sexta-feira, 19 abril 2024

Entrevista: Diante de pandemia, professor fala em desastre econômico

A pandemia do novo coronavírus está prestes a causar um desastre econômico de proporções inimagináveis, com desemprego, consumo em baixa e empresas quebrando. E o cenário da economia vai afetar o próprio setor público, que vai deixar de arrecadar tributos e investir em serviços essenciais. A Covid-19, enfim, pode fazer o mundo mergulhar em uma depressão profunda. 

A situação vai ser pior ainda no Brasil, onde a política econômica vigente desde a crise de 2015/2016 criou um batalhão de trabalhadores informais que, da noite para o dia, perdeu toda a fonte de renda e não consegue mais se manter. 

A postura, assumidamente pessimista, é do professor universitário José Dari Krein, 58, pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e Economia do Trabalho da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), que há 17 anos leciona no Instituto de Economia. 

Confira os principais trechos da entrevista concedida pelo professor à reportagem do TodoDia. 

TodoDia – Professor, nestes tempos de pandemia e isolamento social, muito se tem falado sobre transformações radicais nas relações trabalhistas e na readequação do setor produtivo às novas regras de consumo. O que, na sua opinião, vem pela frente?      

José Dari Krein – Temo a explosão do desemprego nos próximos meses.  A pandemia é um fato novo, desconhecido, e a sociedade não tem noção do tamanho das suas consequências. No primeiro momento, se optou pela suspensão de contratos de trabalho, para que o empresário tivesse gastos menores enquanto a atividade produtiva estiver suspensa. Mas ninguém sabe se tais vagas voltarão a existir. O fato é que não se sabe quanto tempo vai demorar para que a produção e o consumo sejam retomados. 

Já dá pra se estimar qual o custo social da pandemia? 

A queda de massa e de rendimentos é substantivo. Deixaram de circular R$ 8,9 bilhões por mês na economia.  E há outros números surpreendentes.  Nada menos que 50 milhões de brasileiros se inscreveram para receber as parcelas mensais de R$ 600 como auxílio de renda. Ninguém podia imaginar um número tão grande de pessoas necessitadas. E o dinheiro, na prática, é insuficiente para gastos essenciais. Mas o que vai ser dessa gente quando acabar o repasse das parcelas do auxílio?  Confesso que gostaria de não ser pessimista. Mas a gente tem dias muito difíceis pela frente. 

Na sua opinião, o fim gradativo do isolamento social não vai permitir a retomada da economia? 

Não há perspectiva alguma de recuperação econômica a curto prazo. As pessoas deixam de consumir, a economia deixa de girar. Setores fortes da indústria estão parando. O turismo, então, deixa de existir, sabe-se lá por quanto tempo. Além disso, as pequenas e médias empresas não conseguem, neste momento, se manter.  Elas estão desarticuladas. Vão deixar de ter renda por muito tempo. Até as contas públicas serão afetadas. As prefeituras deixarão de arrecadar tributos, por exemplo, e pode faltar dinheiro para a própria folha salarial do funcionalismo. A gente corre o risco de entrar em uma fase de depressão acentuada. 

A gente pode esperar algum tipo de ajuda do poder público para as pequenas empresas? 

Desde 2015/16, o governo federal adotou uma estratégia de enfrentamento contraproducente da crise econômica. E ela  se manteve. Uma política que impôs uma reforma trabalhista que prometia reduzir os custos para o empregador e gerar postos de trabalho. Mas não teve competência para gerar ocupação, e nem gerou empregos. Se jogou para o indivíduo a obrigação de se virar, de conseguir renda. Foi aí que se começou a falar em “empreendedorismo”. Explodiu a informalidade, o trabalho por conta própria. Nossos “pequenos empresários” são pessoas que, para sobreviver, têm de aceitar rendimentos muito baixos. O cidadão virou motorista de aplicativo, por exemplo, por falta de opção. Mal ganha pra se manter trabalhando. A empresa fica com parte considerável de seus rendimentos, e ele ainda é obrigado a arcar com o combustível  e a manutenção  do veículo. Se inverteu a lógica das relações trabalhistas. O governo desamparou o trabalhador.  Se criou a massa desarticulada, empobrecida, sem perspectiva, carente de governo. 

E como o senhor analisa a postura do governo federal hoje, diante da pandemia?    

Nosso governo é incapaz de promover a coordenação política. Vai contra o Congresso Nacional, conta a Justiça, contra os governadores. Aconteceu uma fragilização da esfera pública, que em nada colabora com o enfrentamento da pandemia. Se criam diariamente factoides políticos, e a população está largada ao “Deus dará” diante de uma crise imprevisível. 

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