O ex-ministro já deixou a Superintendência da PF em São Paulo, para onde tinha sido levado na quarta-feira (22)
O juiz federal Ney Bello, do TRF-1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região), determinou nesta quinta-feira (23) a revogação da prisão preventiva do ex-ministro da Educação Milton Ribeiro. O ex-ministro já deixou a Superintendência da PF em São Paulo, para onde tinha sido levado na quarta-feira (22).
Ney Bello deu a decisão após um magistrado plantonista negar o mesmo pedido da defesa. O juiz integra a lista quádrupla enviada para o presidente Jair Bolsonaro (PL) indicar duas vagas de ministros do STJ (Superior Tribunal de Justiça). Milton Ribeiro foi preso nesta quarta junto a pastores suspeitos de operar um balcão de negócios na pasta e na liberação de verbas do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação).
Ele é investigado pelas suspeitas de crimes de corrupção passiva, prevaricação, advocacia administrativa e tráfico de influência. O caso complica ainda mais o já enfraquecido discurso anticorrupção de Bolsonaro, que tentará a reeleição em outubro. “Verifico que a busca e apreensão já foi realizada, as quebras de sigilos já foram deferidas e não há razão o bastante para a manutenção da prisão, sem a demonstração concreta de onde haveria risco para as investigações”, disse o magistrado.
“Afigura-se desnecessária a segregação cautelar decretada para o fim de garantir a instrução processual, assim como a ordem pública ou econômica, que se mostra desarrazoada no presente momento.” Segundo ele, apesar de não ser necessária a prisão, os possíveis crimes devem ser investigados. “A investigação deve correr até não mais poder e se apurarem todos os fatos citados, com as garantias do devido processo legal e da ampla defesa.”
O juiz afirma que há vinculação entre as investigações com crimes relacionados à administração pública e “não havendo mais qualquer vínculo entre os indiciados e o Poder Público, não se justifica a imposição de tão grave medida”. “Além de ora paciente não integrar mais os quadros da Administração Pública Federal, há ausência de contemporaneidade entre os fatos investigados (…) supostamente cometidos no começo deste ano, razão pela qual entendo ser despicienda a prisão cautelar combatida”, acrescenta.
Além do ex-ministro, foram presos os pastores Gilmar Santos e Arilton Moura, ambos ligados ao presidente Jair Bolsonaro. Também foram detidos Luciano de Freitas Musse, advogado e ex-assessor do MEC, e Helder Bartolomeu, ex-assessor da Prefeitura de Goiânia. O juiz Ney Bello estendeu a decisão e também soltou todos eles nesta quinta-feira.
Em nota, o advogado do ex-ministro, Daniel Bialski, disse que na decisão “felizmente, a ilegalidade foi reconhecida e a prisão revogada. A defesa aguarda o trâmite e a conclusão do inquérito, quando espera que será reconhecida a inocência do ex-ministro”. Daniel Bialski, ao acompanhar nesta quinta-feira a soltura, também disse que seu cliente relaciona sua prisão ao período eleitoral. “Ele falou: ‘não fiz nada de errado, não cometi nenhum crime e sei que fui usado pelas circunstâncias políticas e pela eleição, que está próxima’. Essa prisão não tem justificativa.”
Além da crise na economia, incluindo a alta do preço dos combustíveis, e da instabilidade política, com seguidos ataques ao Judiciário, com a prisão de Ribeiro a campanha do presidente viu fragilizar ainda mais a tentativa de um discurso anticorrupção. Em março, Bolsonaro havia dito que colocaria a “cara no fogo” por Ribeiro em meio às suspeitas no Ministério da Educação. Nesta quarta, buscou se descolar do antigo aliado, dizendo que “ele que responda pelos atos dele”.
Os dois pastores que também foram presos pela PF são apontados como lobistas que atuavam no MEC.
A ação desta quarta-feira foi batizada de Acesso Pago e investiga a prática de “tráfico de influência e corrupção para a liberação de recursos públicos” do FNDE. Com base em documentos, depoimentos e um relatório da CGU (Controladoria-Geral da União) foram mapeados indícios de crimes na liberação de verbas do fundo. Ao todo, foram cumpridos 13 mandados de busca e apreensão em Goiás, São Paulo, Pará e Distrito Federal.
Os dois pastores, Gilmar e Arilton, são peças centrais no escândalo do balcão de negócios do ministério. Como mostrou o jornal Folha de S.Paulo, eles negociavam com prefeitos a liberação de recursos federais mesmo sem ter cargo no governo. Os recursos são do FNDE, órgão ligado ao MEC controlado por políticos do centrão, bloco político que dá sustentação a Bolsonaro desde que ele se viu ameaçado por uma série de pedidos de impeachment.
O fundo concentra os recursos federais destinados a transferências para municípios. Prefeitos relataram pedidos de propina, até em ouro.
Em áudio revelado pela Folha de S.Paulo, o ex-ministro Milton Ribeiro disse que priorizava pedidos dos amigos de um dos pastores a pedido de Bolsonaro. Na gravação, o então ministro dizia ainda que isso atendia a uma solicitação do presidente e mencionava pedidos de apoio que seriam supostamente direcionados para construção de igrejas. A atuação dos pastores junto ao MEC foi revelada anteriormente pelo jornal O Estado de S. Paulo.
Ribeiro deixou o cargo no fim de março, uma semana após a revelação do áudio pela Folha de S.Paulo.
QUEM É QUEM
Milton Ribeiro
Pastor de uma igreja presbiteriana em Santos (SP), foi o terceiro ministro da Educação do governo Jair Bolsonaro. Chegou ao cargo em julho de 2020 após a demissão de Abraham Weintraub. Sem experiência em políticas públicas, foi escolhido como forma de aceno para a base religiosa que apoia o governo. Saiu do governo em 28 de março de 2022, uma semana após a Folha de S.Paulo revelar áudio em que ele fala em priorizar um dos pastores a pedido de Bolsonaro.
Gilmar Santos
Preside, de Goiânia (GO), uma entidade chamada Convenção Nacional de Igrejas e Ministros de Assembleias de Deus no Brasil Cristo para Todos. Ao lado de Arilton Moura, negociava liberação de verbas federais da Educação com prefeitos, mantendo forte interlocução no MEC, FNDE e no Planalto. Santos é pregador com quase quatro décadas de carreira, com bom trânsito em igrejas em várias regiões do país. Ele é tratado como chefe pelo pastor Arilton Moura.
Arilton Moura
É também pastor e aparecia como secretário da convenção nacional presidida por Gilmar Santos, a quem trata como chefe. Ao lado de Gilmar Santos, negociava liberação de verbas federais da Educação com prefeitos, mantendo forte interlocução no MEC, FNDE e no Planalto. Já foi nomeado para um cargo comissionado na liderança do MDB na Câmara dos Deputados e também transitou em gabinetes petistas, como o de Ana Júlia Carepa, que governou o Pará de 2007 a 2011. Também vive em Goiânia, assim como Gilmar.