Os incidentes envolvendo cães da raça pitbull têm crescido de forma preocupante nos últimos anos em todo o Brasil e muitos desses casos ocorreram na área de cobertura da TV TODODIA.
Criança morreu após ataque em Hortolândia
No dia 21 de julho, uma tragédia chocou a região. Uma criança de dois anos morreu após ser atacada por um pitbull dentro da própria casa. O animal havia sido adotado pela família dois meses antes do ocorrido. A vítima ainda foi socorrida em estado grave pela Polícia Militar e levada à UPA do município, mas não resistiu aos ferimentos.
Outro caso em Campinas
Também foi registrado um caso grave em 26 de maio, quando um homem foi morto pelo próprio cão, também da raça pitbull, dentro de sua residência, em Campinas. Além dessas mortes, há diversos registros de vítimas gravemente feridas em ataques semelhantes.

É um problema da raça?
Para entender melhor os motivos por trás desses episódios, a reportagem ouviu dois profissionais da área, um médico-veterinário e um adestrador especializado em comportamento animal.
Problema está na força, diz veterinário
O veterinário Aníbal Fazani, que trabalha com cães há mais de 15 anos, afirma que o pitbull não é, por natureza, mais agressivo que outras raças. “Ele não é mais violento do que um ppinscher Se for pensar nisso, um pinscher, um poodle, eles mordem muito mais. A diferença está na força. A capacidade de mordida do pitbull é muito superior”, explica.
Fazani destaca que a raça foi originalmente selecionada para rinhas, o que lhe conferiu uma estrutura física robusta e musculosa. “Ele foi desenvolvido em termos de estrutura. Não é um cão que nasce mordendo mais que os outros, mas tem mais força. O estrago que ele causa, em caso de ataque, é maior, por isso exige mais cuidado.”
O aumento desses casos levanta uma pergunta inevitável: o pitbull é, de fato, um animal naturalmente violento e incompatível com a convivência humana? Ou o problema está na negligência e falta de preparo dos tutores?
Adestrador vê falhas de tutores
Para o adestrador e especialista em comportamento canino Gilberto Leandro a maioria dos ataques de cães ocorre por falha humana e não por instinto do animal. O adestrador afirma que a forma como os tutores educam seus cães é determinante para o comportamento deles. “Sem sombra de dúvidas, os ataques ocorrem por falha humana. O cachorro é condicionado a determinadas coisas e repete esse comportamento quando não é atendido. As pessoas acabam, muitas vezes, estimulando o cachorro a atacar. Reforçam comportamentos errados.”
Segundo Aníbal, a prevenção começa com a consciência de que todo cachorro, independentemente da raça ou do porte, precisa de orientação profissional. “Adestramento é essencial. Não é só para cães de grande porte, é para todos”, defende.

Castração pode ajudar
Entre as medidas preventivas, o veterinário também destaca a castração como um dos recursos possíveis, embora não resolva tudo sozinha. “A castração ajuda bastante, deixa o animal mais calmo. Mas o comportamento depende de adestramento, passeios e orientação.”
Os acidentes não acontecem apenas nas ruas. Muitos casos ocorrem dentro da própria casa. Por isso, algumas orientações básicas podem evitar tragédias:
- Em locais públicos, nunca se deve tocar em um cão sem a permissão do tutor. “É preciso saber se aquele cachorro pode ser tocado. Já o tutor, por sua vez, deve manter o animal sempre na guia e sob controle. Não deixar o cachorro se aproximar rapidamente de outro cão ou de uma criança.”
- Dentro de casa, o principal cuidado é nunca deixar uma criança sozinha com o cachorro, mesmo que ele já tenha sido adestrado. “Crianças podem provocar situações que estimulam o ataque, sem querer. Se o cão não tem controle, o risco aumenta muito.”
Rotina e gasto de energia são fundamentais
Outro ponto crucial, segundo o adestrador, é o gasto de energia. “Os cães precisam gastar energia física e mental. Cachorro entediado ou ansioso é mais propenso a apresentar comportamentos indesejados.”
Aníbal também destaca que é perfeitamente possível criar cães como pitbulls ou rottweilers em espaços pequenos, como casas com quintal limitado ou até apartamentos. “Se houver rotina, passeio, adestramento e atenção às necessidades do animal, não tem problema nenhum. Eu costumo dizer que o cachorro que mora em apartamento, com um bom tutor, vive melhor do que o que mora em casa.”
Para ele, o erro de muitos tutores que vivem em casa é achar que o quintal substitui o passeio. “E não substitui. O cachorro precisa sair, explorar, interagir. Isso faz parte da saúde emocional dele. Um cão bem cuidado, com rotina e gasto de energia, é obediente e não representa risco nem para a família nem para outras pessoas.”
Responsabilidade
Fazani também reforça que os tutores são legalmente responsáveis pelos atos de seus cães. “Os ataques são fatalidades, mas são totalmente evitáveis. O tutor precisa conhecer o seu animal, saber o que ele pode e não pode fazer, ter controle dele. Isso só acontece com acompanhamento profissional. E se houver um acidente, o tutor responde legalmente por isso, inclusive com processos e custos.”
Já o adestrador Gilberto Leandro Júnior, que atua há cinco anos com psicologia canina e mantém um centro de treinamento especializado em comportamento e reabilitação canina, chama a atenção para os erros mais comuns cometidos por tutores de raças fortes. “Os principais erros são a má socialização e a ausência de rotina. O cão precisa entender como funciona o ambiente da casa, precisa gastar energia, e essa energia precisa ser direcionada, ou ela vira problema lá na frente”, afirma o profissional.
Passeios são fundamentais
Gilberto afirma que, mesmo cães criados em casas grandes, não dispensam passeios regulares. “Passear é essencial, independentemente de raça ou porte. É durante o passeio que o tutor cria conexão com o cão, apresenta estímulos novos e ensina o que é ou não aceitável. Correr solto em casa não substitui isso”, destaca o especialista em psicologia canina.
Para ele, o comportamento agressivo pode ser corrigido, independentemente da idade do animal. “Os cães aprendem desde o primeiro dia até o último. O adestramento é fundamental, tanto para prevenir problemas quanto para recuperar o controle em situações já críticas. É possível reverter comportamentos agressivos com trabalho técnico e acompanhamento”.
Ele alerta para sinais que os tutores devem observar, “o corpo rígido, o rabo em posição elevada e enrijecida, o arrepio na orelha, as orelhas para cima, tudo isso são sinais de que o cão está desconfortável ou prestes a reagir. É preciso saber ler esses sinais”, complementa o adestrador.