O mercado nacional de frutas, legumes e verduras faz um prognóstico preocupante sobre os efeitos da pandemia do coronavírus. A venda de folhosas despencou 35%, já que lanchonetes e restaurantes tiveram de se adaptar às medidas de isolamento social, e diminuir drasticamente a produção. Além disso, o produtor vê com preocupação o aumento do custo do frete, principalmente para o Sul e o Nordeste, o que pode aumentar o custo para o abastecimento de feiras e supermercados.
O momento é de tensão. Até porque as expectativas não das melhores entre baristas e restaurateurs. A reportagem do TODODIA ouviu empreendedores do setor em Americana. Eles foram obrigados a reduzir drasticamente a compra dos ingredientes do cardápio diário, que agora depende basicamente da venda de marmitas e das entregas em domicílio.
Mas a pandemia inesperada e a mudança imposta nos hábitos de consumo acabam favorecendo exatamente os menores produtores, que mantêm suas hortas e atendem uma clientela tradicional, da vizinhança. As pessoas, em quarentema, cozinham mais em casa. E, pelo menos nestes casos, o faturamento do produtor cresceu.
DESAFIOS
A redução drástica do consumo de folhosas foi contabilizada pela PMA Brasil, escritório local da poderosa Produce Marketing Association, que representa compradores e fornecedores de 55 países do mundo. Por aqui, os dados foram tabelados a partir da análise do mercado em lavouras paulistas.
Para a diretoria, a quarentena decretada em março exigiu muito esforço e a elaboração de uma nova estratégia de gestão de pessoas, logística e negócios, para garantir o abastecimento de todo o País.
A primeira etapa, segundo o relatório técnico, foi vencida “a duras penas” por todos os lados. Mas fica a dúvida para o futuro: quais são os produtos que os consumidores continuarão comprando?
O cenário do setor mostra que produtos básicos (como batata, alho, cebola e ovos) continuam muito procurados. Mas fatores como a variação cambial fizeram despencar a demanda por frutas importadas (com maçã, pera, kiwi, ameixa e citrus).
Além disso, aponta a PMA Brasil, há uma tendência – ainda impossível de ser dimensionada – sobre a fuga do consumidor das feiras e supermercados, preocupado com a possível falta de dinheiro. A certeza é o consumo do indispensável. E os produtores terão de se adequar a isso.
OUTRO LADO
HORTA | Ademir Truzzi comemora o faturamento maior (Foto: Divulgação | Arquivo pessoal)
A queda nas vendas de hortaliças para restaurantes é nítida. Mas as hortas que fornecem diretamente para o consumidor festejam faturamento maior. Ademir Truzzi, que há 23 anos produz mudas de hortaliças em Americana, afirma que o isolamento social mantém as pessoas dentro de casa. Cozinhar passou a fazer parte do cotidiano de quem almoçava fora. Além disso, diz, cultivar o próprio canteiro passou a ser um programa interessante para o sujeito manter o equilíbrio mental nestes tempos de confinamento.
Truzzi conta que as cooperativas dos pequenos produtores da região atestaram a presença maior de consumidores nas hortas. Como a dele próprio, no Boa Vista.
“As pessoas fogem da aglomeração na feira ou no supermercado, e compram as verduras e legumes ali, ao lado de casa. Quem depende da venda aos restaurantes está passando apertado. Quem fornece hortaliças para a vizinhança, está festejando”, resume o produtor rural.
‘MOMENTO TRISTE’
Para o empresário Renato Selva, que há 27 anos tem um restaurante na Vila Israel, em Americana, o momento é muito triste para o setor. Os estabelecimentos precisam da receita como capital de giro, e nem todos os empreendimentos estão habituados ao delivery.
Ele mesmo disse que começou a fazer entregas com a pandemia, mas os clientes ainda não se acostumaram à novidade.
“Muita gente teve de fechar as portas porque não tinha nem como quitar a folha de pagamento do mês”, disse. Ele ressalta que é a favor do isolamento social para conter a pandemia, mas que o setor precisa se reinventar a partir de agora.
FATURAMENTO CAIU 85%, DIZ DONO DE BISTRÔ
O empresário Antônio Luís de Jesus Penachione, dono de um bistrô em Americana, afirma que os consultórios e escritórios suspenderam o atendimento, o que fez seu faturamento cair 85%.
“Além disso, quem segue trabalhando em home office faz comida em casa”, disse. “Como não vendo, também parei de comprar. É a roda da economia. Todos os setores são afetados. As despesas fixas se tornaram um pesadelo.”
RESTAURANTES ARTICULAM CAMPANHA
Os donos de bares e restaurantes de Americana articulam uma campanha para estimular o consumo nos estabelecimentos locais.
“Passada a quarentena, é importante estimular a atividade de pequenos e médios empreendedores”, afirmou Paulo César Pereira, dono de uma pizzaria na cidade.
Não é admissível, afirma, que o cidadão deixe Americana para comer fora. Na sua opinião, a população precisa ajudar.
ONU FAZ ALERTA PARA FOME NO MUNDO
A pandemia do novo coronavírus ameaça centenas de milhões de pessoas no mundo com a escassez de alimentos, segundo alerta do economista Arif Husain, chefe do Programa Mundial de Alimentos, agência da ONU. O drama é maior particularmente na África subsaariana, que depende de importações e exportações.
Todos os anos, disse, as trocas de arroz, soja, milho e trigo permitem alimentar 2,8 bilhões de pessoas no mundo, 212 milhões delas em situação de insegurança alimentar crônica e 95 milhões em situação de insegurança alimentar grave. “Para muitos países pobres, as consequências econômicas serão mais devastadoras do que a doença em si”, alerta.
Mas há outros fatores preocupantes ao redor do planeta. Embora os mercados mundiais de cereais de base estejam bem supridos e os preços globalmente baixos, os alimentos devem viajar dos celeiros do mundo até os locais de consumo. As medidas de confinamento estabelecidas para combater afetam os portos, por exemplo. Guerras e movimentos sociais localizados, disse, também contribuem com o risco de desabastecimento.
Também são fonte de preocupação os “atrasos nas fronteiras para os contêineres” de mercadorias, gerando desperdício.