sábado, 20 abril 2024

Coronel citado no caso Davati nega propina e usa direito ao silêncio na CPI

Hélio Bruno de Almeida afirma nunca ter presenciado oferta ou cobrança de propina durante as conversas do Ministério da Saúde com a Davati
Tenente-coronel da reserva e presidente do Instituto Força Brasil, Hélcio Bruno de Almeida – Jefferson Rudy/Agência Senado

O tenente-coronel da reserva e presidente do Instituto Força Brasil, Hélcio Bruno de Almeida, afirmou nesta terça-feira (10), em depoimento à CPI da Covid, nunca ter presenciado oferta ou cobrança de propina durante as conversas do Ministério da Saúde com a Davati — empresa americana que tentou vender, entre fevereiro e março deste ano, um suposto lote de 400 milhões de doses da AstraZeneca.

Foi exatamente nesta negociação que, segundo o policial Luiz Paulo Dominghetti, que atuava como revendedor informal da Davati, houve uma sugestão de propina por parte do ex-diretor de logística do ministério Roberto Ferreira Dias. O ex-servidor nega ter cometido qualquer irregularidade. O governo argumenta que o diálogo com a Davati nunca passou de tratativas iniciais.

“Jamais participei de qualquer reunião ou encontro no qual teria sido oferecida ou solicitada vantagem indevida por quem quer que seja. E também informo que jamais estive presente em qualquer jantar com o senhor Luiz Paulo Dominghetti, muito menos naquele que teria ocorrido em 25 de fevereiro. Até porque, nessa data, eu sequer o conhecia.”

A declaração de Hélcio Bruno ocorreu logo na abertura do depoimento, ocasião em que o militar leu um discurso redigido previamente. Na sequência, ele informou aos parlamentares da comissão que faria uso de decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) que garante o direito ao silêncio em caso de questionamentos que possam resultar em autoincriminação.

Ficou calado

O depoente se calou em relação a indagações sobre a natureza das atribuições do Instituto Força Brasil e também rejeitou dar respostas sobre especificidades na relação com os interlocutores. Mas acolheu questionamentos que, de acordo com o seu entendimento e com a avaliação de seus advogados, estavam fora do escopo da decisão do STF.

Por mais de uma vez, parlamentares do colegiado alertaram que Hélcio Bruno não poderia se negar a responder questionamentos mais fundamentais, como, por exemplo, se o Instituto Força Brasil teria atuado no sentido de intermediar negócios de vacinas.

As declarações do coronel na abertura da oitiva contrariam versões apresentadas por depoentes anteriores em relação à suposta proximidade de Hélcio Bruno com outros militares que ocupavam cargos de comando dentro do Ministério da Saúde na gestão do ex-ministro Eduardo Pazuello (demitido em março deste ano).

Hélcio Bruno negou ter relação de amizade ou convivência prévia com o ex-secretário-executivo da pasta, o coronel Élcio Franco, considerado o “02” de Pazuello.

“Jamais almoçamos ou jantamos juntos. Não fomos contemporâneos na Aman [Academia Militar das Agulhas Negras] e não servimos juntos”, destacou.

À CPI, o representante oficial da Davati, Cristiano Carvalho, afirmou que Hélcio teria sido o responsável por conseguir uma reunião do grupo com o secretário-executivo a pedido do reverendo Amilton Gomes de Paula, diretor da entidade religiosa Senah (Secretaria Nacional de Assuntos Humanitários).

O encontro ocorreu em 12 de março deste ano e contou, segundo Carvalho, além dele próprio, com Franco, Hélcio, Amilton, Dominghetti, dois coronéis da cúpula do ministério — Marcelo Bento Pires e Cleverson Boechat.

Já o reverendo Amilton confirmou na CPI ter atuado como um dos elos para que a Davati buscasse negociar com o governo federal.

Segundo Carvalho, ele e Dominghetti foram buscados no aeroporto de Brasília por um advogado do Instituto Força Brasil com alguns funcionários da Senah e então levados à sede do Força Brasil.

O instituto se declara “sem fins lucrativos” com o objetivo de “fazer frente à hegemonia da esquerda como participante do poder, bem assim ao crime organizado nas instituições”.

Para Carvalho, o Instituto Força Brasil foi o “braço” que a Senah usou para chegar “frente a frente” com Élcio Franco. No final das contas, nenhum contrato foi fechado, mas a CPI apura o papel dos intermediários no caso e, especialmente, se houve mesmo pedido de propina por parte de Dias.

Reunião do dia 12 de março

Hélcio confirmou ter participado da reunião no ministério em 12 de março e buscou explicar que, na ocasião, decidiu “compartilhar a agenda” com a Davati porque havia interesse em discutir com o governo a possibilidade de acelerar tratativas em favor da autorização para que o setor privado pudesse adquirir vacinas.

Membros da CPI alertaram que Hélcio Bruno não poderia se negar a responder questionamentos mais fundamentais – Jefferson Rudy/Agência Senado

De acordo com o depoente, a reunião do dia 12 de março já estava agendada antes que ele tomasse conhecimento das pretensões da Davati.

À época, ele teria sido contatado pelo reverendo Amilton (que atuava em favor da Davati) para que, no encontro do IFB com o Ministério da Saúde, os representantes da empresa americana fossem incluídos na relação de participantes.

“Acontece que, no dia 9 de março, quando a reunião no ministério já havia sido devidamente agendada e confirmada para o dia 12 de março, às 10 horas, o revendendo Amilton, pessoa que até então eu não conhecia compareceu ao IFB. No encontro, o reverendo Amilton informou que uma empresa de nome da Davati pretendia oferecer uma grande oferta de vacinas ao Ministério da Saúde, mas que precisavam esclarecer ao ministério a forma com que poderiam disponibilizar as vacinas pois, embora não fossem representantes diretos do laboratório produtor das vacinas, eles teriam uma alocação de doses”, disse.

“Por isso, o senhor Amilton aventou a possibilidade de o IFB compartilhar sua agenda no Ministério da Saúde com os representantes de tal empresa para que eles pudessem explicar ao ministério as condições de sua oferta de vacinas.”

Na versão de Hélcio, este teria sido o único episódio no qual ele teve contato direto com Cristiano Carvalho e Luiz Paulo Dominghetti.

Davati

Durante a reunião, segundo ele, que teria durado cerca de 20 minutos, a Davati não teria conseguido comprovar ao ministério que possuía autorização para negociar em nome da AstraZeneca.

“No encontro, que ocorreu rapidamente – aproximadamente 20 minutos -, e no qual o IFB informou que estava à disposição para discutir e encontrar medidas ou aperfeiçoamentos normativos que pudessem acelerar a vacinação privada no País, o Ministério da Saúde solicitou à Davati a apresentação de uma carta de representação do laboratório fabricante, no caso, AstraZeneca, ou das informações referentes aos lotes das vacinas.”

“E, assim, ante a ausência de apresentação de tais documentos, soubemos que o assunto se deu por encerrado no Ministério da Saúde.”

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