Após tentativas frustradas, o governo quer testar novamente o Congresso e reeditar medidas provisórias que caducaram no Legislativo. Três iniciativas podem ser reapresentadas pela gestão Jair Bolsonaro (sem partido) em 2021.
Entre as iniciativas estão a Carteira Verde e Amarela, a dispensa de empresas de divulgar balanços em jornais e a lei do time mandante no futebol.
A primeira – a MP 905 – tinha como objetivo flexibilizar as relações trabalhistas. As duas últimas impactavam o mercado de mídia.
A MP 892, dos balanços nos jornais, buscava permitir que empresas publicassem resultados financeiros apenas nos sites da CVM (Comissão de Valores Mobiliários), da própria companhia e da Bolsa. Já a MP 984 dava ao mandante do jogo de futebol o direito exclusivo de transmiti-lo ou negociar a transmissão.
A Constituição proíbe a reedição de MPs rejeitadas ou que tenham perdido validade em uma mesma sessão legislativa -ou seja, no mesmo ano.
Uma MP tem vigência por 60 dias, prorrogável por igual período. Para virar lei, no entanto, o texto precisa ser aprovado pela Câmara e pelo Senado no prazo máximo de 120 dias.
A possibilidade de reedição da MP dos balanços e do mandante no futebol foi levantada pelo secretário-executivo do Ministério das Comunicação, Fabio Wajngarten, em entrevista ao deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho 03 de Bolsonaro.
Na conversa, Wajngarten atacou a TV Globo -vista pelo presidente como emissora inimiga- e negou menosprezo aos jornais ao defender os dois textos, sob argumento de que ambas as medidas estavam alinhadas ao discurso do governo em favor da liberdade econômica.
Wajngarten confirmou que o governo pensa em reeditar as duas MPs.
“Jamais querendo me meter ou invadir a área de articulação política, mas eu entendo que, em janeiro, o governo deveria retomar com força as duas MPs e reeditá-las.”
O resgate da Carteira Verde e Amarela é defendido pelo ministro Paulo Guedes (Economia). O texto chegou a passar na Câmara, mas caducou no Senado.
A flexibilização nas regras trabalhistas tem o aval do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Ele, porém, pode não estar à frente da Casa quando os textos forem reencaminhados pelo governo.
Obter um resultado diferente para a mesma situação vai depender de alguns cenários. O primeiro deve ficar mais claro a partir de fevereiro, após a eleição para o comando da Câmara.
Julgamento no plenário virtual do STF (Supremo Tribunal Federal) na próxima semana pode decidir se Maia poderá buscar uma reeleição. Ele comanda a Casa desde 2016.
A expectativa é que o Supremo jogue a decisão para o próprio Congresso. Se isso ocorrer, e Maia quiser se candidatar, líderes partidários veem poucas chances de ele obter apoio e se reeleger. Se a especulação se confirmar, o horizonte melhora consideravelmente para o governo Bolsonaro.
Hoje, Maia é visto por aliados de Bolsonaro como o principal responsável por dois dos três textos terem perdido a validade -a MP dos balanços e a do mandante no futebol.
A MP dos balanços, de agosto de 2019, foi vista como revanchismo do governo contra a imprensa, e a do mandante do futebol, de junho de 2020, contra a Globo.
Antes da edição dos textos, o próprio presidente havia sancionado uma lei que permitia uma publicação simplificada dos balanços nos jornais e que entraria em vigor a partir de janeiro de 2022.
A MP também foi assinada no dia 6 de agosto de 2019, mesmo dia em que o jornal Valor Econômico publicou reportagem que mostrava que Carlos Bolsonaro, vereador no Rio de Janeiro, despachava no Palácio do Planalto.
“Eu espero que o Valor Econômico sobreviva à medida provisória de ontem”, afirmou a jornalistas no dia seguinte. O texto perdeu validade em dezembro.
Nos bastidores do Senado, o anúncio de Wajngarten de reencaminhar a proposta é visto como um novo ataque à imprensa, para agradar a ala ideológica.
Um senador afirmou que a matéria, no entanto, está destinada a morrer sem consequências permanentes, além de atrapalhar o processo legislativo.
A lei do mandante também foi cercada de polêmica. O texto foi editado em junho deste ano, um dia depois de a Câmara aprovar um projeto que suspendia o pagamento do programa Profut, de parcelamento de dívidas tributárias dos clubes.
Maia foi surpreendido, porque, segundo ele, havia um acordo com o governo de que a MP não seria apresentada.
“Não entendi o porquê da edição, mas é um direito do governo”, disse. “O que eu defendo é que essa é uma discussão mais profunda do que não cabe numa medida provisória. Não sei nem se tem toda essa relevância e urgência.” Resultado: a medida perdeu validade em outubro.
No caso da MP da Carteira Verde e Amarela, a Câmara até votou o texto, que expirou no Senado.
Em 2021, com um presidente da Câmara mais alinhado ao Planalto, a chance de as MPs serem votadas aumenta. Mas, pelo menos no caso da Carteira Verde e Amarela, o governo sinalizou que pretende amenizar o texto para garantir aprovação.
Na avaliação de um senador influente, sob a condição de anonimato, a medida apenas não obteve sucesso na Casa pois era uma “minirreforma trabalhista”, mascarada em medida provisória.
A avaliação do governo, portanto, é que será preciso encaminhar uma MP que não proponha mudanças estruturais e que a tramitação seja mais bem negociada.
Além de a proposta tocar em muitos pontos sensíveis, há a percepção de que ela ganhou muitos apêndices na Câmara, principalmente em questões sindicais. Isso resultou na oposição de parte dos senadores.
A tramitação seria mais fácil no momento atual, por causa das alianças fechadas no Congresso, especialmente com o centrão.
A VOLTA DAS MPS FRACASSADAS
Balanço nos jornais (MP 892)
Previa o fim da obrigação para grandes empresas publicarem seus balanços em jornais impressos. Proposta permitia que empresas fizessem divulgações obrigatórias apenas nos sites da CVM (Comissão de Valores Mobiliários), da própria companhia e da Bolsa
Mandante (MP 984)
Estipulava que as equipes mandantes das partidas teriam exclusivamente o direito de exibição da partida. Atualmente, os interessados na transmissão precisam negociar com os dois times que disputam o jogo
Carteira Verde e Amarela (MP 905)
Oferecia benefícios tributários e multa de 20% do saldo do FGTS, independentemente do motivo da demissão. Era voltada a jovens de 18 a 29 anos que não tiveram emprego com registro em carteira ainda e pessoas com 55 anos ou mais sem trabalho formal há um ano