terça-feira, 5 dezembro 2023

Dialeto caipira vai caindo em desuso

 Estudo verificou semelhanças da fala dos moradores com o galego e falta de interesse da população jovem

VIOLEIRO TOCA | Quadro do pintor Almeida Júnior retrata o ambiente bucólico (Foto: Reprodução/Pinacoteca do Estado)

Além do sotaque caipira com a pronúncia do “erre mais rasgado”, moradores de cidades do interior paulista, localizadas próximas ao Rio Tietê, têm um vocabulário peculiar. O terçol na pálpebra do olho pode ser viuvinha; a garganta, goela; o quadril de uma mulher tem a designação de anca ou “os quartos”.

Uma pesquisa feita na USP mostrou que, embora ainda seja marcante, o dialeto caipira está caindo em desuso principalmente entre a população mais jovem e as mulheres. Os idosos são os guardiões do sotaque acaipirado.

O estudo também apontou que o português falado nessa região e o galego (linguagem da região ocidental da Península Ibérica – Portugal e Galiza) possuem bastantes semelhanças lexicais. Cerca de 82,4% das palavras do vocabulário desses paulistas possuem correspondência com as unidades lexicais do galego.

A autora da pesquisa, Lívia Carolina Baenas Barizon, explica que o Rio Anhembi (atual Rio Tietê), por ter seu fluxo dágua correndo sentido continente, foi fundamental para a difusão da língua portuguesa e o dialeto caipira durante o início do século XVIII. Segundo a pesquisadora, “o dialeto caipira teria surgido nos com núcleos familiares das cidades paulistas a partir do século XVIII e sido levado pelas monções para dentro do território paulista. Em sua caminhada rumo ao Mato Grosso (o Rio Tietê deságua no Rio Paraná, na fronteira com o Mato Grosso) para desbravar terras e retirar ouro, os bandeirantes saíam da capital paulista e seguiam a rota do Rio Tietê”, diz.

Para obter os dados para a tese defendida na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, Lívia entrevistou moradores das cidades de Santana do Parnaíba, Itu, Sorocaba, Porto Feliz, Pirapora do Bom Jesus, Capivari, Piracicaba e Tietê para verificar o quanto itens lexicais dessa região convergiam semanticamente com a língua galega. A filóloga tinha interesse em identificar tendência à manutenção, tendência ao desuso e estabilidade semântico-lexicais das lexias que possuem correspondência ao galego.

O contato inicial da pesquisadora com os moradores – homens e mulheres de três faixas etárias – jovens: de 18 a 25 anos; adultos: de 36 a 55 anos; e idosos: acima de 60 anos – se deu por meio de um bate-papo informal e apresentação da pesquisa, seguido de aplicação de questionário.

De posse de desenhos, era apontada aos entrevistados alguma região do corpo humano no papel e solicitado a eles que dissessem o nome pelo qual conheciam essa parte do corpo ou se havia alguma outra designação.

As razões que levaram a filóloga a realizar a comparação com o galego foi o fato de ela já saber por outros estudos que havia um parentesco próximo entre o português e o galego e a facilidade de acesso. 

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