sexta-feira, 26 abril 2024

D. Margarida: uma mulher à frente de sua geração

Há quase 200 anos, uma mulher fazia literalmente história ao fundar o município de Santa Bárbara d’Oeste. A 100 dias do aniversário da cidade, celebrado em 4 de dezembro, o feito de Margarida da Graça Martins deve ser comemorado, principalmente numa época onde se discute tanto a importância dos direitos igualitários da mulher em sociedade.
Muito mais do que precursora, ela foi uma representante da força feminina. Hoje, Santa Bárbara em nada lembra àquelas terras do passado. O progresso chegou à cidade transformando-a num dos mais importantes municípios da RMC (Região Metropolitana de Campinas) e do Estado de São Paulo. E a partir de hoje, até o aniversário, o TODODIA publicará matérias especiais contando curiosidades e fatos importantes ligados à cidade.
Aos 80 anos, Mildred da Graça Martins Prezotto se orgulha por ser descendente da fundadora de Santa Bárbara. Ela não se recorda ao certo se é da quarta ou quinta geração da família ou de como se compõe ao certo a àrvore genealógica, mas tem certeza que é parente pelo que os familiares lhe contaram.
Diz que a memória tem lhe pregado algumas peças. Mesmo assim, ainda se recorda da importância que Margarida teve, e de como seus atos influenciaram sua própria vida anos depois. “Foi aqui que nasci, me casei, tive minhas filhas, e também vi meus netos nascerem. Não trocaria Santa Bárbara por nenhum outro lugar do mundo. Quando tenho que sair da cidade por algum motivo já quero voltar”, diz.
Prestes a se tornar bisavó em dose dupla, já que as esposas dos netos Julio Cesar e Douglas estão no final da gestação, dona Mildred deseja que as futuras bisnetas Helena e Antonela nasçam em um mundo mais igualitário e digno, no qual, a mulher seja mais respeitada e valorizada. “Creio que nós mulheres somos muito mais inteligentes que os homens. Somos mais sensíveis, guerreiras e temos muita vontade de vencer”, avisa.
Mildred relembra que, no passado, muitos assuntos não eram discutidos em família, principalmente na frente de mulheres ou dos filhos. No entanto, ela se diz feliz por morar na mesma rua que Dona Margarida teve uma casa: na Floriano Peixoto, região central da cidade. “Meus avós me contavam que ela morou aqui, mas hoje está muito diferente do passado”.
E por falar em progresso, Mildred, apesar de amar incondicionalmente Santa Bárbara, critica a falta de segurança e do sossego, resquícios de um passado que já não existe mais.
Filha de Mildred, a funcionária pública Andrea Mildred Prezotto, 56, também se diz honrada em ser descendente de uma mulher que, em sua opinião, fugiu dos padrões da época. “Se hoje ainda convivemos com muito machismo e preconceito na sociedade, imagino que para ela não deve ter sido nada fácil.”
Andrea destaca o fato de Dona Margarida ter se casado muito cedo e ficado viúva precocemente. Depois, ainda teve um segundo casamento, o nascimento dos filhos, e a responsabilidade de tomar decisões sozinhas após a morte dos pais e do segundo marido. “Ela realmente foi uma mulher de fibra, muito à frente de seu tempo, que criou cinco filhos, administrou terras, comandou escravos e foi responsável pela fundação de uma cidade”.
CAPELA
Segundo a historiadora e coordenadora do Centro de Documentação da Fundação Romi, Sandra Edilene de Souza Barboza, quando Dona Margarida mandou construir uma capela em louvor à sua santa de devoção, Santa Bárbara, ela não fez isso pensando em fundar uma cidade. “Esse fato foi atribuído à ela porque ao doar as terras para a cúria paulistana, propiciou que ao redor do local surgisse um povoado”, explica.
“Imagino que vivendo em uma sociedade na qual o homem é que estava à frente dos negócios , ela deve ter enfrentado muita resistência e dificuldade para se posicionar como uma respeitada senhora de engenho”, finaliza.
Secretário de Cultura de Santa Bárbara, Evandro Félix Carneiro, definiu a fundadora do município como uma mulher guerreira, que vivia num século marcado pelo autoritarismo, machismo e preconceito. Para ele, o fato dela ter se sobressaído tem que ser festejado.
Como não há registros fotográficos de Dona Margarida, o material físico destinado à ela na cidade se resume ao que pessoas e historiadores contaram. Com base nisso, foram construídos e erguidos um busto em homenagem à ela na praça Central, e também no Museu da Imigração. Além disso, há uma pintura na Câmara Municipal.

 
O início de uma grande cidade

Segundo levantamento do Centro de Documentação Histórica de Santa Bárbara dOeste, Margarida da Graça Martins nasceu em 27 de novembro de 1782. Era filha única de Manoel José da Graça e de Anna Maria Cardosa. Casou-se aos 13 anos, com José Paschoal de Lima, que tinha 37 anos, e com quem não teve filhos. Ficou viúva dele três anos após o casamento. Depois, aos 26 anos, casou-se novamente, desta vez, com o sargento-mor Francisco de Paula Martins (27 anos), com o qual teve cinco filhos: Ângela, Manoel, Ana Margarida, Maria e Belchior.
Com a morte do pai, em 1810, e depois do marido, em 1815, Margarida tornou-se herdeira de propriedade e escravos, assumindo os negócios da família. Chegou em Santa Bárbara em 1817, quando adquiriu uma sesmaria para montar um engenho de açúcar. Após sua chegada ao município doou as terras para a cúria paulistana construir a capela que hoje é a igreja Matriz.
A região foi sendo povoada e novos lavradores chegaram à região.
Com o desenvolvimento da indústria foi acelerado o crescimento urbano. Margarida faleceu em julho de 1864, aos 81 anos, e foi enterrada em São Paulo. Em 4 de dezembro de 1967, seus restos mortais foram transferidos para a praça Coronel Luis Alves, em Santa Bárbara.

 

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