novamente sobre o caso.
Em uma decisão com duras críticas à PGR, a magistrada afirmou que a Constituição não prevê que o Ministério Público deve esperar os trabalhos de comissão parlamentar de inquérito para apurar eventuais delitos.
A apuração de irregularidades na venda de vacinas ao governo federal tem dominado o noticiário nas últimas semanas e chegou ao presidente, que viu ser aberto esse inquérito pelo Supremo.
Pesquisa Datafolha realizada na semana passada mostra que Bolsonaro, eleito sobre uma plataforma de tolerância zero com malfeitos administrativos, não convence os brasileiros neste quesito: para 70% dos adultos entrevistados pelo Datafolha, há corrupção em seu governo.
A percepção é amplificada pelas suspeitas de irregularidades em contratos do Ministério da Saúde, colocadas à luz pela CPI da Covid. Acham que há corrupção na pasta 63%, e que o presidente sabia dela, 64%.
A suspeita sobre a compra de vacinas veio à tona em torno da compra da Covaxin, quando o jornal Folha de S.Paulo revelou em 18 de junho o teor do depoimento sigiloso do servidor da Saúde Luis Ricardo Miranda ao Ministério Público Federal, que relatou pressão “atípica” para liberar a importação da vacina indiana.
Desde então, o caso virou prioridade da CPI. A comissão suspeita do contrato para a aquisição do imunizante por ter sido fechado em tempo recorde, em um momento em que a vacina ainda não tinha tido todos os dados divulgados, e por prever o maior valor por dose, em torno de R$ 80 (ou US$ 15 a dose).
Meses antes, o ministério já tinha negado propostas de vacinas mais baratas do que a Covaxin e já aprovadas em outros países, como a Pfizer (que custava US$ 10).
A crise chegou ao Palácio do Planalto após o deputado Luis Miranda relatar que o presidente havia sido alertado por eles em março sobre as irregularidades.
Bolsonaro teria respondido, segundo o parlamentar, que iria acionar a Polícia Federal para que abrisse uma investigação. A CPI, no entanto, averiguou e constatou que não houve solicitações nesse sentido para a PF. O Ministério da Saúde suspendeu o contrato.
Ainda segundo o relato do deputado, Bolsonaro teria dito a ele e ao irmão que o problema no ministério era um “rolo” do seu líder na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR).
O acusado nega, mas o presidente nunca negou o episódio -questionado por carta pela CPI da Covid sobre isso, usou termos chulos para dizer que não responderia.
A partir do caso Covaxin, a Folha de S.Paulo chegou a outro caso de suspeitas de irregularidades envolvendo a empresa Davati Medical Supply. A reportagem localizou Luiz Paulo Dominghetti Pereira, que se apresentou como vendedor da empresa.
Em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo ele disse que o então diretor de Logística do Ministério da Saúde, Roberto Ferreira Dias, cobrou propina de US$ 1 por dose de vacina para fechar contrato. As acusações foram repetidas em depoimento à CPI da Covid. Dias foi exonerado em seguida.