quarta-feira, 27 novembro 2024

Tolentino nega ser sócio do FIB Bank e relata ‘encontros’ com Bolsonaro

Advogado e dono da Rede Brasil de Televisão presta depoimento à CPI da Covid  

Marcos Tolentino negou ser o dono FIB Bank durante depoimento – Edilson Rodrigues/Agência Senado

O advogado e dono da Rede Brasil de Televisão, Marcos Tolentino, negou nesta terça-feira (14), em depoimento à CPI da Covid, ser um “sócio oculto” do FIB Bank — empresa que atuou como fiadora da negociação de compra da vacina indiana Covaxin pelo Ministério da Saúde. “Eu, Marcos Tolentino, afirmo que não possuo qualquer participação na sociedade, não sou sócio da empresa como veiculado por algumas matérias”, declarou o depoente logo na abertura da oitiva.

Tolentino também relatou ter tido alguns “encontros” “meramente casuais” com o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), mas negou ser amigo do governante. “Informo que conheço o presidente desde o período em que era deputado Federal, mas não possuo nenhuma amizade pessoal ou qualquer outro tipo de relacionamento”, disse.

“Estive com ele em alguns encontros, meramente casuais. Inclusive, se pegar até as datas em que comecei a voltar para cá, já foi em junho, julho, no marco regulatório das TVs”, afirmou. Ao longo do depoimento, o relator da comissão, Renan Calheiros (MDB-AL), e outros senadores fizeram questionamentos sobre o patrimônio do FIB Bank e os seus reais donos. O advogado, no entanto, optou por exercer o direito ao silêncio na maioria das indagações, sob proteção de habeas corpus concedido pelo STF (Supremo Tribunal Federal).

O vínculo entre o nome do dono da Rede Brasil de Televisão e o FIB Bank ganhou força depois que diretor-presidente da empresa, Roberto Ramos Júnior, afirmou em depoimento à CPI que Tolentino havia atuado como advogado de Ricardo Benetti, com procuração para responder pelos sócios do FIB Bank.

Benetti é sócio de uma outra empresa, a Pico do Juazeiro, uma das acionistas do FIB Bank. Durante o depoimento de hoje, Tolentino confirmou que, no passado, foi sócio da família Benetti e atuou para as empresas de Ricardo e do pai, Ederson. “Dessa empresa da qual eu fazia parte [Pico do Juazeiro], derivaram muitos negócios, direitos, bens, outras empresas, algumas que têm inclusive o nome Benetti como parte de sua razão social”, explicou ele.

“E, mesmo com o falecimento do doutor Ederson Benetti, em um acordo com seu filho e herdeiro, Ricardo Benetti, algumas dessas empresas permaneceram de minha propriedade e outras foram a ele transferidas, a fim de fazer jus a seus direitos hereditários”, completou.

Em sua oitiva na CPI da Covid, Ramos Júnior tentou ressaltar que a procuração dada a Tolentino seria para representar somente a Benetti e a Pico, e não o FIB Bank. A composição societária do FIB Bank é objeto de fortes suspeitas em relação às investigações da CPI.

Os parlamentes descobriram, durante a apuração, que a empresa de garantias foi registrada originalmente em nome de pessoas que nunca tiveram quaisquer relações com ele —entre as quais um morador de Alagoas que briga na Justiça para desvincular o seu nome da empresa.

Tolentino também presta esclarecimentos hoje devido a relação de amizade com o líder do governo na Câmara dos Deputados, Ricardo Barros (PP-PR), que integra a lista formal de investigados da CPI. Ex-ministro da Saúde no governo Michel Temer (MDB), o deputado é suspeito de favorecer a Precisa Medicamentos, empresa que intermediou o negócio da Covaxin — antes de o contrato ser cancelado após suspeita de irregularidades —, e a farmacêutica Belcher — de Maringá, reduto eleitoral de Barros — para emplacar a compra da vacina chinesa Convidecia.

Senadores acompanham os trabalhos da CPI da Covid – Roque de Sá/Agência Senado

Entenda as suspeitas sobre a compra da Covaxin

Em depoimento à Comissão Parlamentar de Inquérito, o deputado federal Luis Miranda (DEM-DF) e seu irmão, Luis Ricardo Miranda, servidor concursado do Ministério da Saúde, denunciaram suspeitas de irregularidades envolvendo o contrato da Covaxin.

Ao ouvir denúncia sobre o caso pessoalmente, segundo os irmãos Miranda, Bolsonaro disse que Ricardo Barros poderia estar envolvido no “rolo”. O líder do governo confirma a proximidade com Tolentino, mas nega ter praticado irregularidade.

Os parlamentares apuram se o FIB Bank —que não é um banco, apesar do nome— foi utilizado com o intuito de mascarar irregularidades. Renan Calheiros disse que Tolentino, “por ser amigo de Ricardo Barros, teria facilitado a emissão da carta fiança em favor da Precisa Medicamentos para satisfazer os interesses do deputado na execução do contrato da Covaxin”.

A CPI ainda não divulgou elementos ou informações que corroborem as acusações contra Barros, mas Renan tem afirmado que as provas constarão do relatório que ele promete entregar até o fim do mês. Em relação a esse tema, o depoimento de Tolentino é considerado fundamental.

Suspeitas sobre participação no FIB Bank

Senadores independentes e de oposição na comissão acreditam que Tolentino seja um dos verdadeiros sócios do FIB Bank, que deu a garantia para a Precisa Medicamentos seguir na negociação com o Ministério da Saúde para a venda da vacina Covaxin. O diretor-presidente do FIB Bank, Roberto Ramos Júnior, negou à CPI que Tolentino faça parte da empresa ou tenha alguma gerência sobre ela.

Para os senadores, no entanto, há evidências de que Ramos Júnior é “laranja” de Tolentino e de que este é o verdadeiro dono da instituição. A garantia fidejussória emitida pelo FIB Bank para a Precisa Medicamentos — R$ 80 milhões, o equivalente a 5% do total da operação de R$ 1,6 bilhão para a compra da Covaxin —, segundo senadores da CPI, não está de acordo com o modelo previsto no contrato com o governo federal.

Segundo o vice-presidente da CPI e autor do requerimento de convocação de Tolentino, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), era preciso apresentar uma fiança bancária, um seguro-garantia ou uma caução em dinheiro ou títulos da dívida pública. Randolfe apontou que o endereço de uma emissora de Tolentino, por exemplo, seria o mesmo de uma das duas empresas acionistas do FIB Bank, a Pico do Juazeiro Participações, com sede no Paraná.

Ainda segundo senadores, outra empresa acionista do FIB Bank, a MB Guassu, teria o mesmo número de telefone do escritório de advocacia de Tolentino em São Paulo. Uma ação de cobrança ajuizada na Justiça por uma construtora também indica que Tolentino seria o verdadeiro dono de empresas no nome de Ricardo Benetti.

O senador Rogério Carvalho (PT-SE) destacou que o “telefone informado como sendo do FIB Bank Garantia de Fianças Fidejussórias S.A. também seria o do escritório Benetti & Associados Gestão Tributária e Empresarial, que tem Marcos Tolentino da Silva como membro do conselho do escritório”.

Roberto Pereira Ramos Júnior (esquerda), Omar Aziz (centro) e Renan Calheiros (direita) durante depoimento do diretor do FIB Bank para a CPI da Covid – Edilson Rodrigues/Agência Senado – Edilson Rodrigues/Agência Senado

Outro ponto levantado é que a empresa Brasil Space Air Log Conservação Aérea, em nome da mãe de Tolentino, recebeu R$ 1,9 milhão do FIB Bank, de acordo com Renan Calheiros. O valor foi repassado por meio de 19 transferências bancárias entre 4 de junho de 2020 e 12 de maio de 2021, informou o senador Humberto Costa (PT-PE).

Ramos Júnior não soube explicar o motivo das transferências e disse ser “possivelmente contratos que tenhamos entre essas duas empresas”. O senador Humberto Costa também afirmou que Tolentino tem um email institucional do FIB Bank. A cúpula da CPI afirma ainda ter outras informações referentes às atividades da empresa, obtidas por meio de quebras de sigilos e apurações internas, que ainda não se tornaram públicas.

Tolentino nega irregularidades

Tolentino já disse, por meio de nota, que não atua na gestão do FIB Bank e negou ter cometido ilegalidade. Em seu perfil no LinkedIn, se apresenta como “advogado tributarista, administrador e dono da Rede Brasil de Televisão”. Ele afirma ser presidente da rede de TV desde abril de 2007.

Diz ainda ser “empresário à frente de um grupo que possui diversas atividades, desde assessoria empresarial e tributária à construção civil”.

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