sexta-feira, 26 abril 2024

Evolução da Holanda nas Olimpíadas serve de inspiração para o Brasil

 Holanda passou a desafiar potências bem mais populosas nos últimos anos e tem registrado sucesso crescente nos Jogos Olímpicos.

O dirigente explica que o modelo holandês começou a ser estudado pelos brasileiros antes de Londres-2012. (Foto: Reuters / Folhapress)

País de 17 milhões de habitantes, a Holanda passou a desafiar potências bem mais populosas nos últimos anos e tem registrado sucesso crescente nos Jogos Olímpicos.

Em Tóquio-2020, os holandeses ocuparam pela primeira vez a sétima posição no quadro de medalhas de uma edição de Verão e foram ao pódio 36 vezes, praticamente o dobro dos números obtidos nos três eventos anteriores (16, 20 e 19).

Nas Olimpíadas de Inverno, o salto foi triplo: de 8 medalhas em 2010 para 24 em 2014. Após uma leve queda para 20 pódios em 2018 -que não a tirou do top 5 do quadro–, a Holanda quer voltar a crescer em Pequim-2022 e já soma 15 conquistas. A atual edição dos Jogos se encerra no próximo domingo (20).

O desempenho baseado em especialização e alto índice de aproveitamento dos talentos esportivos chama a atenção do mundo todo, e o COB (Comitê Olímpico do Brasil) é uma das entidades nacionais que tem observado atentamente o trabalho dos rivais europeus.

“É um país em que miramos há algum tempo e usamos como exemplo de sucesso, pelas condições que eles têm. Um país muito pequeno, mas com aproveitamento de recursos humanos muito grande”, afirma o diretor de esportes do COB, Jorge Bichara.

O dirigente explica que o modelo holandês começou a ser estudado pelos brasileiros antes de Londres-2012. Naquela altura, foi criada uma relação de parceria e troca de informações entre os comitês olímpicos dos dois países. Eles fazem parte de um grupo com seis membros (Suécia, Suíça, Noruega e Bélgica são os outros) que compartilham experiências regularmente.

Essa aproximação levou o gerente de pesquisa e inovação de desempenho do Comitê Olímpico Holandês, Kamiel Maase, a ser um dos palestrantes convidados para a segunda edição do Congresso Olímpico Brasileiro. O evento, organizado pelo COB, acontecerá em Salvador nos dias 19 e 20 de março.

Mas afinal, o que torna o trabalho executado pela Holanda um exemplo a ser seguido?
É importante ressaltar que o comitê olímpico do país se dedica somente à nata do esporte de alto rendimento e que seu sucesso nos Jogos também depende de uma série de ações em diferentes esferas.

Elas começam na criação de uma infraestrutura acessível e de qualidade para a prática esportiva, passam pelos mecanismos de detecção de talentos e desenvolvimento deles até chegar aos ajustes finais para potencializar a performance.
Situado no fim dessa cadeia, o comitê criou há cerca de cinco anos seis áreas de liderança: medicina esportiva; comportamento; tecnologia; força e condicionamento; nutrição; pesquisa e inovação.

“Nosso foco é principalmente no alto nível. Se um atleta está no top 8, nós tentamos levá-lo ao alcance da medalha. Não temos como gastar todo o nosso dinheiro e nossa expertise em milhares de atletas”, explica Maase.

Além dos trunfos, essa política gera um desenvolvimento superespecializado em algumas modalidades. Nos Jogos de Verão, natação e ciclismo foram responsáveis por quase 40% das 322 medalhas conquistadas ao longo da história. A patinação de velocidade domina absoluta entre os esportes de inverno, com 131 medalhas do total de 145 (90%).

“É claro que há um grupo excelente de talentosos e bem treinados atletas que se saem bem e alcançam a sexta, sétima ou oitava posição. São grandes resultados, mas nos Jogos Olímpicos isso vale zero ponto. Então, temos uma política fortemente focada na cereja do nosso bolo”, completa o gerente.

Depois dos Jogos de Pequim-2008, o comitê holandês fez um corte expressivo nos programas incentivados pelas suas verbas e passou a priorizar um número menor de ações. Para Masse, essa é a principal razão para a melhora de desempenho daquela edição até as Olimpíadas de Tóquio.

Bichara aponta que o COB já possui uma divisão de áreas similar à dos europeus, mas vê diferenças importantes na forma de aplicação das verbas públicas. “Eles são um pouco mais radicais em relação à distribuição. Lá as modalidades sem chances de medalha não levam esse tipo de recurso”, afirma.
No Brasil, a principal fonte de financiamento do esporte olímpico são os repasses das loterias federais, garantidos por lei. No caso do COB, os valores são distribuídos entre 34 confederações olímpicas a partir de uma série de critérios que combinam desempenho esportivo e qualidade de gestão.

“Nós temos um sistema que eu acho mais adequado ao modelo socioeconômico brasileiro e de valorização do esporte: parte dos recursos das loterias é distribuído para todos os filiados e outra parte investido nos principais atletas, ou nas modalidades que tenham mais chances”, argumenta o dirigente.

Nem tudo se explica pelas decisões tomadas no topo da pirâmide. Também é determinante para os bons resultados holandeses o histórico de políticas públicas que valorizam a prática esportiva na população.
“Devo destacar a excelente infraestrutura que temos na Holanda”, diz Maase. “Em cada pequena cidade, vilarejo, você pode jogar futebol, tênis ou hóquei sobre a grama. Nosso país é pequeno e dá oportunidades para todos os jovens praticarem esportes.”

Outro ponto central é o investimento em ciência e tecnologia feito pelas entidades. A federação de patinação do país, por exemplo, recorreu há uma década a matemáticos da Universidade de Groningen para ajudar a estabelecer um modelo de seleção dos seus premiados patinadores de velocidade. O algoritmo indica quais provas e atletas reúnem maiores chances de conquistas nos principais eventos.

Maase reconhece ser difícil atribuir o peso de cada detalhe para os resultados vistos nos últimos Jogos.
“Muita coisa mudou. Eu não consigo dizer que, diante de tantas mudanças, nutrição tem 2% de influência. Isso é impossível. O que nós dizemos sempre é que o nosso objetivo é intervir realmente baseado em evidências”, afirma.

Congresso Olímpico acontece em março na Bahia O Congresso Olímpico Brasileiro terá a sua segunda edição em Salvador, nos dias 19 e 20 de março. Haverá palestras, exposições e discussões sobre o futuro do esporte. Entre os palestrantes estarão Kamiel Maase, o escritor norte-americano especialista em marketing Jonah Berger, o futurista alemão Gerd Leonhard e o técnico de vôlei tricampeão olímpico José Roberto Guimarães. Os ingressos e as informações sobre protocolos de saúde para a participação no evento estão disponíveis em https://congresso.cob.org.br/inscricao.
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