segunda-feira, 20 maio 2024

Setembro Amarelo: um olhar cada vez mais necessário sobre o suicídio

Iniciado em 2015 pelo CVV (Centro de Valorização da Vida), o Setembro Amarelo é uma campanha de prevenção ao suicídio que tem se espalhado pelo País e, gradualmente, ganhado espaço em diversos municípios brasileiros. Antes tema praticamente proibido, o suicídio já não passa mais batido pelas pautas de políticas públicas.
Seja pela abordagem do tema pela cultura pop, como a série “13 Reasons Why”, ou por correntes de internet que incentivam o suicídio, fato é que profissionais apontam que a discussão sobre esse problema não pode ficar restrita aos casos de celebridades que decidem tirar a própria vida.
Até agosto deste ano, em 10 cidades da RMC (Região Metropolitana de Campinas), 66 pessoas cometeram suicídio. Em 2017 foram 112 casos ao longo do ano, enquanto 2016 registrou 154. Os dados são da Delegacia Seccional de Americana e da Secretaria de Saúde de Campinas. As cidades em questão são: Artur Nogueira, Americana, Campinas, Cosmópolis, Engenheiro Coelho, Hortolândia, Monte Mor, Nova Odessa, Santa Bárbara d’Oeste e Sumaré.
A nível nacional, segundo dados do Ministério da Saúde, cerca de 11 mil pessoas tiram a vida no Brasil a cada ano. O suicídio é a segunda causa de morte no planeta entre jovens de 15 a 29 anos, perdendo apenas para a violência.
Um dos casos que saiu da esfera privada e invadiu a rotina das pessoas ocorreu no dia 19 de junho, em Americana. Um homem de 38 anos realizou ao menos dez disparos para cima e se suicidou na Avenida Campos Salles, em Americana. Moradores e comerciantes da via se trancaram dentro de seus imóveis durante a movimentação, que levou cerca de 20 minutos. A vítima era agente de apoio socioeducativo da Fundação Casa de Limeira. Segundo a PM (Polícia Militar), familiares teriam apontado que o homem estava com depressão. Ele deixou uma esposa e dois filhos.
Mais recentemente, no dia 29 de agosto, a GCM (Guarda Civil Municipal) de Paulínia resgatou uma adolescente de 14 anos que estava em cima do portal de entrada da cidade. A adolescente estava com um uniforme de uma escola que fica nas proximidades do portal. Contudo, como ela não se comunicou com os guardas, ainda era desconhecida a motivação.
AÇÕES
Ao longo deste mês, a Prefeitura de Santa Bárbara d’Oeste realiza uma série de ações de sensibilização e prevenção ao suicídio. As UBSs (Unidades Básicas de Saúde) e demais setores da Secretaria de Saúde contam com decoração especial e Salas de Espera Ativa voltadas ao tema.
Já no dia 14 será realizado um evento na Praça Coronel Luiz Alves (Central) com apresentações culturais e atividades de sensibilização. A ação será coordenada pelo NES (Núcleo de Educação em Saúde) e Departamento de Saúde Mental.
“Trazer o tema para discussão é fundamental, porque entendemos que muitas vidas podem deixar de ser perdidas por meio de simples gestos, como ouvir, falar, buscar ajuda. Muitas vezes dividir o problema, sentindo-se acolhido, pode impedir o pior e evitar uma atitude extrema”, avaliou a secretária de Saúde de Santa Bárbara, Lucimeire Cristina Coelho Rocha.

 
EVENTOS DEBATEM O TEMA

Já a Sociedade de Medicina e Cirurgia de Campinas realiza entre os dias 10 e 16 de setembro encontros, palestras, debates e uma caminhada de conscientização. A programação tem apoio da Associação Brasileira de Psiquiatria, PUC Campinas, Liga da Psiquiatria e Saúde Mental da Unicamp.
A programação completa pode ser conferida no site www.smcc.com.br.
Na sessão da última terça-feira, a Câmara de Sumaré aprovou por unanimidade o projeto de lei nº 149/18 do vereador Edgardo Cabral (PRB), que propõe a criação da Semana Municipal de Prevenção ao Suicídio no Calendário Oficial de Eventos do município a ser realizada na semana que inclui o dia 10 de setembro, que é o Dia Mundial da Prevenção ao Suicídio.
“O tabu sobre o tema do suicídio é um dos principais obstáculos no combate desse grave problema de saúde pública. A reversão desse quadro será possível por meio de ações que promovam o debate do assunto na sociedade, com o envolvimento de entidades estatais, sociedades de classes e cidadãos interessados ou envolvidos na problemática, entre outros atores relevantes no combate ao suicídio”, comentou.
Ainda no dia 10 acontece o III Encontro sobre Prevenção do Suicídio, na Alesp (Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo). O encontro contará com a presença de especialistas e depoimentos de pessoas que perderam familiares e também de quem tentou o suicídio.

 
Doença psiquiátrica é maior causa

A existência de uma doença psiquiátrica está presente em 90% das pessoas que cometem suicídio, segundo o médico hebiatra do Instituto da Criança do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo, Benito Lourenço. Coordenador do Curso de Medicina do Adolescente do Centro de Apoio ao Ensino e Pesquisa em Pediatria, o especialista afirma que é necessário minimizar os cenários que possam levar ao suicídio.
“Os dois pontos mais importantes na avalição de uma pessoa, de forma geral, e em particular do adolescente suicida, é a coexistência de uma doença psiquiátrica em mais de 90% dos casos, e tentativas pregressas. Quando você vai fazer um histórico psicológico, você identifica um transtorno de depressão, ansiedade, drogas, álcool. De alguma forma o adolescente sinaliza pelo sofrimento psíquico o que está passando. Precisa ter um olhar atento a esse sofrimento”, orientou.
O especialista aponta que existem grupos que “fatidicamente” têm mais risco na adolescência, como a população LGBT, devido ao preconceito que sofrem, e aqueles que são vítimas de bullying na escola ou cyberbullying na internet.
“Suicídio não é 100% evitável. Ele acontece, sempre aconteceu, está acontecendo e vai continuar acontecendo. Sabemos que muitos adolescentes que estão inclusive em atenção psiquiátrica em consultórios, mesmo assim tentam, planejam e conseguem se matar. O que podemos tentar é minimizar esse número, mas nunca vamos conseguir zerar”, lamentou Lourenço.
Na visão do médico, existem diversas abordagens equivocadas na hora de conversar sobre o problema com uma pessoa que está passando por esse nível de sofrimento. “O primeiro erro é falar que vai ficar tudo bem. É difícil, muitas vezes é algo crônico. Se quiser dividir algo com a pessoa, discuta os problemas e não as soluções. (…) Outra ideia é evitar falar em nova chance para quem sobreviveu a uma tentativa de suicídio. Isso machuca ainda mais porque ele queria se matar naquele momento e falhou. Falta de amor, de Deus, de espiritualidade.. evitar esse tipo de conversa. Pergunte como vai, mas querendo ouvir, olho no olho. Esteja lá para criar um vínculo que possa abrir espaço para a pessoa falar”, orientou.

 
Homens são maioria dos casos

Em agosto ocorreu o Fórum Permanente sobre suicídio na Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) para debater o problema a nível nacional e mundial. De acordo com a professora do Nepo (Núcleo de Estudos de População “Elza Berquó), Margareth Arilha, a universidade está abrindo uma área de estudos qualitativos sobre o tema.
“Suicídio é um fenômeno, por enquanto, essencialmente masculino. Único lugar que essa razão se inverte, ou seja, que a maior parte (dos casos) é de mulheres é na China, em áreas rurais do país. Estamos abrindo um diálogo com uma universidade chinesa para entender esse fenômeno reforçado pela questão de gênero”, explicou Margareth.
Um outro estudo aponta que as tentativas de suicídio são, em geral, maiores entre mulheres do que entre homens. Segundo a professora, uma coisa que fica clara é que existe uma associação entre as mulheres que tentam o suicídio e a presença da violência sexual na sua história de vida.
“Existe essa associação estipulada. É uma coisa super importante porque vai mostrando como o suicídio é um fenômeno complexo e não pode ser associado apenas a uma coisa. No mínimo temos que analisar o motivo dessa depressão. (…) Como as instituições estão respondendo a esse pedido de ajuda, nas escolas, nos serviços de saúde, no setor privado”, questiona.
Especificamente em Campinas, a professora doutora do Nepo, Tirza Aidar, analisou a evolução dos casos em dois períodos distintos: de 1996 até 2004, e de 2006 a 2014.
“Suicídios de mulheres teve um salto muito grande no grupo etário entre 30 e 44 anos. A taxa de mortalidade por suicídio partiu de 1,5 a cada 100 mil habitantes para quase 4. Já nos homens todos os grupos cresceram, entre jovens também, mas o maior salto foi dos homens mais velho, entre 60 e 74 anos.”

 

Receba as notícias do Todo Dia no seu e-mail
Captcha obrigatório

Veja Também

Veja Também