O transporte ferroviário de cargas tem papel estratégico na economia nacional. No entanto, nas cidades da Região Metropolitana de Campinas (RMC), os trilhos que cruzam áreas urbanas também representam riscos, barulho e desafios diários para moradores e gestores públicos.
Em cidade como Americana, Sumaré, Hortolândia e Nova Odessa, a convivência entre a malha ferroviária e a mobilidade urbana exige soluções estruturais, muitas delas ainda não foram implementadas.

Acidentes reforçam urgência de medidas de segurança
Nos últimos anos acidentes graves ocorreram em pontos de passagem de nível na região:
- Hortolândia (2025): Um carro foi atingido por um trem após tentar atravessar os trilhos.
- Sumaré (2022): Jovem de 24 anos morreu ao ser atropelado.
- Nova Odessa (2024): Um homem em aparente estado de embriaguez foi atropelado.
- Americana (2025): Um homem caiu da passarela após tentar pular sobre um trem em movimento.
- Americana (2010): Nove mortos em colisão entre ônibus coletivo e trem no centro da cidade.
Viadutos e passarelas: soluções em andamento
Para reduzir riscos e melhorar a mobilidade, obras de transposição estão sendo feitas ou já foram entregues em várias cidades:
- Sumaré: Um viaduto no cruzamento entre a Rua Luiz Vaz de Camões e a Avenida Júlia Bufara foi inaugurado no primeiro semestre de 2024.
- Hortolândia: Está em construção um viaduto de 240 metros na Vila Real, com previsão de entrega para o segundo semestre de 2025. O secretário de Mobilidade Urbana, Atílio André Pereira, destaca que esse era um dos pontos mais críticos da cidade. “Quando o trem passava ali, atrapalhava tudo. Agora o viaduto está em construção. Esperamos concluir até o fim do ano”, afirma.
Ainda em Hortolândia, outras passagens problemáticas foram resolvidas nos últimos anos com obras executadas pela prefeitura, governo do Estado ou consórcios viários. O investimento total, segundo o secretário, beira os R$ 200 milhões.
- Americana: Em Americana, os impactos vão além da mobilidade. O barulho dos trens e buzinas afeta diretamente a vida dos moradores próximos à ferrovia. Dona Creusa Heleno, moradora há 50 anos, relata, “É um exagero. O trem por si já faz barulho. Agora estão buzinando demais. Dá eco dentro de casa!”, reclama.

O secretário de Planejamento de Americana, Diego Guidolin, afirma que já foram apresentados projetos para a concessionária Rumo Logística, responsável pela linha. “Temos dificuldades com o trecho central. A ampliação do viaduto Amadeu Elias, por exemplo, foi prometida pela Rumo, mas nunca executada. Buscamos alternativas com a prefeitura e o governo”, explica.
Outro morador, Artêmio Luchesi, reclama da rotina perturbada. “É buzina o dia inteiro, umas 400, 500 vezes. Quase ninguém dorme aqui no prédio”, conta o trabalhador rural.

Nova Odessa: Em Nova Odessa começaram as obras de duplicação do Viaduto do Pezão e a construção de uma nova passarela de pedestres. A previsão é de conclusão até março de 2026.
Santa Bárbara D’Oeste: Uma região na qual a linha férrea está sem operação há mais de 15 anos começa a ser transformada em áreas de lazer. O secretário de Meio Ambiente, Cléber Canteiro, dá mais detalhes. “Estamos criando ciclovias, pistas de caminhada e iluminação ao longo dos oito quilômetros do trecho urbano. A linha não tem mais viabilidade técnica para reativação e agora será aproveitada pela população”.

Relação com a concessionária é alvo de críticas
Prefeituras da RMC apontam dificuldade de diálogo com a Rumo. Em Hortolândia, o secretário Atílio destaca a falta de continuidade nos contatos técnicos. “É sempre uma pessoa diferente, muitas vezes sem experiência. Já tratei com outras concessionárias e nunca foi tão difícil como com a Rumo.”

Concessionária se posiciona
A Rumo, por sua vez, afirma que o uso da buzina é obrigatório por segurança e que seus maquinistas são treinados e monitorados. Em nota, a empresa afirmou que mais de 140 obras já foram concluídas no estado de São Paulo, e que outras 255 estão previstas até 2032. A Rumo diz que as intervenções seguem critérios técnicos e são acompanhadas por agências e órgãos públicos, como a ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres), o TCU (Tribunal de Contas da União) e o MPF (Ministério Público Federal).
A concessionária também afirma que mantém diálogo com as prefeituras por meio de sua área de Relações Governamentais.
Convivência em construção
Seja com obras, diálogo ou mudanças operacionais, o desafio continua sendo o mesmo: fazer com que os trilhos e as cidades consigam conviver de forma mais segura, silenciosa e eficiente.