sábado, 23 novembro 2024

Auditor nega conhecer Bolsonaro e culpa o pai por compartilhar estudo falso

Alexandre Marques reforçou que o rascunho do relatório que enviou ao pai não possuía a identificação do TCU no cabeçalho, tampouco trechos grifados em amarelo, como circulou nas redes bolsonaristas  

Alexandre Marques presta depoimento à CPI da Covid – Jefferson Rudy/Agência Senado

O auditor do TCU (Tribunal de Contas da União) Alexandre Figueiredo Costa Silva Marques, apontado como autor de um estudo falso sobre mortes na pandemia, negou nesta terça-feira (17), em depoimento à CPI da Covid, ter produzido o material para favorecer deliberadamente o presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

O servidor negou ter “relação” com o governante e culpou o pai, o coronel da reserva Ricardo Silva Marques, por compartilhar indevidamente os dados com o chefe do Executivo federal.

Marques explicou que o pai foi contemporâneo de Bolsonaro na Aman (Academia Militar das Agulhas Negras), no Rio de Janeiro, e trabalhou com o capitão reformado, hoje presidente da República, nas fileiras do Exército. Esse seria o contexto de proximidade entre os dois.

Na versão do depoente, o pai recebeu o arquivo — um esboço de relatório — em 6 de junho e, no mesmo dia, teria encaminhado ao governante por meio do WhatsApp.

Na manhã do seguinte, em 7 de junho, Bolsonaro citou o estudo falso para afirmar a apoiadores que metade das mortes de covid em 2020 teria ocorrido, na verdade, em função de outras doenças.

O relatório, no entanto, era “preliminar” e utilizava dados que, de acordo com o próprio TCU e com o autor do material, não permitem chegar a tal conclusão. O Tribunal confirmou posteriormente que não se tratava de um documento oficial e negou a veracidade do conteúdo.

“Eu produzi um arquivo em Word com algumas informações públicas, mas não era conclusivo esse arquivo. Como eu falei, ele foi feito para gerar uma discussão dentro da equipe de auditoria. Não havia uma conclusão nesse sentido”, destacou Marques.

O auditor também informou aos senadores que a versão original do arquivo, enviada ao pai em 6 de junho, não possuía a identificação do TCU no cabeçalho, tampouco trechos grifados em amarelo — tal como consta em PDF que viralizou entre apoiadores do presidente Bolsonaro nas redes sociais.

Senadores da oposição sustentam a ideia de que o arquivo produzido em Word — e compartilhado originalmente sem edição — teria sido “manipulado” pelo Palácio do Planalto, de modo a supostamente corroborar argumentos defendidos pelo presidente em Bolsonaro em suas lives.

“(…) Eu não vi o texto que o presidente da República apresentou. Eu recebi, via WhatsApp, um arquivo em PDF que viralizou, e nesse arquivo em PDF havia uns destaques grifados em amarelo e a inscrição Tribunal de Contas da União na parte superior”, destacou o depoente.

Indagado pelos membros da CPI se sabia as circunstâncias e a origem de uma possível adulteração, Marques esclareceu que, de acordo com o pai, o arquivo havia sido compartilhado em seu formato original. “O meu pai me falou que repassou o mesmo arquivo em Word. Agora, onde foi feita essa alteração, realmente não tenho como afirmar.”

‘Relatório paralelo’

O estudo falso que é objeto do depoimento de hoje na CPI indicava uma suposta “supernotificação” e sustentava a ideia de que metade dos óbitos registrados em 2020 no país seria em decorrência de outros motivos não relacionados ao coronavírus.

A pesquisa feita por Marques deu origem a um “relatório paralelo”, segundo investigação feita pela Polícia Federal a pedido do próprio TCU.

Após a repercussão do caso, o órgão de controle desmentiu publicamente o conteúdo de autoria do servidor e o afastou até que seja concluído processo administrativo. Morador de Jundiaí (SP), ele também foi impedido de entrar nas dependências do TCU, em Brasília.

Presidente Jair Bolsonaro citou a apoiadores o documento inserido no sistema do TCU que contestaria notificações de mortes por Covid-19 no país – Captura de vídeo

Na sindicância interna do tribunal, Marques declarou que o material teria sido “editado” e que divulgá-lo era uma “irresponsabilidade”. As informações foram veiculadas em reportagem da TV Globo.

De acordo com as investigações, o documento foi produzido por Marques de forma clandestina com base em informações coletadas no sistema do TCU, mas que levam a conclusões distorcidas e sem fundamentação.

Bolsonaro afirmou que o tribunal comprovou supernotificação de mortes pela covid-19 para beneficiar governadores interessados em obter mais recursos públicos para combater a pandemia. O TCU desmentiu o presidente no mesmo dia.

Em seu perfil no Facebook, o auditor já publicou vários comentários sobre a pandemia, endossando sobretudo a narrativa de Bolsonaro, como a recomendação do tratamento precoce com medicamentos sem eficácia contra a covid-19.

Em 2020, também nas redes sociais, ele havia externado pensamento cético em relação aos números da doença. No entanto, à época, seu alvo de crítica era a subnotificação de infectados.

Diante da notícia de que o estado de São Paulo passaria a notificar apenas os casos graves da doença, Alexandre escreveu em publicação de 20 de março de 2020: “Com isso, não podemos mais saber a real taxa de letalidade da doença, pois os casos com sintomatologia leve não são mais notificados”.

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