sábado, 23 novembro 2024

Jade Barbosa tem nova lesão e dá adeus à chance de ir à Olimpiada

O novo machucado, desta vez um entorse no joelho esquerdo, não se compara ao rompimento do ligamento cruzado da mesma articulação, mas da perna direita, em 2019 

Com o adiamento dos Jogos de Tóquio e a inesperada chance de voltar a competir pela classificação ao evento no Japão fez com que Jade reavaliasse seu futuro (Foto: COB)

Esta reportagem estava pronta para contar a seguinte história: após uma grave lesão no joelho direito em 2019 tirar de Jade Barbosa a chance de disputar os Jogos Olímpicos de Tóquio, anteriormente previstos para julho de 2020, a ginasta brasileira ganhou com o adiamento do evento para 2021 uma nova e derradeira oportunidade de ir à Olimpíada.

No Pan-Americano de Ginástica, que começa nesta sexta-feira (4), ela iria brigar por essa inesperada vaga. Iria, pois uma nova contusão, confirmada nesta manhã, apagou a chama da esperança de ainda ir ao Japão. O problema se deu no treino de quinta (3), um dia depois de conceder entrevista à reportagem.

O papo pré-lesão com a reportagem revelou uma novidade importante para o esporte brasileiro: Jade mudou o plano de se aposentar após os Jogos de Tóquio. A ideia de ser mãe, por exemplo, foi postergada para outro momento, somente depois do término do próximo ciclo olímpico.

O novo machucado, desta vez um entorse no joelho esquerdo, não se compara ao rompimento do ligamento cruzado da mesma articulação, mas da perna direita, em 2019. Agora, ela não deve passar por uma cirurgia. É um novo processo de luto que começa em sua vida, mas que reforça o seu objetivo maior: o de classificar a seleção brasileira novamente para uma Olimpíada, em 2024.

Em 2019, a equipe brasileira feminina estava pronta para buscar, no Mundial de Stuttgart (Alemanha), sua quinta vaga seguida para a competição por equipes da ginástica artística. Mas o desfecho foi triste.

“O Mundial de Stuttgart foi muito pesado. Sofremos, perdemos a Rebeca [Andrade, por lesão], a Carol [Pedro, também por lesão], depois a Jade. Cada menina que perdíamos era um luto. Lidar com esse luto foi novo, não só pela cirurgia, mas porque o Brasil não conseguiu se classificar [para os Jogos]”, contou à reportagem.

Esta e todas as próximas citações de Jade são da entrevista da última quarta, que aconteceu por videoconferência.

No Mundial de 2019, a desfalcada equipe feminina brasileira não chegou sequer à final e deu adeus às chances olímpicas. No individual, apenas Flávia Saraiva conseguiu a vaga em Tóquio.

A colega Rebeca Andrade terá sua última chance ir ao Japão neste Pan de Ginástica. A competição feminina, que começa neste sábado (5), classifica as duas melhores ginastas no individual geral, mas com limite de uma por país.

Prestes a completar 30 anos, em 1º de julho, Jade Barbosa esperava também brigar por essa vaga. Mas seus planos mudaram. Começará, a partir de agora, a se reerguer. Mais uma vez.

“Nunca me questiono se vou voltar de uma lesão. Porque você vai aguentar a recuperação, mas ficar forte de novo aqui dentro [aponta para a própria cabeça] é o mais complicado. Suportar o processo todo mentalmente cansa muito e, com mais idade, cansa mais. Você reavalia se está disposta a passar por tudo, se quer isso mais uma vez”, contou antes da nova lesão.

Parte importante da força mental da ginasta vem justamente do luto, processo que ela conhece desde quando perdeu sua mãe, aos 16.

“O luto é uma coisa da qual nós não estamos imunes, vamos passar muitas vezes na vida. Não vejo outra saída para se reerguer. Se você não passa por ele, não entende o que é uma baixa, você não consegue se levantar; se você não vive os sentimentos, eles voltam para te perturbar”, explicou.

“Faz parte de quando você perde algo, existe um vazio, uma saudade. Aprendi isso não só com a perda da minha mãe, mas com a perda de inúmeras pessoas, de oportunidades. Isto o esporte também me ensinou: não se cobrar tanto, controlar o que puder e viver dia após dia”, completou.

Após a cirurgia, em 2019, Jade passou meses na fisioterapia. Quando estava prestes a retomar atividades no ginásio, veio a pandemia. E mais um luto, esse diferente de todos os outros, coletivo, pelas vidas perdidas em todo o mundo, que já somam quase 3,7 milhões.

Seu apoio foi a família. Conta que nunca, desde criança, tinha conseguido passar uma semana inteira almoçando e jantando com seu pai e seu irmão, todos os dias, sentada, tendo longas conversas com eles. Até desenhar, como fazia nos tempos de escola, voltou a fazer.

Com o adiamento dos Jogos de Tóquio e a inesperada chance de voltar a competir pela classificação ao evento no Japão fez com que ela reavaliasse seu futuro.

“Meu plano [antes da pandemia] era ir para Tóquio, depois ao Mundial de 2021 e aí falar ‘Jade, agora deu, vamos ter uma vida mais tranquila’. Aí ser mãe, trabalhar com gestão… E agora meio que tudo bagunçou. Pelo jeito vou ter que tentar Paris [Jogos Olímpicos de 2024], porque agora parece muito próximo!”, revelou.

Com a nova reviravolta, agora motivada pela lesão no joelho esquerdo, às vésperas do Pan, Jade e pessoas próximas focam numa redenção na França, daqui a três anos.

Mais experiente das atuais atletas da seleção, a ginasta quer liderar jovens como Flávia Saraiva e Rebeca Andrade na busca para recolocar a equipe de ginástica do país outra vez no páreo –em Tóquio, o Brasil não terá o time feminino na disputa pela primeira vez desde Sidney-2000.

Apesar das mudanças nos planos, ela também não esconde a vontade de ainda ter filhos e de trabalhar nos bastidores do esporte. Atualmente. faz faculdade de marketing. E comemora que atletas busquem diferentes formações para ganhar espaço na política esportiva.

Em 16 anos de carreira, lembra-se que muito mudou na ginástica. Antes, por exemplo, as atletas controlavam sua forma física pelo peso, o que forçava dietas não saudáveis para emagrecer, nas quais nem beber água durante os treinos era permitido. Hoje, o controle é pela gordura corporal, e a hidratação é liberada.

“Venho de uma geração na qual as meninas me ensinaram a lutar por melhorias”, afirmou.

Agora, diz que as denúncias de abusos, assédios e preconceitos no ambiente da ginástica são sinais de transformação em uma “cultura mundial” do esporte, do qual quer ser gestora.

Mas depois. A Jade de hoje só pensa em Paris.

E, se nada mais mudar em seus planos, a brasileira poderá enfim ter a vida mais tranquila que deseja, com filhos, mais perto da família, mas nunca muito distante da ginástica.

“Acho que ainda estou tentando entender tudo isso [que passei]. Posso dizer que são muitas emoções”, completou 

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