A Polícia Federal abriu nos últimos dias inquéritos de deportação contra diplomatas a serviço do ditador Nicolás Maduro no país, em mais um capítulo da série de tentativas de expulsar os chavistas do Brasil.
Em 13 de maio, a Superintendência da PF no Distrito Federal notificou cinco venezuelanos da instauração dos inquéritos e deu dez dias para que apresentem defesa técnica escrita. Estão na lista diplomatas que chefiaram a representação em Brasília e o general Manuel Antonio Barroso, adido militar.
De acordo com registro da PF, além do militar foram avisados da instauração de inquérito María del Pilar García, Ángel Gustavo Rodríguez, Freddy Efrain Meregote e Irene Auxiliadora Rondón.
Irene Rondón atualmente chefia a missão chavista e se encontrou com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na passagem dele por Brasília, no início de maio. Os processos de deportação são resultado de meses de disputa entre o governo Jair Bolsonaro e os diplomatas de Maduro.
Os atritos começaram com a decisão do líder brasileiro, em janeiro de 2019, de não reconhecer o governo Maduro e passar a considerar o opositor Juan Guaidó como presidente encarregado do país vizinho.
Ainda em 2019, Guaidó enviou ao Brasil uma enxuta equipe chefiada pela advogada María Teresa Belandria, que entregou suas cartas credenciais como embaixadora venezuelana. Na prática, criou-se uma situação inusitada: havia, em Brasília, duas equipes opostas de diplomatas venezuelanos.
Belandria passou a ser a única reconhecida pelo Itamaraty, mas os chavistas permaneceram no controle do edifício da embaixada e mantiveram forte interlocução com diplomatas de países aliados ao chavismo.
O momento mais tenso ocorreu durante a cúpula dos Brics em 2019, em Brasília, quando ativistas pró-Guaidó invadiram a embaixada. Houve tumulto, e o grupo, chefiado por um funcionário de Belandria, só deixou o prédio 12 horas depois, sob escolta policial.
Desde o início do governo Bolsonaro, o Itamaraty, então chefiado por Ernesto Araújo, atuou para que representantes de Maduro deixassem o país, numa operação delicada, já que também envolvia a situação de servidores brasileiros que naquele período estavam trabalhando na embaixada em Caracas.
Em uma das primeiras ações, o ministério deixou de emitir ou renovar as carteiras de registro diplomático -um tipo de documento de identidade- para os chavistas. Em abril de 2020, a pasta retirou seu pessoal da embaixada em Caracas e disse ter informado ao governo Maduro que esperava que os diplomatas chavistas no Brasil deixassem o país em 60 dias. Ato contínuo, o deputado Paulo Pimenta (PT-RS) solicitou ao STF (Supremo Tribunal Federal) que proibisse a expulsão.
O pedido foi atendido pelo ministro Luís Roberto Barroso, que bloqueou a expulsão enquanto durasse o estado de calamidade pública da Covid -formalmente encerrado em 31 de dezembro.
Os atuais inquéritos de deportação ocorrem após nova investida do Itamaraty, realizada em setembro do ano passado. Na ocasião, a chancelaria informou a Polícia Federal que os funcionários tinham sido declarados “personae non gratae”, o que na prática anula as imunidades e os privilégios diplomáticos.
Apenas em fevereiro a PF enviou ofícios aos representantes de Maduro afirmando que eles tinham 60 dias para regularizar seu status migratório como cidadãos comuns ou deveriam deixar o país. Vencido o prazo, a PF instaurou os inquéritos de deportação. A reportagem não conseguiu contato com os venezuelanos notificados para saber se eles tentaram regularizar a situação no país.
A PF disse que “não presta informações a respeito de processos administrativos instaurados em face de determinada pessoa em razão do sigilo legal que protege os titulares das informações”. Já o Itamaraty afirmou que a declaração dos chavistas como “personae non gratae” não conflita com a decisão do STF.
“No ofício enviado [à PF], o Ministério das Relações Exteriores informou o rol de indivíduos declarados ‘personae non gratae’ e esclareceu que, por decorrência da retirada dos privilégios e imunidades correspondentes, os indivíduos que optassem por permanecer em território brasileiro o fariam na qualidade de cidadãos estrangeiros comuns. Não há menção a deportação na comunicação enviada à PF.”