A eleição de Jair Bolsonaro (PSL) para a Presidência dividiu reações na comunidade islâmica em São Paulo. Se por um lado há apreensão pelas declarações do capitão reformado contra minorias, por outro os discursos a favor da família tradicional, do crescimento econômico e de mudanças na segurança pública atraiu apoiadores.
“A comunidade islâmica assim como outras também ficou dividida”, afirma o xeque e diretor da União Nacional das Entidades Islâmicas (UNI), Mohamad Bukai.
Nascido em Damasco, capital da Síria, ele vive há 11 anos no Brasil e dirige a organização que reúne 17 entidades e mesquitas islâmicas na capital paulista. Mais da metade dos membros, segundo Bukai, teria declarado apoio a Bolsonaro.
De acordo com o último Censo do IBGE, em 2010, o número de muçulmanos no país chegava a pouco mais de 35 mil pessoas, 42% delas no estado de São Paulo. Não há um registro recente exato, diz Bukai, mas ele estima que haja mais de 100 mil apenas no estado.
Nas mesquitas os líderes afirmam que não houve direcionamento do voto. O diálogo se limitou à defesa dos valores do islã, como o respeito aos direitos humanos.
“Na nossa comunidade muçulmana a meta é que não haja nenhuma discordância. Não lida com essas questões que acabam sendo desagregadoras”, afirma o professor Feres Fares, que trabalha voluntariamente em mesquitas paulistas.
O debate, porém, aparecia fora dos templos. Durante o segundo turno da eleição, o xeque Bukai publicou um vídeo na página da UNI pedindo tolerância. Ele aparece cercado por bandeiras do Brasil, ao som do hino nacional e fotos dos presidenciáveis Bolsonaro e Fernando Haddad (PT).
Entre os comentários, uma seguidora critica o líder por não se posicionar sobre valores, no que é questionada por outra sobre o chamado kit gay. Nos compartilhamentos, críticas ao PT e a atos de violência praticados por seguidores de Bolsonaro.
Um dos fundadores da mesquita Sumayyah Bint Khayyat, em Embu das Artes, o arte-educador César Kaab Abdul, 44, diz que houve muitas discussões entre os líderes sobre o que seria o melhor para os muçulmanos, mas diz que o discurso sobre a ação policial, que tem apoio nos bairros nobres da cidade, chega de forma diferente na periferia.
“Muitos muçulmanos votaram no Bolsonaro, mas na periferia a gente tem uma leitura diferente das falas sobre violência e ódio”, afirma Abdul.
Antes do primeiro turno, a mesquita assinou a nota pública “Judeus e muçulmanos unidos: fascismo não!”, sobre intolerância religiosa. Para o líder muçulmano, Bolsonaro tenta subjugar as minorias ao declarar que elas devem “se curvar à maioria”.
Abdul diz que o clima no local é de apreensão, porém, afirma não acreditar em divisões entre muçulmanos, uma vez que são guiados pela religião. “Nosso governo é o islã”, diz.
O xeque Bukai também diz que pessoas relatam ter medo de ter os direitos ameaçados, mas confiam nas instituições brasileiras
JERUSALÉM
Já a possibilidade de transferir a embaixada brasileira em Israel de Tel Aviv para Jerusalém é criticada de forma unânime.
O anúncio foi feito pelo presidente eleito em entrevista ao jornal Israel Hayom. “Israel é um Estado soberano. Vocês decidem qual é sua capital e nós vamos segui-los”, afirmou.
A declaração motivou uma carta da Liga Árabe à Embaixada do Brasil no Cairo e o cancelamento da visita de uma comitiva brasileira ao Egito. Bolsonaro, então, recuou e disse que essa não é uma “questão de honra”.
“Jerusalém Oriental é considerado um local ocupado e qualquer transferência vai contra todas as leis internacionais. Outra coisa, hoje o mercado islâmico está muito forte no Brasil e isso pode ter um efeito negativo”, diz Bukai.