Levantamento mostra que o volume de doses a serem aplicadas neste mês é maior do que a previsão de entrega da vacina
Ao diminuir o intervalo entre as vacinas da AstraZeneca, o Ministério da Saúde corre o risco de deixar ao menos 3 milhões de pessoas com a segunda dose atrasada no mês de setembro. Alguns estados têm cobrado do governo federal o envio de novos lotes para o início da antecipação, mas a assessoria da pasta diz que a resposta depende de orientações ainda sem data de divulgação.
Para barrar o avanço da variante delta do novo coronavírus, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, anunciou na semana passada que, a partir do dia 15 de setembro, o intervalo entre as doses das vacinas da Pfizer e da AstraZeneca, hoje de 12 semanas, cairá para 8 semanas, como no Reino Unido.
A notícia é boa principalmente para 4,4 milhões de brasileiros, que receberiam a segunda dose da AstraZeneca apenas em outubro. Com a mudança, eles já poderão pedir a segunda injeção em setembro. O problema é que 17,8 milhões de brasileiros completam o ciclo de 12 semanas de imunização com a vacina no mesmo mês e também precisarão da segunda dose em setembro.
Essas 22,2 milhões de doses necessárias para completar a imunização neste mês é bem superior aos 18 milhões de entregas previstas pela Fiocruz e ao estoque de pouco mais de 1,1 milhão nos estados, segundo respostas das secretarias de Saúde das 27 unidades federativas.
A falta de doses pode ser ainda maior e passar de 3,2 milhões para 9,1 milhões se quem estiver com a razão for o governo federal, que espera receber da Fiocruz não mais do que 12 milhões de doses este mês, ou seja, cerca de 6 milhões a menos do que o previsto pelo próprio laboratório.
No mês passado, já havia alerta para a possibilidade de faltar 3,1 milhões de doses da AstraZeneca em agosto e setembro considerando as 12 semanas entre as doses. Com o intervalo mais curto, o cenário só não será pior porque a Fiocruz ampliou a previsão de entrega para este mês.
Estados cobram vacinas
Alguns estados que fazem oposição ao governo federal cobraram o envio das vacinas adicionais. O Rio Grande do Sul afirma que a segunda dose da AstraZeneca foi distribuída “em quantidade e prazo suficientes para atender às 12 semanas de intervalo na aplicação”. “Mais informações sobre disponibilidade de doses devem ser buscadas junto ao Ministério da Saúde”, disse em nota.
A secretaria da Bahia afirmou que, “embora o Ministério da Saúde tenha anunciado a antecipação da segunda dose de 12 para 8 semanas, a decisão ainda não foi efetivada”. “A redução [do prazo] implicaria em remessas extras, fato que não ocorreu até o momento.”
O estado pediu mais vacinas ao Ministério da Saúde para antecipar a aplicação da segunda dose da Pfizer e AstraZeneca para o período de oito semanas após a primeira.
Já o governo do Rio de Janeiro, aliado federal, se prepara para a falta de doses. O estado foi o único que publicou uma nota técnica autorizando “a intercambialidade de vacinas caso o estado do Rio de Janeiro não receba doses do imunizante Oxford/AstraZeneca em quantidade suficiente para completar o esquema vacinal de quem já recebeu a primeira dose”.
Nesse caso, essas pessoas poderão receber a segunda dose com o imunizante da Pfizer. As outras unidades federativas negaram a intenção de substituir a AstraZeneca pela Pfizer até que o Ministério da Saúde dê o aval.
Questionada sobre quando e como pretende adquirir e distribuir as doses antecipadas para setembro, a assessoria de imprensa do Ministério da Saúde afirmou que “trabalha em uma nota técnica que será divulgada em breve”.
“O indivíduo não vai perder a imunidade constituída após a primeira dose”, afirmou Isabella Ballalai, vice-presidente da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações). “A segunda dose é um reforço, uma forma de estimular o corpo a produzir um número ainda maior de anticorpos.”
“Mas apenas testando essas pessoas para saber se isso vai acontecer”, diz o infectologista da Fundação de Medicina Tropical de Manaus Noaldo Lucena. “A bula recomenda aplicar a segunda injeção de AstraZeneca em no máximo três meses.”
Fora dos prazos, não dá para garantir imunização eficiente, já que nenhuma vacina é 100% eficaz mesmo seguindo a bula.