sexta-feira, 22 novembro 2024

Barroso associa pane do TSE à falta de testes e pede que PF apure ‘milícias digitais’

O presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), ministro Luís Roberto Barroso, mudou, nesta segunda-feira (16), a versão oficial a respeito das causas que levaram ao atraso na divulgação dos resultados das eleições municipais.

O ministro afirmou que a demora na entrega de equipamentos por parte da empresa Oracle, em razão da pandemia, impediu a realização de testes prévios no sistema.

Os equipamentos, segundo ele, deveriam ser entregues em março, mas chegaram somente em agosto.

“Essa demora impediu que nele se realizassem os testes prévios com reprodução do exato ambiente das eleições. Aí origem do problema, e a pandemia ademais trouxe dificuldade de interação humana o que acarretou complexidade a todo o processo”, disse.

“Tratava-se de equipamento novo, que não pode ser entregue na data desejada em razão da pandemia, portanto sem culpa de ninguém, e entregue em agosto não foi possível entregar equipamento que funcionaria nas eleições para todos os testes de desempenhos e eventualidade e intercorrência”, completou.

Na noite de domingo (15), dia das eleições, Barroso havia afirmado que uma falha em um dos núcleos do super computador que processa a totalização dos votos havia resultado no atraso da divulgação dos resultados.

“Houve um atraso na totalização dos resultados por força de um problema técnico que foi o seguinte: um dos núcleos de processadores do super computador que processa a totalização falhou e foi preciso repará-lo”, disse o ministro na ocasião.

ATAQUE HACKER

Na entrevista coletiva desta segunda, Barroso acrescentou que o sistema do tribunal sofreu uma tentativa de invasão de hackers e que em seguida milícias digitais entraram em ação para desacreditar o sistema.

O ministro disse que há suspeita de envolvimento de grupos extremistas, muitos deles já investigados pelo STF (Supremo Tribunal Federal).

Ele não afirmou se os grupos de milícia digitais estão ligados ou são os militantes bolsonaristas investigados no âmbito do inquérito dos protestos antidemocráticos.

“Milícias digitais entraram imediatamente em ação tentando desacreditar o sistema. Há suspeita de articulação de grupos extremistas que se empenham em desacreditar as instituições, clamam pela volta da ditadura e muitos deles são investigados pelo STF”, afirmou na entrevista.

“Na data de hoje conversei pela manhã com diretor geral da PF (Polícia Federal) e pedi a ele a instauração da investigação que se justifica nesse caso, investigação seria e ampla, e agora formalizei em ofício o pedido ao diretor da PF”, completou.

O ministro voltou a afirmar que o ataque contra o sistema do TSE partiu de Estados Unidos, Brasil e Nova Zelândia, com uma intensidade de 436 mil conexões por segundo.

Sem provas, Bolsonaro levanta dúvidas sobre apuração

No dia seguinte às eleições municipais, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) voltou a questionar o sistema eleitoral do país e levantou questionamentos sobre o resultado das urnas.

O presidente foi questionado e deu a declaração sobre o pleito nesta segunda-feira (16) ao conversar com um grupo de apoiadores em frente ao Palácio da Alvorada.

“Nós temos que ter um sistema de apuração que não deixe dúvidas. É só isso. Tem que ser confiável e rápido. Não deixar margem para suposições. Agora [temos] um sistema que desconheço no mundo onde ele seja utilizado. Só isso e mais nada”, disse.

“O Supremo disse que é inconstitucional o voto impresso, tem proposta de emenda constitucional na Câmara. Se nós não tivermos uma forma confiável de apurar as eleições, a dúvida sempre vai permanecer”, continuou o presidente.

Bolsonaro ainda afirmou que a demanda pelo voto impresso é do “povo” e que é preciso atender a população.

“Muita gente fala sem ouvir o povo. No meu caso, estou sempre ouvindo a população eles querem um sistema de apuração que possa demorar um pouco mais, não tem problema nenhum, mas que seja garantido que o voto que essa pessoa deu, vá para aquela pessoa de fato”, afirmou o presidente.

Bolsonaro apoiou e fez campanha abertamente para 45 candidatos a vereador em diversas cidades do país.

Desse total, ao menos 33 não conseguiram se eleger neste domingo (15).

Investigação aponta operação coordenada contra TSE

Investigação da SaferNet, que trabalha em parceria com o Ministério Público Federal no monitoramento de fraudes eleitorais cometidas pela Internet, aponta que ataques hacker sofridos pelo TSE neste domingo (15) foram uma “operação coordenada” para “desacreditar a Justiça Eleitoral”. O tribunal foi alvo de negação de serviço (DDoS) contra os seus servidores e o vazamento de dados de funcionários.

Thiago Tavares, presidente da SaferNet, que vem fazendo o monitoramento desde o fim de outubro, forneceu ao MPF e ao TSE os dados levantados em tempo real.

“Trata-se de uma operação coordenada e planejada para ser executada no dia das eleições com o objetivo de desacreditar a Justiça Eleitoral e eventualmente alegar fraude no resultado desfavorável a certos candidatos”, diz Tavares.

Às 09h25 deste domingo, houve vazamento de dados antigos de um banco de dados com informações desatualizadas sobre o sistema de recursos humanos da Justiça Eleitoral. O ataque que deu acesso aos dados, no entanto, foi feito antes de 23 de outubro, segundo a PF.

“Apesar de o ataque ter sido feito antes de 23 de outubro, deixaram para publicar o vazamento dos dados na manhã de hoje, para causar mais impacto”, diz Tavares. “Em paralelo, defl agraram um ataque de negação de serviço (às 10h41) para tirar do ar o site e alguns serviços da Justiça Eleitoral”.

Ele explica que os IPs usados em ataques de negação de serviço (DDoS) geralmente integram as chamadas “redes zumbis”, formadas por computadores infectados, que podem estar localizados no exterior e serem coordenados daqui.

O TSE afirmou que os IPs dos hackers que invadiram os sistemas do tribunal seriam de Portugal ou coordenados por um cidadão português.

Os ataques, a princípio, não têm relação com o atraso da apuração dos votos pelo TSE neste domingo, diz Tavares.

Redes sociais fervem apontando supostas ‘fraudes’

O atraso na apuração, além das informações sobre os dois ataques contra o TSE, deram combustível para uma campanha nas redes sociais com questionamentos à integridade do sistema eleitoral e dos resultados da eleição.

Perfis bolsonaristas e de outros políticos passaram o dia divulgando mensagens apontando para supostas fraudes eleitorais e falta de credibilidade do TSE.

O Twitter chegou a rotular um tuíte da deputada Joice Hasselman (PSL- -SP), que afirmou “Fraude? Será? Tem todo o cheiro” – a postagem recebeu o alerta “Essa reivindicação de fraude eleitoral é contestada”.

Vários grupos políticos já estavam havia dias questionando a segurança dos servidores do TSE e das urnas, como que antevendo o anúncio do suposto hacking, diz Tavares.

Ele cita uma transmissão ao vivo do cientista político Paulo Moura, reproduzida no perfil do canal conservador “Avança Brasil” no Periscope há 9 dias.

Intitulado “Se o STJ foi hackeado, como confiar no TSE”, o vídeo afirma: “Se a segunda maior instância da Justiça brasileira (STJ) é vulnerável a um ataque hacker dessa magnitude, e natureza, como confiar no TSE e seu sistema de controle da apuração dos votos das eleições brasileiras?”. Moura se referia ao ataque hacker ao STJ ocorrido em 3 de outubro.

À Folha de S.Paulo Moura afirmou que “o TSE tem um problema real de credibilidade; apesar de dizer que os sistemas de contabilização de votos não foram atacados porque não estão na rede, sabemos que qualquer sistema plugado na tomada pode ser hackeado. Os ataques contra o TSE provam que o sistema é vulnerável”.

O TSE esclareceu que os ataques hacker não atingem a contabilização ou apuração dos votos.

O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), que foi delegado especializado em crimes cibernéticos, afirmou que o Senado irá cobrar uma investigação sobre os ataques contra o TSE. “Ataques como esse que atingiu o TSE exigem estrutura e financiamento; o objetivo é desacreditar a democracia. É preciso garantir investigação rápida e punição pesada para os criminosos”.

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