A chuva forte que caiu sobre o Rio de Janeiro deixou a cidade em estágio de atenção e afetou o carnaval no Sambódromo. O temporal atrasou o início do desfile e pôs à prova as escolas. O desfile do Grupo Especial, programado para começar ontem (3) às 21h15, teve início às 22h. A pista molhada desafiou as coreografias preparadas para a avenida.
A primeira escola a entrar na avenida foi a Império Serrano, com um enredo sobre a vida que apostou numa música consagrada como samba-enredo: “O que é, o que é”, de Gonzaguinha. A escolha despertou polêmica, mas trouxe para a avenida uma música que estava na ponta da língua do público.
ENREDO
O desfile da Império Serrano contou desde o início da vida, o nascimento, retratado na comissão de frente. A efemeridade e o caráter passageiro da vida foram bem marcados por meio de relógios e ampulhetas nas alegorias.
Os destaques foram o carro que reproduz o famoso Deus de Michelangelo na Capela Sistina criando Adão em “um sopro do criador”, como canta Gonzaguinha.
O enredo também trouxe a religião, as lutas, o aprendizado e o desejo de uma vida de paz, saúde e sorte, seguindo a letra da música que virou samba-enredo.
INTERPRETAÇÃO
Na história em que “ninguém quer a morte”, como cantam os versos, coube a atriz Dill Costa, 63 anos, interpretar esse papel. Com uma fantasia de tons escuros, ela veio como destaque no 4º carro da escola, que retrata a vida como um labirinto entre o abismo e o paraíso.
“Represento esse momento tão difícil que o povo brasileiro está passando, com tantas tragédias e tantas mortes. Venho representando esse sentimento, o que é muito difícil. Mas faz parte da vida”, disse a atriz e cantora.
A presidente da escola, Vera Lúcia Correa, defendeu que o samba de Gonzaguinha pegou e foi cantado pelos componentes e torcedores. O temporal que caiu antes do desfile, brincou ela, “não passou de uma limpeza para o Império passar”.
“Foi uma superação esse carnaval, depois de tantas dificuldades. Hoje a Império Serrano mostrou que tem chão e que tem garra. Mostramos que sambista enverga, mas não quebra”.
VIRA
A segunda escola da noite trouxe seres mágicos, monstros e histórias fantásticas para a avenida. Com o enredo de “Viraviradouro”, a agremiação de Niterói abusou das transformações, coreografias e engenhocas para
surpreender o público na avenida.
Os recursos são uma assinatura do carnavalesco Paulo Barros, que levou desde bruxas e mortos-vivos até contos de fadas como a Bela e Fera para o sambódromo.
A comissão de frente foi um dos destaques. Diante do público, príncipes se transformavam em sapos com a magia lançada por bruxas e seus caldeirões.
SUSTO
O coreógrafo Alex Neoral disse que o temporal horas antes do desfile deu um susto em seus dançarinos e a pista molhada não ajudou a executar os passos ensaiados.
“O importante foi que a gente viu a reação do público. Viu o público gritando do início ao fim. E aí a gente viu que a gente conseguiu nosso objetivo, que era passar essa mensagem de mágica e de alegria”, ressaltou.
FÊNIX
A Viradouro voltou neste ano ao Grupo Especial do Rio de Janeiro e seu desfile terminou com um animal mitológico que representa seu desejo de renascer: uma fênix. Segundo a lenda, a ave é capaz de ressurgir das
cinzas depois de cair e esse é o desejo do carnavalesco Paulo Barros ao voltar para a Viradouro.
“A Viradouro é uma escola que tem um perfil grande, um perfil forte. É uma escola que passou pelo grupo de acesso, mas tem o coração e a alma do Grupo Especial”, disse Paulo Barros, que se considera sempre otimista. “O resultado não depende da gente. A gente fez o nosso, mas a gente não domina o resultado.”
INTERNET
Referências à internet, drones, carros alegóricos cheios de luzes e irreverência marcaram o desfile da Grande Rio, a terceira escola que entrou na Marquês de Sapucaí, já na madrugada de segunda. A agremiação brincou com a falta de educação e provocou o público falando do jeitinho brasileiro.
Imprudência no trânsito, compartilhamento de fake news, pichações, furto de internet e outros deslizes apareceram no desfile da escola em fantasias e alegorias bem humoradas. O desfile apontou os defeitos e sugeriu a educação como a solução para um país com menos ignorância.
O presidente da Grande Rio, Milton Abreu do Nascimento, considera que a escola teve sucesso em passar sua mensagem na avenida. “A Grande Rio passou do jeito que quis, levantando o público. Foi um dos melhores desfiles dos últimos tempos da escola”, comemorou.
ESTANDARTE
O estandarte da escola foi carregado por uma porta-bandeira iniciante, Taciana Couto, que enfrentou uma Sapucaí ainda molhada em sua estreia. Os passos da dança incluíam suportar o peso dos mais de 60 quilos de sua fantasia – mais do que seus 54 quilos.
“Foi um pouquinho complicado, mas a gente conseguiu levar com garra e com emoção, mesmo com a pista molhada”, disse Taciana Couto.